quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Migrar e Estar Ausente: O Abismo das Almas Vendidas e o Pessimismo de Luigi Damiani

Migrar e Estar Ausente: O Abismo das Almas Vendidas e o Pessimismo de Luigi Damiani

“Migrar temporariamente é mais do ir e vir – é viver, em espaços geográficos diferentes, temporalidades dilaceradas pelas contradições sociais. Ser migrante temporário é viver tais contradições como duplicidade; é ser duas pessoas ao mesmo tempo, cada uma constituída por especificas relações sociais, historicamente definidas; é viver como presente e sonhar como ausente. E ser e não ser ao mesmo tempo; sair quando está chegando, voltar quando está indo. E necessitar quando está saciado. E estar em dois lugares ao mesmo tempo, e não estar em nenhum. E, até mesmo, partir sempre e não chegar nunca.” (MARTINS:1986, p.45)

Ao cair na cilada de tentar definir as migrações, José Martins de Souza, em “O Voo das Andorinhas”, aborda o conceito de ausência que pode se fazer tranquilamente um paralelo com os artigos da revista travessia, Literatura i/e Migração de 1999, que já na sua apresentação, feita por Carlos Eduardo Schmidt Capela, demonstra a dificuldade de definir imigrantes e emigrantes, além de perpassar pela sensação de ausência do migrante, que traz consigo características de nacionalidade.

Apesar de Martins em seu texto não focar especificamente nas migrações estrangeiras, seu conceito de ausência cabe a esse tipo de migração que está sendo desenvolvida nos artigos da revista, pois, sobretudo, o assunto tratado não deixa de ser migrações temporárias, já que o tempo em questão é considerar-se ausente, ausência que é medida pela não ocorrência da dessocialização do local de partida e da ressocialização no lugar chegada, o migrante se vê num sentimento de estar “fora de casa”, “fora de seu lugar”. Essa situação não pode ser entendida como um processo de progresso civilizatório, todavia, como um processo violento de expulsão das pessoas de seus lugares de origem através da acumulação primitiva e da imposição da mobilidade do trabalho. Em tempos atuais, a crise que gera migração é global e ocorre simultaneamente em diversos espaços, pois os trabalhadores não conseguem mais vender sua força de trabalho.

Mesmo quando se fala de uma “migração permanente”, ainda pode se ter incutido o imaginário de ausência, contudo a posição de migrante permanente não foi o caso de um grupo de migrantes, em sua maioria italianos, que tinham compromisso com uma ação cultural libertária junto a classe trabalhadora do Brasil nos finais do século XIX e início do século XX. Sendo assim, acabaram expulsos e quando não, desencantados com os obstáculos tidos no Brasil que assegurava apenas uma exploração crescente dos imigrantes italianos e condições insalubres de trabalho nas mãos dos fazendeiros e industriais em São Paulo. Umas das figuras mais emblemáticas foi Luigi Damiani, de acordo com o artigo de Antônio Artoni Prado em “Sobre as imagens da revolução no teatro de Luigi Damiani”, publicado na revista travessia, edição de número 35. Em um trecho sobre Damiani é apontado que o seu “(...)inconformismo e a luta contra a dura realidade do Brasil, mais do que o desengano, trouxe-lhe a prisão e em seguida o banimento. Os depoimentos que escreveu entre 1920-21 para o jornal Volonta, de Ancona – depois portanto de sua expulsão, que se deu em 1919 – servem como exemplo oportuno do grau de veemência com que repudiou as condições desfavoráveis ao avanço da emancipação social no Brasil.” Damiani em seus escritos apresentava uma posição de ruptura com a ordem estabelecida e assim sua obra passou a aguçar um certo pessimismo intelectual diante das possibilidades de emancipação da classe trabalhadora no Brasil, que não sinalizava uma quebra da ordem vigente. Sobre os ideais anarquistas, confessou frustrado, que nem mesmo em sonho poderia ser atingido, pois, “comer e ter direitos mínimos, se isso fosse possível, seria aqui uma façanha notável.”

Por vezes para muitos, ancorados em premissas do senso comum, o ato de migrar poderia estar atrelado a algo inerente do ser humano, na sua condição ontológica, e não parte de uma crise ou mesmo imposição feita com maior veemência a partir da consolidação da sociedade moderna, onde se torna obrigatória a mobilização geral em busca de trabalho. Cabe, portanto, abarcar alguns aspectos das migrações tendo como referência a crise do sistema global da economia de mercado.

Tal crise é estrutural no mundo contemporâneo que gera desemprego em massa e pobreza, e exige-se, então, de quem queira oferecer sua força de trabalho ao mercado, a constante mobilidade do trabalho em um cenário que já não aponta saída de trabalho para todos. Em suma, além do trabalhador moderno ser obrigado, numa espécie de coerção silenciosa, a se submeter ás relações econômicas de mercadoria, não se tem garantia de que os trabalhadores possam de fato exercer tal liberdade de vender sua força de trabalho.   

Os países do chamado Terceiro Mundo em geral passam por um processo de crescimento da urbanização mas contando com uma constante desindustrialização, os países centrais aparecem assim como a grande saída, o oásis para os trabalhadores, que tem como maior anseio, dentro dessas condições, encontrar um lugar que possa comprar sua força de trabalho.

“Eu quero trabalhar o dia inteiro, nem que seja pra ganhar um tostão

Eu já não posso mais e voltar atrás eu não quero não”

(Poeira do Norte, Gordurinha)

O ponto de partida dessa imposição do trabalho pode ser estabelecido com o advento da sociedade moderna e em sua transição do feudalismo para o capitalismo assentado nos valores sociais e culturais do Iluminismo e da Revolução Burguesa. Tais aspectos caracterizam a base para uma primeira humilhação da classe trabalhadora que teve sua humanidade transformada em material de mercadoria, que fora coisificada para gerar valorização. Se levarmos em conta que toda mercadoria se aufere no trabalho abstrato despendido em sua produção, considerando como simples gasto de energia humana, física e intelectual, e que o trabalhador se encontra alienado do controle e do produto do trabalho, são as coisas, então, que usam os trabalhadores através dos meios de produção para agregar acumulo e aumentar o valor. O desdobramento dessa engrenagem posta de maneira simplificada aqui, pode ser caracterizada como uma humilhação primária.

Dentro desses parâmetros, os fluxos migratórios contemporâneos e a maioria das lutas travadas pelos trabalhadores, seja em movimentos sociais ou políticos, são pautados tendo como base os princípios que fundaram a própria humilhação primária, ou seja, se almeja a consolidação de uma mínima dignidade humana para escapar de uma humilhação secundária que empurra o trabalhador despossuído para as margens da sociedade e da vida humana.

O cenário é caótico, a competitividade é esmagadora, a luz no fim do túnel praticamente não existe, o que resta é ter a esperança de manter a condição mínima de sobrevivência e nisso vale tudo pelo capital. Então migrar para os grandes centros, (que na verdade são minoria no mundo), que provocaram a pauperização da maioria, é uma saída plausível nesse contexto. Mas mais do que nunca, (e a tendência é aumentar o abismo para os despossuídos), é necessário romper com esses parâmetros da sociedade moderna ocidental para pensar e construir um novo mundo. Tal embate não se tem como evitar apenas adiá-lo e assim assistir o capitalismo se reinventar de período em período mantendo sua hegemonia no mundo.   

O capitalismo se reinventou através do neoliberalismo desde pelo menos os anos 1970, e o que fazia parte de uma agenda implícita de desmonte de direitos e políticas públicas timidamente conquistadas, já após a queda da União Soviética marcando o fim da Guerra Fria, se mostra tanto uma agenda implícita como explicita, se tornando assim uma armadilha para os trabalhadores organizados em diversos movimentos, no sentido de pretender almejar simplesmente a sobrevivência e a dignidade humana sem qualquer compromisso com uma agenda de ruptura perante o sistema capitalista imposto. Se busca a máxima de igualdade, alicerçada nos direitos do homem, da propriedade privada, do individualismo, afim de fazer valer os valores da revolução burguesa.

Tal armadilha chega ao ponto de instituições que explicitamente favorecem o aumento da pobreza e da miséria, principalmente nos países do chamado Terceiro Mundo, se intitularem como altruístas e se postarem como solução de desenvolvimento e de redução das desigualdades. A exemplo do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, que através de seus empréstimos a juros elevados, para que os países do terceiro mundo fiquem endividados, intervém nas estruturas políticas desses países visando nitidamente implantar uma reestruturação neoliberal, tendo como orientação uma reforma fiscal, a abertura de mercado, políticas de privatizações, dentre outras medidas. O neoliberalismo está no mundo inteiro e a maioria das forças progressivas em todo o mundo se encontra a mercê dessas ações ao clamar simplesmente por democracia, mas uma democracia burguesa, vazia de qualquer controle popular e de transformação social, pois é exatamente essa democracia que serve como intervenção do Imperialismo Capitalista de hegemonia norte-americana, que atualmente não financia as ditaduras, no entanto, se apresenta como promotores da democracia.    

 Assim, mesmo o caráter de denúncia dos maus tratos e de péssimas condições de trabalho, tidos também nas obras de Luigi Damiani, já passam a ser minimizados pela busca de qualquer espaço para exercer a liberdade de venda da força de trabalho da classe trabalhadora, além de em síntese nem serem mais a solução para a diminuição dos fluxos migratórios. Mesmo num mercado regulado, já não se pode mais apostar num sistema do mundo do trabalho assalariado, pois tal forma já se mostrou como causa das fugas em massa de quem necessita vender sua força de trabalho. E, assim, o pessimismo ainda cabe, de certa forma, pois se tem um distanciamento enorme com os ideais de ruptura da ordem estabelecida e para que se vise a construção de um novo mundo.

Referências:

HEIDEMANN, D. “Os migrantes e a crise da sociedade do trabalho: humilhação secundária, resistência e emancipação”. In: Migrações: discriminações se alternativas. São Paulo: Paulinas/SPM, 2004.

KURZ, R. “Barbárie, migração e guerras de ordenamento mundial”. In: Serviço Pastoral do Migrantes, Travessias na Desordem Global. Porto Alegre: Paulinas, 2005.

MARTINS, J.de S. ”O voo das andorinhas”. In: Não há terra para plantar neste verão. Petrópolis: Vozes, 1986.

ANTONIO ARNONI PRADO, Sobre as imagens da revolução no teatro de Luigi Damiani. In: TRAVESSIA-revista de literatura- n.39 -UFSC -FIorianopolis-jul-dez.l999; pp J9.55

por Carlos R. Rocha (Fuca), Insurreição CGPP

2018



quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Abdias Nascimento sobre Marcus Garvey em 05/06/1997 - Pronunciamento no senado.

O SR. ABDIAS NASCIMENTO (PDT-RJ. pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, SRªS E SRS. senadores, Sob a proteção de Olorum, inicio este pronunciamento.

 

Acontecimento mais relevante da história deste milênio, a invasão do Continente Africano por europeus a partir do século XVI, com a escravização e migração forçada de milhões de seus filhos e a transformação dos restantes em súditos coloniais, alterou para sempre a face do planeta. Pode-se afirmar, sem medo de exagero, que o transplante de enormes contingentes de africanos para o outro lado do Atlântico não apenas moldou a face das sociedades americanas, mas constituiu o principal motor de processos fundamentais, como a Revolução Industrial e a ascensão do capitalismo, responsáveis pela configuração do mundo, tal como hoje o conhecemos. Dentre as consequências negativas desse fato histórico encontram-se os principais vetores da instabilidade de que padece não apenas a África mesma, mas igualmente boa parte das Américas, sem esquecer a própria Europa. Questões como o racismo e a xenofobia, que têm nos descendentes de africanos no Novo e no Velho Mundo seus alvos preferenciais, encontram-se nas raízes de problemas como a violência urbana, as crianças de rua, a favelização das metrópoles. Ao mesmo tempo, as sequelas do colonialismo se espelham com clareza no empobrecimento e nas sangrentas lutas fratricidas que nos acostumamos a associar a determinadas regiões da África, frutos da atomização e do artificialismo que presidiram à imposição das atuais fronteiras dos países africanos pelos centros político-militares europeus de força.

Com todo o sofrimento e toda a dor que constituíram parte integrante desse processo cruel, a história da resistência africana na própria África e nas Américas é também uma saga repleta de heroísmo, bravura, determinação e criatividade. Qualidades que possibilitaram que um povo dominado pelo poder das armas, reforçado por toda espécie de ideologia mistificadora, conseguisse impor boa parte de sua cultura, de seus valores, de sua arte, de sua religião aos seus dominadores, a despeito da suposta superioridade por estes autoproclamada. Tudo isso não aconteceu de graça, mas em resultado de uma luta tão multifacetada quanto as próprias estratégias de dominação elaboradas pelos escravizadores europeus e seus descendentes. Uma luta a um tempo nos planos material e ideológico, envolvendo não somente as armas convencionais de cada época e lugar em que tem sido travada, mas igualmente a palavra e o pensamento, tendo por meta a derradeira conquista das consciências e mentes de europeus, africanos e seus descendentes. Objetivo último dessa luta: a supremacia final, para uns, ou a plena liberdade, para outros.

Uma das noções mais antigas entre os povos africanos escravizados nas Américas é a de que sua liberdade não se resgataria com simples apelos emotivos ao coração do dominador. Mais do que isso, a percepção de que uma África unida, livre da hegemonia europeia, constituiria uma fonte de força e apoio aos negros em todo o mundo. Essa visão, raiz mais profunda daquilo que viria a ser conhecido como pan-africanismo, encontra-se presente, mesmo que de forma incipiente, no ideário dos principais movimentos de luta organizada contra a escravidão nas Américas. Estava presente em Palmares, que congregava africanos de todas as origens, assim como seus descendentes, em busca da mesma liberdade por que lutaram os maroons do Caribe, os revoltosos da Centro-América e os revolucionários libertadores do Haiti.

O pan-africanismo é a teoria e a prática da unidade essencial do mundo africano. Não há nenhuma conotação racista nessa unidade, que se baseia não em critérios superficiais, como a cor da pele, mas na comunidade dos fatos históricos, na comunidade da herança cultural e na identidade de destino em face do capitalismo, do imperialismo e do colonialismo. O pan-africanismo reivindica a unidade do Continente Africano e a aliança concreta e progressista com a diáspora unida, que incorpora populações asiáticas, como os dravídicos da Índia e os aborígenes australianos, saídos do Continente Africano há dezenas de milhares de anos. E também a nova diáspora negra na Europa, constituída, fundamentalmente nos últimos 30 anos, pela migração procedente da África e do Caribe.

O primeiro registro histórico de uma reivindicação de caráter tipicamente pan-africano data de meados do século XVIII, na forma de uma petição em que escravos da colônia inglesa que um dia se transformaria nos Estados Unidos da América pleiteavam a volta à África depois de libertados. A mesma ideia presidiu à fundação em 1787, por um grupo de afro-americanos, da cidade de Freetown - que mais tarde viria a ser a capital da Serra Leoa -, revertendo um projeto originalmente racista e paternalista que só ganhou força quando ressuscitado e recuperado por africanos e descendentes oriundos do Caribe e da América do Norte.

O século XIX assistiu ao crescimento e consolidação do ideal pan-africano, impulsionado, nos Estados Unidos, por nomes como Prince Hall, John Russworm, o Bispo McNeil Turner e o grande ativista Edward Blyden. O mesmo ideal que, sob diferentes formulações, propelia ao mesmo tempo os movimentos anticoloniais africanos. Na África do Sul, por exemplo, desde a sua criação, no início deste século, o Congresso Nacional Africano, que décadas mais tarde concretizaria o sonho aparentemente utópico de um governo de maioria negra, incorporou integralmente ao seu programa o ideal pan-africano. Como se percebe no profético discurso do nacionalista sul-africano Isaka Seme, proferido em 1905 na Columbia University:

O gigante está acordando! Dos quatro cantos da terra os filhos da  África marcham em direção à porta dourada do futuro, carregando o registro de proezas de valor realizadas.

Dentre os inúmeros intelectuais e ativistas dedicados à causa pan-africana nestes últimos dois séculos, um nome se destaca: o de Marcus Garvey, responsável pela fundação do principal movimento internacional negro em toda a história - a UNIA (Universal Negro Improvement Association, Associação Universal para o Avanço Negro), organização que chegou a ter 35 mil militantes inscritos nos Estados Unidos, 52 filiais em Cuba, oito em Honduras, oito na África do Sul, 47 no Panamá e 25 na Costa Rica -, onde tive a oportunidade de visitar o casarão histórico em que funcionou seu quartel-general para a região, ainda preservado na Província de Limón. Além de sucursais no Brasil, Equador, Nigéria, Porto Rico, Austrália, Nicarágua, México, Barbados, Serra Leoa, Inglaterra e Venezuela. 

Marcus Garvey nasceu em St. Ann's Bay, na Jamaica, a 17 de agosto de 1887. Filho de um pedreiro do mesmo nome, descendente dos aguerridos maroons, que desafiaram - por vezes com sucesso - a ordem colonial britânica na Jamaica e em todo o Caribe, cedo demonstrou uma aguda inteligência e uma inquietação em face de problemas sociais e raciais que iria acompanhá-lo até a morte. Já aos 16 anos, como aprendiz de gráfico, seu primeiro emprego, o jovem Garvey iniciava sua atuação como ativista político, participando de uma greve de sua categoria. Pouco depois, publicou seu primeiro jornal, The Watchman (O Vigilante), em que expunha suas ideias e preocupações sobre temas vinculados a raça e classe.

Essas preocupações o levariam em frequentes viagens ao exterior, nas quais a visão dos descendentes de africanos ocupando em toda parte a base da pirâmide social acabaria consolidando suas posições ideológicas e forjando os elementos essenciais de sua plataforma anti-racista, antiimperialista e anticolonialista. Assim foi no Panamá, porto de destino de milhares de jamaicanos atraídos pelos empregos oferecidos com a construção do Canal, mas discriminados em favor dos operários brancos. Também no Equador, na Nicarágua, em Honduras, na Colômbia e na Venezuela, onde os negros, empregados na mineração ou nas plantações de tabaco, pareciam incapazes de melhorar as humilhantes condições em que viviam. 

Em 1912, Marcus Garvey, aos 25 de idade, chega a Londres, onde vai trabalhar, estudar e desenvolver-se na percepção de novas dimensões da luta negra. A capital do Império Britânico, ainda nos picos de seu poderio, era o ponto focal da efervescente atividade intelectual e política que marcou o período imediatamente anterior à Primeira Guerra Mundial. Um ano antes, em 1911, a cidade abrigara um Congresso Mundial sobre Raça, organizado sob os auspícios do Movimento Inglês de Cultura Ética - o mesmo Congresso em que o representante brasileiro declarou candidamente estar o Brasil resolvendo seu problema racial por meio da miscigenação, que acabaria com os negros dentro de um século. À miscigenação, acrescente-se, devemos somar as péssimas condições de vida que ajudariam a liquidar o povo afrodescendente neste país. A literatura, as atitudes e os debates relativos a esse Congresso ainda eram motivo de acesas polêmicas quando Marcus Garvey chegou a Londres. Igualmente importante era a nova literatura anticolonial produzida na África Ocidental.

As ideias do jovem Garvey sobre a redenção africana ganharam contornos definitivos quando se associou ao intelectual nacionalista Duse Mohammed Ali, um egípcio de ascendência sudanesa que publicava o jornal mensal The African Times and Orient Review. O período londrino completou a educação política de Marcus Garvey. Ele estava pronto para a sua tarefa. Em 1914, retornou à Jamaica e fundou uma organização, que denominou Associação Universal para o Avanço Negro e Liga das Comunidades Africanas. Dois anos depois, encorajado pelo líder afro-americano Booker T. Washington, desembarca em Nova York. No Harlem, toma contato com as especificidades da questão racial nos Estados Unidos. Os negros do Sul fugiam para o Norte, deixando atrás de si o sistema aparteísta do Jim Crow, os linchamentos, a falta de direitos políticos, a servidão e a miséria. No Norte, ganhavam melhores salários nas fábricas, que agora tinham de alimentar a máquina de guerra, mas eram obrigados a viver em casas caindo aos pedaços, em bairros miseráveis, e seus filhos frequentavam escolas precárias, tanto nas instalações quanto no ensino. Os poucos que ousavam usar estratagemas para comprar residências em bairros de brancos viviam apavorados pela possibilidade de bombas racistas explodirem em suas casas ou de suas famílias serem ameaçadas na rua.

Não existia nessa época uma organização verdadeiramente negra em Nova York. As que havia eram multirraciais, dirigidas por brancos e mestiços de pele clara. Garvey começou sua pregação discursando nas esquinas do Harlem. Logo precisou ocupar espaços maiores, na medida em que crescia o público interessado em sua mensagem positiva, que falava de uma ação internacional em favor do negro. Essa reação estimulou Garvey a instalar nos Estados Unidos a sua UNIA, que se distinguia das demais organizações por ser exclusivamente negra e defender um programa ousado e radical. Categorizando a luta negra como de direitos humanos, e não somente de direitos civis, o que implicitamente estabeleceria seu caráter internacional, já em 1920 Marcus Garvey articulava a distinção fundamental assinalada por Malcolm X nos anos 60, contribuindo para elevar a luta negra a um patamar superior ao do integracionismo liberal.

Garvey compreendeu três necessidades básicas do negro em todo o mundo: a de dignidade e auto-respeito como povo unido; a de uma África independente e unida como base de força central; e a de instituições autônomas para impulsionar a vida das comunidades negras. Além disso, como nenhum outro, antes ou depois dele, Marcus Garvey percebeu a importância das comunidades negras das Américas Central e do Sul para a luta pan-africanista internacional, inspirada no lema "A África para os africanos, na própria pátria e no exterior".

Em 1920, no auge do prestígio de Garvey, a UNIA organizou a I Convenção dos Povos Africanos do Mundo, com a presença de 25 mil representantes e delegados de todos os continentes. O produto mais importante dessa Convenção foi a Declaração de Direitos dos Povos Negros do Mundo, que condenava o colonialismo, afirmava o "direito inerente do negro de governar a África", instituía o vermelho, o preto e o verde como as cores simbólicas do pan-africanismo, e exigia o fim dos linchamentos e da discriminação racial nos países da diáspora africana, bem como o ensino da História Africana nas escolas públicas.

A independência econômica era outro fator enfatizado no programa da UNIA. Garvey exortava seus seguidores a "comprar de negros", a preferir negociantes de sua própria raça. Atendendo o apelo de Booker T. Washington à auto-suficiência, a UNIA iniciou diversos projetos na área empresarial, incluindo a Corporação de Fábricas Negras, destinada a ajudar empresários da comunidade. O que é mais importante, Garvey fundou a Black Star Steamship Line, para funcionar como laço comercial e espiritual entre os negros de todos os lugares que seus navios alcançassem. Para surpresa de seus críticos, entre 1919 e 1925 Garvey juntou dinheiro suficiente para adquirir quatro navios e estabelecer ligações comerciais com o Caribe.

Embora os navios da Black Star Line transportassem tanto carga quanto passageiros, o objetivo não era um retorno físico de todos os negros à África, que ele sabia ser impossível, mas antes um retorno de caráter simbólico e espiritual. Garvey acreditava, contudo, ser dever dos descendentes de africanos contribuir, com seu trabalho, conhecimento e tecnologia, para o fortalecimento do Continente-Mãe, tendo em vista uma futura derrubada de fronteiras e a criação de uma nação unificada. Nesse sentido, chegou a estabelecer negociações com o Governo da Libéria. 

Se granjearam uma legião de seguidores, as ideias de Garvey também o fizeram colecionar desafetos, entre brancos e negros, à direita e à esquerda do espectro político. Creio não ser preciso enfatizar o perigo que ele representava para o establishment, com suas ideias de autonomia, dignidade e auto-respeito. Problemas com a administração da Black Star Line acabaram fornecendo o pretexto para que o FBI o prendesse, em 1923, sob falsas acusações, o que causou uma gigantesca passeata de protesto, que reuniu 150 mil pessoas, de várias nacionalidades, nas ruas do Harlem. Deportado para a Jamaica em 1927, Garvey foi recebido pelo povo de Kingston, a capital, como um verdadeiro chefe de estado - mas como uma ameaça pela elite, branca e negra. Essa oposição, materializada sob a forma de dificuldades jurídicas, não o impediu de se eleger, na capital, para um cargo correspondente ao de vereador, nem de publicar um novo jornal, The New Jamaican (O Novo Jamaicano).

Em 1935, ano em que a Itália de Mussolini invade a Etiópia, então a única nação independente da África, provocando um acirramento das discussões sobre colonialismo e racismo, Garvey retorna à Inglaterra, onde passará seus últimos anos. Seu propósito era cobrar diretamente do Império Britânico a redenção do Continente Africano. Os ingleses não se preocuparam muito. O Império vivia seu último período de esplendor, dominação e arrogância. Não estava, assim, inclinado a dar ouvidos a esse súdito da Coroa que agia como um cidadão, exigindo os direitos básicos da cidadania. Era também a época da Grande Depressão, cujas consequências se abatiam com maior impacto sobre os descendentes de africanos. Garvey viveu seus últimos anos na pobreza, embora sem perder o orgulho de maroon que o projetara mundialmente nas décadas precedentes. Em janeiro de 1940, um ataque de paralisia o pôs de cama, e alguns jornais publicaram que ele havia morrido na miséria. Cartas e telegramas choveram sobre seu escritório. A secretária evitava que essa correspondência chegasse a suas mãos, mas ele acabou tendo acesso a ela. As manchetes falando de sua morte causaram-lhe um choque do qual não se recuperou, vindo a falecer no dia 10 de junho de 1940. Hoje, decorridos 57 anos de sua morte, sua mensagem ao mundo continua válida:

Ó África, acorda

A aurora está chegando

Não mais és maldita

Ó bondosa Terra-Mãe 

De longe teus filhos e filhas

Se dirigem de volta a ti

Sobre as águas ressoam seus gritos

De que a África será livre.

A filosofia de Garvey não é perfeita, nem fornece uma base adequada para a moderna teoria e prática da luta africana. Em consequência, é fácil e legítimo levantar críticas construtivas às suas ideias e ao seu movimento. Mas não se pode negar o legado que ele deixou como fundamento essencial à organização política do negro. Seu espírito continua vivo, apesar dos incansáveis esforços de seus adversários em destruí-lo. Em seu livro The Black Jacobins (Os jacobinos negros), o intelectual antilhano C.L.R. James - que em vida foi meu amigo e apoiou as reivindicações do Movimento Negro brasileiro ao VI Congresso Pan-Africano, realizado em 1974 na Tanzânia - observa que dois caribenhos, "usando a tinta da Negritude, inscreveram seus nomes de maneira indelével na história de nosso tempo". James está se referindo a Aimé Césaire e Marcus Garvey. Para ele, Garvey está na vanguarda do grupo de negros radicais do século XX cujas ideias e programas ainda reverberam nos movimentos de libertação de nossos dias. Isso se deve, em grande medida, ao trabalho incansável daquela que por décadas o acompanhou na luta e que, depois de sua morte, dedicou a existência à preservação de sua memória e à divulgação de suas ideias. Estou falando de sua viúva, Amy Jacques Garvey, por quem tive a honra de ser recebido em minha passagem pela Jamaica, em 1973. 

O garveísmo inspirou muitos líderes africanos, como o ganês Kwame Nkrumah, apóstolo do pan-africanismo, bem como a jovem liderança que, nos anos 60, faria avançar a um ponto sem precedentes a luta dos afro-americanos. Sua preocupação com a auto-imagem dos negros, com o valor do ensino da História Africana, com a unidade dos povos da África e da diáspora, mas sobretudo sua disposição de homem simples e prático, capaz de traduzir para as massas negras despossuídas a mensagem do pan-africanismo, e de tomar medidas práticas para concretizá-la - tudo isso fez de Marcus Garvey um homem que merece a admiração e o respeito, não apenas dos africanos e seus descendentes, mas de todos aqueles comprometidos de coração com a mudança efetiva das relações sociais e raciais.

Axé, Marcus Garvey!

https://www25.senado.leg.br/web/atividade/pronunciamentos/-/p/texto/206794

 


quarta-feira, 29 de julho de 2020

Mary E. Modupe Kolawole: Gênero e Literatura Africana - Mulheres como uma massa critica

Dra. Mary E. Modupe Kolawole.

Professora de Inglês e de Estudos das Mulheres na Universidade Obafemi Awolowo, Ilê-lfé, Nigéria.

Autora do livro “Womanism and African Consciousness” [Mulherismo e a Consciência Africana] 

(Texto extraído de parte da aula inaugural em 2005)

Minha pesquisa sobre gênero é um dos aspectos mais importantes do meu trabalho como teórica literária. Minha pesquisa inicial não tinha foco especial em gênero até minha bolsa de estudos na Universidade Cornell como pesquisadora visitante da Fundação Rockefeller (1991-92). Observei que gênero era um critério importante emergente em estudos acadêmicos nas ciências humanas, ciências, e saúde. Nesses pontos, a maioria dos livros enfocou os critérios ocidentais de avaliação de gênero na África, incluindo a literatura africana. Decidi juntar as opiniões dos africanos sobre a realidade das mulheres a partir de minhas pesquisas em história, lendas, mitos, gêneros orais, contos populares, provérbios e outros. A literatura africana ocupa um lugar que eu descrevo como a zona crepuscular (twilight zone), um local intermediário (espaço ambíguo). A questão da diferença ou alteridade, portanto, continuou a gerar muitas discussões epistemológicas. Meus trabalhos também exploram a alteridade das mulheres, não como uma resistência negativa à mudança, mas como uma manifestação de mutabilidade, mesmo quando elas resistem à autonegação cultural e de gênero. A agência das escritoras africanas é notável por sua resiliência. Havia uma lacuna esmagadora na percepção de gênero das mulheres africanas e um desejo de nomear sua própria luta, rejeitando marcas como o feminismo africano/negro. As mulheres africanas devem se constituir como uma massa crítica.

Eu me identifico com Alice Walker e Chikwenye Okonjo-Ogunyemi, Clenora Hudson-Weems, entre outras, devido seus anseios por formas mais inclusivas de nomear a luta das mulheres pretas. Meu livro teórico, “Womanism and African Consciousness” [Mulherismo e a Consciência Africana], levantou questões válidas de como se define o mulherismo. “O que é então o mulherismo? Para as africanas, o mulherismo é a totalidade da autoexpressão, do autocuidado e da autoafirmação femininas nas maneiras culturais positivas." (Kolawole. 1997. p.24). O mulherismo não é uma ideologia que odeia o homem. O mulherismo enfatiza a relevância racial e cultural, a centralidade da família e a necessidade de que homens e mulheres trabalharem juntos para alcançar justiça de gênero, equidade de gênero e empoderamento das mulheres. (Kolawole 1997, 2004, 2005). Assim como a crítica literária feminista se tornou uma importante ferramenta de pesquisa crítica. Vejo que o mulherismo é uma versão adaptada disso, uma tentativa de infundir nacionalismo cultural e racial na teoria literária de gênero.

Quando iniciei os seminários e ensinos sobre o mulherismo, alguns colegas acreditavam que “quem paga a flautista dita a música” e estavam céticos acerca do direcionamento para uma alternativa ao feminismo, pois poderia ofender as agências doadoras e perguntaram: "Quem patrocinará isso?" Outros preferiram manter o status quo com o termo feminismo. Meu desafio era injetar uma perspectiva africana, aumentando assim as opções na conceituação de gênero. O próprio feminismo não é monolítico. As diversidades incluem feminismos liberais, socialistas, existencialistas e pós-modernos. Outras vertentes incluem o ecofeminismo e a mais recente variante, o feminismo ciborgue. Minha experiência na África do Sul é significativa. Como Associada da Fundação e residente acadêmica por três meses no Instituto Africano de Gênero da Universidade da Cidade do Cabo, em 1997, meus trabalhos sobre mulherismo alteraram o paradigma de estudos na África do Sul. Tornou-se um ponto focal de diversas maneiras. Desafiei a sororidade universal e advoguei o foco em mediações raciais e culturais. Meus livros estão agora nas listas de leituras de universidades da Europa, EUA, Ásia e muitos países africanos. Editoras alemãs pediram os direitos autorais para traduzir minhas obras para o alemão. Em uma recente conferência na Cidade do Cabo, em janeiro de 2005, comentários de renomados professores de literatura em universidades como Stellenbosch, Cidade do Cabo, Natal, Suécia, EUA, etc, me saudaram. "Professora, você é uma celebridade, uma lenda que simplesmente não consigo imaginar saindo desta conferência sem apertar sua mão." "Você tem impressionado a África do Sul nos últimos cinco anos." ''O artigo de Mary Kolawole nos deu uma pista dos problemas dos estudos de gênero nos últimos dez anos. Ela nos deu o caminho a ser seguido.” Entre esses comentários inclui o da famosa professora de literatura Kristen Petersen. O mundo estava esperando por uma estudiosa com a coragem de cantar canções africanas em terras estranhas, mas enraizadas na África.

Também pesquisei sobre gêneros femininos na literatura oral como ferramentas de autoexpressão das formas dinâmicas. Esses gêneros como caminhos de poder para a autoafirmação das mulheres refutam as alegações de ausência de voz e de invisibilidade. Concordo com Micere Mugo e Molara Ogundipe-Leslie de que precisamos apenas procurar lugares de audibilidade, visibilidade e poder das mulheres africanas. Esses lugares são revelados nos gêneros literários orais femininos, que foram caminhos do envolvimento dinâmico no processo social, como observei em meus trabalhos: "Existe uma infinidade de gêneros femininos entre os Iorubas. Isso inclui músicas Obitun; canções de Olori, canções Aremo, Ao-oka gelede, músicas Olele e Alamo. As canções de Fulani Bori no norte da Nigéria consistem em modos manifestos de autoexpressão e autoafirmação para as mulheres desse grupo religioso esotérico. Outros gêneros especificamente dominados pelas mulheres incluem a poesia da corte feminina Hausa, canções de nascimento Ibo, Ogori Ewere, muitos poemas panegíricos e contos populares, entre outros". (Kolawole, 1997) Em outras partes da África, as mulheres tinham suas vozes em muitos gêneros orais exclusivamente femininos: gênero satírico de donzela nzema em Gana, canções de noivas swati, lmpongo entre os Ila e Tonga da Zâmbia, Akan Dirges, Galla lampoons, canções de moagem de Kamba e numerosos mitos de gênero e provérbios. (Kolawole, 1997; 1998). Muito trabalho foi feito na área de imagens das mulheres em provérbios africanos por Minekke Schipper, Susan Arndt, Helen Mugambe, Kehinde Yusuf, Ifeanyi Arua e Juliana Abbenyi,

Colegas e estudantes envolvidos na pesquisa de gênero em todas as disciplinas inundaram minha caixa de entrada com pedidos de assistência, informações, revisão da literatura e referências sobre gênero na África. Recentemente, meu trabalho soou cauteloso neste processo de representar as opiniões das mulheres africanas de acordo com a agenda dos doadores. Podem não ser questões de primeiro plano que transformarão as mulheres africanas de seus espaços liminares, da margem para o centro. Em uma recente conferência internacional sobre “Writing African Women” [Escrevendo Mulheres Africanas], eu avisei sobre pesquisa autocentrada e a chamada representação de mulheres africanas. Proponho uma reapresentação de mulheres africanas usando o objetivo de "escrever" a tradição Ioruba que garante uma abordagem cautelosa para conhecer a noiva, já que as mulheres africanas se tornaram a bela e proverbial noiva dos pesquisadores. Vi minha tarefa à luz da argumentação de Leela Dube investigando o "viés etnocêntrico das acadêmicas feministas ocidentais que tendem a interpretar dados de outras culturas na perspectiva das experiências adquiridas em suas próprias culturas e na compreensão de suas relações entre homens e mulheres.”

O símbolo do “Mount Langbodo” [Monte Langbodo] de Fagunwa dramatiza uma tensão de gênero - os homens como guardiões da chave mestra dos múltiplos problemas das sociedades. A busca por Langbodo envolveu apenas homens, sete caçadores corajosos. As mulheres estão revelando sua desenvoltura através da literatura, e mover a literatura nigeriana do Monte Langbodo tem sido um objetivo importante para essas mulheres. Também uso a metáfora da árvore arerê na minha teoria da ambiguidade do espaço e da voz das mulheres. Um provérbio Ioruba resume essa contradição. "ile ti obinrin ri nse toto arere, igi arere ni hu nibe."- (uma casa que permita a vocalidade das mulheres terá a árvore arerê crescendo nela.) Não é permitido que a árvore arerê cresça perto da habitação humana devido ao seu odor desagradável, mas é uma árvore forte e valiosa na construção civil. A geração mais jovem de mulheres escritoras está desconstruindo essa simples metáfora. Entre elas incluem Toying Adewale, Omowunmi Segun, Maria Ajima e muitas outras. A canonização de textos é outro desafio para mim. Deliberadamente, trabalhei em novos escritos de jovens escritoras nigerianas para estabelecer e divulgar suas obras. Eu trabalhei na antologia de Toyin Adewale, “Breaking the Silence” [Rompendo o Silêncio], por esse motivo.

Algumas das teóricas feministas mais conhecidas hoje incluem Mary Eagleton, Mary Evans, Maggie Humm e Mary Rogers. Elas apresentaram algumas das teorias mais relevantes. Deixe-me declarar aqui que o feminismo é uma teoria que abrange muitas disciplinas. É uma teoria válida para filósofos, sociólogos, historiadores, antropólogos, cientistas políticos, estudiosos da cultura, cientistas, tecnólogos e pesquisadores da medicina. É facilmente a teoria mais transversal da academia moderna. Portanto, é lamentável que aqui na Nigéria, entre alguns estudiosos, o feminismo seja preterido por não ser acadêmico. E porque o mulherismo é relativamente novo, muitos estudiosos ainda desconhecem seu status como ferramenta de pesquisa.

Minha pesquisa reitera a conceitualização e a prática das teorias mulheristas. O mulherismo foi cunhado por duas intelectuais pretas, Alice Walker e Chikwenye Okonjo-Ogunyemi, em 1982, como um meio de se autonomear e injetar consciência preta nos estudos de gênero. A teoria mulherista agora está sendo comemorada como a contribuição das mulheres pretas para os debates sobre gênero e meu trabalho é um dos mais aplaudidos em todo o mundo por causa da originalidade das ideias. Fui homenageada e ainda estou sendo aplaudida por aumentar as opções de conceituação e metodologia de gênero. Assim como estudiosas tradicionais como Sandra Harding, Rose-Marie Tong, Angela Miles, Jane Parpart, Mary Rogers e Mary Evans destacaram o feminismo como uma teoria sólida e uma ferramenta para a academia moderna, numerosas escritoras pretas, como Chandra Monharty, Irene D'Almeida, Abena Busia, Amina Mama, Trion min ha, Madhu Kishwa, Leela Dube, Shushela Nasta e Audre Lorde, estão elucidando o feminismo negro. Alice Walker, Chikwenye Ogunyemi-Okonjo, Juliana Abbenyi, Clenora Hudson-weens e eu trouxemos a estética literária mulherista ao centro do estudo acadêmico global de gênero.

Desejo frisar nesta nota: o mulherismo, que não foi cunhado por mim, como o feminismo, é uma teoria e metodologia literária reconhecida internacionalmente. Gostaria de indicar aos colegas que ainda não têm conhecimento sobre o mulherismo e o feminismo para navegarem na Internet, ler sobre esses conceitos e que irá surpreendê-los o fato que o mundo tenha ido além do nível de perguntas sobre a autenticidade desses cânones de gênero. Um estudioso acadêmico pode ser definido como um cidadão do mundo das ideias: quanto mais você tiver acesso a ideias, mais se tornará um participante dinâmico neste mundo de horizontes epistemológicos em constante mudança e em expansão. A ignorância não pode mais ser comemorada ou validada nos dias de alta tecnologia e de explosão de informações.




por Carlos R. Rocha - Fuca, Insurreição CGPP, 2020.

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Modibo Keita: Discurso do 1º de maio (1967) como presidente do Mali

 Um discurso de Modibo Keita, Presidente do Mali, contido na rubrica geral de um artigo intitulado "Trabalhadores malianos comemoram com entusiasmo o primeiro de maio de 1967" no órgão de língua francesa da União Sudanesa-RDA. L'Sssor Hebdomadaire (The Weekly Progress), Bamako, Vol 9, No 405, 2 May 1967, pp 4, 5.

 Discurso parte da seleção trazida por Fuca, Insurreição CGPP: 

Palavras de Independência da África II: Nkrumah, Olympio, Keita e Kaunda. (Pdf aqui) ou no link: https://drive.google.com/file/d/1It8Mjb-riPZAuG7gDUOzu15QJ23GJ_Oz/view?usp=sharing

Como em todos os anos, a liderança nacional do partido e do governo se junta através de mim nas festividades do primeiro de maio, que é um grande dia para os trabalhadores.

Este dia se comemora uma importante vitória na luta, muitas vezes mortal, da classe trabalhadora internacional em alcançar maior bem-estar em um sistema de produção do qual essa classe é o fator determinante. É tanto uma luta econômica quanto política, porque a classe trabalhadora compreendeu muito cedo que para se libertar da exploração depende de certas pré-condições políticas, cuja realização envolve todo o sistema social.

Em setembro de 1960, através de nossa escolha de soberania total e completa, que por si só foi um ato de verdadeira revolução, também escolhemos livremente o caminho socialista para o desenvolvimento após uma análise objetiva das condições reais de nosso país.

Já dissemos que nosso país, em razão de sua posição no continente, longe dos portos e isolado dos mercados mundiais, não ofereceu incentivo ao investimento privado sob o regime colonial.

Em condições como essa, deve ficar claro para qualquer pessoa que a maior despesa e o maior esforço no desenvolvimento de nosso país devam obrigatoriamente deixar ao Estado.

Além disso, era impensável, devido às condições sob as quais nossa batalha pela independência nacional foi travada, uma batalha cujo sucesso dependia em grande parte do espírito indomável de luta das massas, sob a liderança dos trabalhadores informados das cidades, que nosso Partido deveria seguir um caminho diferente para o desenvolvimento, cujo único objetivo seria colocar a riqueza principal da nação à disposição de toda a comunidade nacional.

Encaramos qualquer outra escolha simplesmente como traição, que teria enganado as massas de nosso povo em uma vitória que nunca poderia ter sido conquistada sem sua participação decisiva.

E assim, hoje, como sempre, a liderança nacional do Partido continua acreditando que apenas o socialismo, que significa a nacionalização dos principais meios de produção e planejamento, é a maneira razoável e justa capaz de tirar nosso país de seu estado de subdesenvolvimento.

Mas não é fácil construir o socialismo, como já descobrimos.

Ontem, na fase inicial da batalha que tivemos que lutar, e na qual a grande maioria dos trabalhadores desempenhou um papel vital, o problema era ganhar nossa liberdade, destruir um sistema. Hoje, porém, o problema é construir um Estado, uma nova nação, recusando-se a aceitar os padrões simples de submissão, ou seja, procurar encontrar o caminho próprio e original, o caminho certo para nós, o caminho que melhor se adapte às condições objetivas de nosso país.

O jogo é extremamente difícil e extremamente delicado.

Gostaria de lembrar aqui a todos os trabalhadores que, assim como antes, quando estávamos lutando contra a opressão colonial, é seu trabalho dar o exemplo de devoção e altruísmo nesta nova fase da nossa luta, que podemos e devemos vencer, desde que não esqueçamos as condições para o sucesso em uma batalha política.

Antes de tudo, e aqui estou falando para todos os quadros do Partido, nunca devemos esquecer que a primeira condição para vencer uma batalha política é o apoio total das massas ou lealdade da maioria, se não de todo o nosso povo, por nossa política, por nossos objetivos e pelos meios que escolhemos para alcançá-los.

Agora, temos vinte anos de experiência para mostrar que o povo do Mali nunca nos negou seu apoio e confiança.

Nosso trabalho, então, e o que nunca devemos esquecer ou negligenciar, é procurar e encontrar novamente o caminho das massas, permanecer solidamente juntos e explicar-lhes repetidamente nossos problemas e as soluções escolhidas pelo Partido como um todo. Esse deve ser o ponto principal de nossa atividade na situação atual. Se não arcamos com isso, outros que não têm as mesmas razões que a nossa, de se aproximar às políticas do nosso Partido, assumirão o nosso lugar - e, obviamente, eles farão isso à maneira deles.

Devemos estar cientes de outro fato fundamental: desde 1960, os problemas de construção econômica que o país enfrenta se tornam cada vez mais difíceis, cada vez mais complicados. Como consequência disso, nosso Partido precisa crescer e seus quadros devem ampliar seus conhecimentos para assumir novas responsabilidades. É óbvio que, para explicar, convencer e mobilizar o povo, precisamos primeiro nos conhecer e entender os modos de liderança de um Estado. E isso, por sua vez, é um trabalho que está rapidamente se tornando cada vez mais difícil e complexo.

Já sabemos que, à medida que avançamos na aplicação de nossa política de desenvolvimento socialista, todo tipo de dificuldade é encontrada, o que deixa as massas mais desconcertadas com os problemas econômicos. Sob tais condições, devemos estar prontos para os questionamentos que irão nos fazer, porque não importa para onde se vai, o povo precisa entender, se quisermos avançar.

Os quadros políticos e sindicais devem fornecer as respostas a essas perguntas, que nunca devem ser consideradas como suspeitas a priori.

A única maneira de os quadros serem capazes de assumir essa tarefa delicada é continuar com seus estudos intelectuais e ideológicos, para compreender cada vez mais claramente os problemas complexos de nossa construção nacional em um mundo dividido, cada vez mais conturbado e inquieto.

Devemos estimular e incentivar o diálogo no Partido e em todas as nossas organizações democráticas e populares. No entanto, é óbvio que nós, líderes políticos e administrativos que formam os quadros, não ficaremos tentados a encorajar o diálogo, mesmo que ele seja o sopro de vida para partidos únicos, se não temos respostas a oferecer e se estamos confusos diante dos problemas políticos e econômicos que nos pressionam por todos os lados.

Isso nos dá uma compreensão da perigosa tentação de substituir o método de persuasão e explicação, o único adequado às nossas políticas, por restrições, matando assim o espírito da livre discussão, ficaria claro que isso não teria proveito em um governo como o nosso.

Portanto, é dever dos trabalhadores mobilizar dentro de suas organizações trabalhistas para torná-las movimentos ativos, cientes do fato de que são os principais seguimentos interessados, pois são as pessoas que mais se beneficiam com o advento triunfante de uma economia socialista.

Eles também devem entender que cabe a eles o ônus da vigilância, para garantir que os princípios democráticos estabelecidos por nosso Partido sejam aplicados adequadamente.

Os trabalhadores também devem redobrar seus esforços no trabalho cotidiano e despertar para o fato de que nunca construiremos nosso país com preguiça, desordem e irresponsabilidade.

Em suma, é essencial que, ao fazermos nossas declarações públicas, elas devem corresponder às nossas ações cotidianas, os quadros trabalhistas e políticos em todos os lugares fornecem um exemplo de altruísmo, honestidade e devoção aos ideais daquele socialismo que prometemos construir.

Desde aquele dia, sete anos atrás, quando aderimos à soberania, que significa responsabilidade, a liderança nacional nunca traiu sua confiança nos trabalhadores e em seus líderes.

Em nossos serviços públicos, em todas as empresas e empresas estatais, grupos políticos e comitês sindicais foram criados.

A liderança nacional do Partido e do Governo apontou repetidamente o papel adequado dos órgãos desses trabalhadores em nossos serviços públicos, nossas corporações e empresas estatais, que são a base material da economia socialista que estamos construindo.

O estatuto geral que rege as empresas nacionais atribui às organizações de trabalhadores certas responsabilidades reais na administração: enquanto os órgãos do Partido e da União recebem o trabalho de motivação e controle em todos os órgãos do Estado.

Além disso, o Partido e o Governo nunca hesitaram em confiar as mais altas responsabilidades aos quadros treinados na luta sindical.

Mas devemos admitir que algumas fraquezas notáveis vieram à tona. Frequentemente, as Associações de Trabalhadores da Administração, que representam uma conquista social da maior importância, se tornaram estrelas, por assim dizer, e alguns líderes se separam dos outros trabalhadores que eles representam.

Os comitês do Partido e do sindicato, que deveriam promover uma concorrência saudável entre os trabalhadores, que deveriam criar novas relações de cooperação em nossas corporações e empresas estatais, nem sempre tiveram êxito em suas tarefas.

Além do mais, devemos repetir que a luta contra a fraude e a especulação não chegou a um fim vitorioso, porque os trabalhadores, apesar de sua maioria, não conseguiram assumir esta tarefa vital na construção de nossa economia.

Os trabalhadores ainda precisam entender que aqueles que pilharam a riqueza nacional, aqueles que, por suas práticas fraudulentas, põem em risco nosso governo socialista e suas realizações altamente importantes, devem ser rastreados impiedosamente e entregues aos órgãos policiais do Estado.

Em muitos casos, os trabalhadores simplesmente não tinham consciência política e ainda não conseguiram se livrar de certos complexos que os fazem sentir que isso seria como caguetar, e não uma demonstração de coragem cívica.

No entanto, devemos compreender que o inimigo mais danoso em nosso governo é a fraude e a especulação em nossa produção essencial.

Todo membro ativo da União Sudanesa das Repúblicas Democráticas Africanas, e principalmente os trabalhadores, devem entender que a luta contra práticas especulativas, uma fonte de inflação e de altos custos de vida, não é simplesmente o trabalho dos serviços especializados do Estado. A extensão do crime contra a nação é tão grande que exige a ajuda de todos os membros ativos para que ele chegue ao fim, com todo o rigor necessário.

Camaradas trabalhadores, Mali tem seus detratores juramentados que veem apenas nossos problemas, as falhas inerentes a qualquer empreendimento humano, que fecham os olhos para nossas realizações e nossos sucessos, embora estes estejam lá para todos verem.

E, portanto, nunca podemos voltar com muita frequência para observar as realizações do nosso Partido durante os breves sete anos desde que conquistamos nossa independência de volta.

Todos os membros ativos de nosso Partido e de nossas organizações democráticas e populares devem estar profundamente cientes do alcance e do significado dessas realizações, para estarmos mais bem armados contra os inimigos do nosso governo, cuja propaganda insidiosa deve ser combatida com os fatos que existem, palpáveis e inegáveis. Devo poupar uma enumeração dessas realizações aqui.

Obviamente, tudo isso não poderia ter sido feito sem alguns erros, alguns graves, ou sem falhas, algumas amargas.

Mas somos um partido com um longo histórico de lutas feitas de reveses e sucessos, e por isso nunca tivemos medo de encarar nossos erros de frente, e realizar nossa própria autocrítica, condição indispensável para nossos futuros saltos de progresso, e lembrar em todas as circunstâncias que nosso país não pôde ser construído com calma.

Essa política sempre exigiu um grande esforço de austeridade de todas as pessoas; ainda exige sacrifícios que o Estado deve distribuir de maneira justa entre o povo, de acordo com a capacidade de cada um de contribuir.

Aqui, novamente, os trabalhadores, a maioria dos quais são pessoas privilegiadas em comparação com os camponeses, devem dar o exemplo de altruísmo, e devem se livrar de uma vez por todas da ideia ultrapassada de direitos finalmente conquistados.

Em nossa situação atual, não pode haver interesse adquirido, direito adquirido na perpetuidade, desde que nossa principal preocupação seja economizar para que possamos investir e lançar as bases para o avanço econômico de nosso país.

Em suma, deve ficar claro a todos os trabalhadores que os salários em qualquer Estado moderno só pode ser uma função do volume total de produção, que se resume finalmente às possibilidades econômicas da nação.

Todos nós, em nossos escritórios, nossas lojas e nossos campos, devemos perceber que é sendo diligente em nosso trabalho, e aumentando nossa produtividade, que aumentaremos nossa renda nacional, e, assim, permitir ao Estado pagar mais aos trabalhadores e elevar seus padrões de vida, que é a aspiração natural de qualquer estado socialista.

Desde 1966, alguns grandes investimentos foram feitos, com a ajuda de auxilio externo e os enormes sacrifícios que fizemos. Atualmente, o Estado do Mali possui uma quantidade muito considerável de capital, cuja administração adequada deve permitir que nossa economia gere o impulso e a expansão necessários para resolver nossos problemas financeiros.

A consecução desses objetivos pressupõe uma redução no custo de produção e uma alta taxa de retorno em todos os setores da economia, graças à competência e consciência que os trabalhadores demonstram ao motivar as unidades em que atuam. O principal motor do desenvolvimento econômico é o homem tecnicamente qualificado e politicamente consciente, que deve sempre procurar ampliar seu conhecimento técnico e sua formação cultural geral.

O grau de consciência política pode ser medido por certas atitudes que podem ser vistas todos os dias no comportamento do trabalhador em serviço: o respeito pelo bem geral e pelo bem público, a lealdade à empresa, demonstrada não apenas pela pontualidade, mas também por seu trabalho duro e constante durante o horário de trabalho.

Neste momento, a República do Mali precisa de motoristas que mantenham seus veículos adequadamente e tenham sempre o cuidado de poupar as despesas do Estado que devem sair de nossas reservas de moeda. Precisamos de trabalhadores que evitem todo desperdício de material e toda deterioração de material em nossas fábricas. Precisamos almoxarifes que vigiem atentamente os estoques confiados a eles.

Se não conseguirmos mais homens como esses em nossas fábricas e nossos serviços, nossa experiência será irrevogavelmente comprometida pela mediocridade e descuido dos homens que devem conduzi-la. Todo trabalhador deve entender que seu destino está ligado organicamente ao de todos os setores da economia.

Falando novamente sobre uma concorrência saudável, um bom método acaba de ser colocado em prática no estabelecimento do título de "trabalhador de vanguarda", como recompensa para os trabalhadores que desinteressadamente fazem seus trabalhos, tornando-os um exemplo para seus companheiros. Por outro lado, devemos erradicar o efeito nocivo dos trabalhadores incompetentes e descuidados. Repito que os responsáveis por nossos serviços públicos e empresas não devem hesitar em tomar as mais severas sanções contra esses homens.

Camaradas, sempre dissemos que a independência, para nós, não é um fim em si, mas apenas um meio de libertar nosso país da penúria econômica.

Aqueles que tiveram a coragem política de dizer não à escravidão e assumir sua independência diante de ameaças e intimidações não podem vacilar em coragem quando chega a hora de enfrentar todas as consequências do ato. Ao lutar por nossa soberania, nossa ambição era e é sair da armadilha do subdesenvolvimento – e poder explorar adequadamente a grande riqueza de nosso vasto e belo país.

Essa ainda é a mesma batalha. Eu já disse muitas vezes que estamos destinados a ter sucesso, destinados a vencer a batalha pelo futuro do nosso país, e também porque não há dúvida de que o resto da África achará impossível permanecer indiferente à experiência do Mali.

Mais uma vez, a ação dos trabalhadores em seus sindicatos, nos órgãos do Partido e de outras organizações populares, desempenhará um papel preponderante, se não determinante, no sucesso desse poderoso trabalho de renovação nacional.

Irrevogavelmente, votamos em favor do socialismo, porque acreditamos que esse é o caminho do desenvolvimento que responde às verdadeiras necessidades e interesses de nossa nação.

O capitalismo, apesar dos prodigiosos avanços que fez para a humanidade nas áreas da ciência e das técnicas, não conseguiu resolver o problema social. Falhou em abolir a pobreza entre as grandes massas populares e ainda mantém a grande maioria das pessoas rigidamente excluídas das riquezas e do prazer de aprender.

Foi dito que "as civilizações morrem por causa de sua estreiteza". Quanto a nós, finalmente escolhemos um regime econômico baseado na propriedade coletiva das grandes riquezas de nosso país, para que nenhuma minoria monopolize os frutos do trabalho da sociedade, e para que uma divisão justa do produto do trabalho possa estar subjacente à nossa organização social.

É assim que nos apresentamos diante de todos os nossos parceiros, que devem nos aceitar como somos.

A contabilidade da ação do nosso Partido está lá e é positiva, e claramente visível para todos aqueles que não são impedidos pelo ódio e pela má fé de vê-la.

Foi antes de tudo nossa soberania inquestionável que nos deu liberdade, a joia mais brilhante de um povo.

São nossas conquistas nos domínios econômico e social que são a admiração de todos que vêm visitar nosso país sem ideias pré-concebidas.

Mas o trabalho ainda não está concluído, e o caminho a seguir é longo e difícil.

A liderança nacional do Partido está convencida de que a tarefa de renovação nacional à qual nos comprometemos não está além dos poderes de nosso povo, que escolheram irrevogavelmente a liberdade e um caminho de desenvolvimento que levará a uma sociedade mais justa e equitativa.

Depende do grau de conscientização dos trabalhadores, sua mobilização contínua para proteger as realizações de nossa revolução, e a pureza da orientação de nosso Partido, se nossas ambições e aspirações em direção a um maior bem-estar na justiça social serão realizadas em breve.

O empreendimento, camaradas trabalhadores, é difícil, mas é também inspirador. Contudo, a evidência não é suficiente para mostrar que a dificuldade nunca afastou o povo maliano que se apresenta com alternativas heroicas quando se depara com questões que envolvem sua liberdade?

Agora digo: tenham coragem e com a garantia de que o sucesso está no fim do caminho, desde que todos ajudem a preservar a unidade política que nós trouxemos em nosso país, eu terminarei com o grito, viva o Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Mali. Viva a solidariedade internacional dos trabalhadores em todos os continentes. Viva a União Sudanesa das Repúblicas Democráticas Africanas!