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quarta-feira, 31 de março de 2021

Os Quilombos e a Rebelião Negra – Clovis Moura – Breve Nota

O texto a seguir em forma de tópicos ou notas, foi feito em decorrência da leitura em conjunto, entre Fuca Cgpp e Joel Consp., do livro Os Quilombos e a Rebelião Negra, de Clovis Moura. Um livro curto de síntese, com 105 páginas, onde pudemos dialogar sobres vários aspectos da luta preta, tanto lá quanto cá, não no sentido de esgotamento do assunto, mas no de despertar a formação contínua através dessa brevidade didática.

Introdução

- Clovis Moura vai evidenciar o ser negro como agente de resistência constante ao sistema escravista, resistência que se dava na negação do trabalho, na negação de ser escravo, pois a todo momento se pensava em fuga da escravidão.

- no sistema escravista existia uma luta de classes. Senhores [brancos] e escravizados [pretos]. Essas duas classes vão compor a base da estrutura do Brasil escravista.

- pra dinamizar essa resistência, o escravizado negava o trabalho escravo já que ele não conseguia modificar o sistema. Com isso, ele vai procurar criar sistemas alternativos.  

- período histórico entre 1550 até 1888. Século XVI ao século XIX.

- O autor vai combater a defasagem histórica em dois pontos: o primeiro é que a escravidão não era a relação de trabalho que girava a economia do brasil escravista. (sendo que era, pois enriquecia o senhores, ou seja, já era, de certa forma, capitalismo). O segundo ponto apresentava o ideal de vivência harmônica na relação entre casa grande (senhores) e senzala (escravizados). Em referência a uma das teses de Gilberto Freyre. Condenando os conceitos de “bom senhor”, “homem cordial,” e “democracia racial.”

- Enfim, nesta introdução, o autor enfatiza que no livro vai se demonstrar a importância social dos negros, especialmente os quilombolas.

Os Quilombos na História Social do Brasil

- A definição de quilombo de acordo com a resposta do Rei de Portugal ao Conselho Ultramarino (1740), “toda habitação de negros fugidos que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados nem se achem pilões neles”.

- o quilombo não foi um fenômeno esporádico, teve constância em todo o brasil.

- o quilombo tinha vários tamanhos de acordo com o número de habitantes, e eram todos armados, os maiores eram: Palmares 20 mil, Campo Grande(Mg) e Ambrósio(mg) 10 mil cada.

- existia um caráter de conversão de escravizados da senzala ao quilombo, pois mantinha-se sempre um diálogo entre senzala e quilombo. Muitas informações circulavam.

-  o quilombo mantinha uma relação comercial de troca de produtos ou excedentes com pequenos agricultores da vizinhança.

Organização e Economia dos Quilombos

- Palmares – o maior exemplo do grande quilombo – era uma confederação de quilombos. Abrangendo um raio de mais de 120km (25 léguas), de acordo com os estudos de Edson Carneiro (1947).

- O autor aponta que “A religião da republica era um cristianismo fortemente sincretizado com valores religiosos africanos.”

- a família era poligâmica e não havia personagem responsável pelo segredo religioso da comunidade.

- “Em cada mocambo o chefe era senhor absoluto, mas, nas ocasiões de guerra, reuniam-se para deliberar conjuntamente, sob as ordens do Zumbi, ou outro chefe da república, na Casa do Conselho do Macaco.”

- A base econômica era a agricultura policultura. Feijão, mandioca, batata-doce, milho.

- Vivendo num regime comunitário, organizado à base da agricultura e da criação de subsistência, Palmares era um reduto em franco florescimento, apesar da ameaça sobre ele.

- o Ambrósio em MG, por exemplo, seguia a mesma estrutura de Palmares com acrescimento de maior pecuária.

-  Do ponto de vista da organização política, havia obediência incondicional ao chefe Ambrósio, líder que, segundo um cronista da época, era dotado “de todas as qualidades de um general”. Com uma hierarquia que constituía uma espécie de Estado-Maior.

- As colheitas eram conduzidas ao paiol para distribuição coletiva.

A Força Militar dos Quilombos

- Conforme a estrutura de média a grande do quilombo era necessário uma organização hierárquica militar mais estruturada para defesa tanto da população quanto da economia desses quilombos que sofriam diversas investidas das forças da colônia.

- Ou seja, exigia-se grupos armados e também táticas e estratégias territoriais de barricadas até armadilhas para conter os invasores.

- O autor não aponta o contingente do exército de defesa de Palmares, mas mostra que chegou a ser necessário forças de 9 mil homens ao comando de bandeirantes, como Domingo Jorge Velho, para derrotar Palmares, que havia resistido a todas as expedições punitivas de 1630 até 1695.

- Palmares deixou seu legado e exemplo de “maior resistência – social, militar, econômica, e cultural – ao sistemas escravista.”

- Outros quilombos foram proeminentes, tanto de Preto Cosme no Maranhão, mas de destaque também o de Ambrósio, ou depois como Campo Grande (MG), que fora destruído após 3 anos (1957-58-59) de preparo do bandeirante Bartolomeu Bueno de Prado contando com 400 homens.

- Preto Cosme que comandava um quilombo de 3000 pessoas no maranhão tinha piquetes de guerrilheiros que promoviam saques nas fazendas dos brancos e ainda traziam mais insurretos, tinha sua estrutura centralizada. Cosme é capturado após fazer alianças com mestiços e brancos (balaiada) sendo delatado para Caxias em 1841, foi condenado e enforcado.

- O autor exemplifica mais um quilombo com estrutura e base militar agora no estado do Rio de Janeiro, o de Manuel Congo. Que após boa tática de combate consegue derrotar a forças da Guarda Nacional, mas, de certa forma, se empolgaram nos contínuos ataques e ficaram desguarnecidos e foram capturados em 1938. Com envolvimento de Caixas também nesse.

As Insurreições Urbanas e os Quilombos

- Vai utilizar-se do exemplo da Grande Insurreição, A Revolta dos Malês, em Salvador (1835). Levantando além da questão urbana e rural, mas também as diferenças religiosas existentes. Contudo, liderada por negros islamizados.

- A questão também é buscar delinear até que ponto se sobressaiu o motivo da luta de classes ou os motivos religiosos. O autor então acredita que a religião foi um elemento de suporte ideológico de organização coletiva perante uma opressão objetiva que existia, tanto o sistema escravista para os negros ainda escravizados como de racismo para o negros livres nessa sociedade escravista.

- Liderança de Hausás e depois de Nagôs que então se tornam chamados malês, mas que se autodenominavam mulçumanos. Pode ser que devido a linguagem religiosa puderam ter uma maior capacidade organizacional com o uso de estratégias militares oriundas da África, inclusive na confecção e uso de armas.

- Ao pontuar a introdução do Islã na África, o autor rememora que a penetração islâmica na África existiu com o objetivo de controle social, um tipo de colonização também. Apesar de, nesse contexto (Brasil), ser um fator utilizado como mudança social através das revoltas dos malês.  

A Grande Insurreição

- organizada nos mínimos detalhes entre as várias nações (etnias) africanas. Em Salvador, 1835, com revoltas já ocorrendo desde 1807.

- objetivo: tomada de terra dos brancos...

- Perpassou alguns detalhes do planejamento da insurreição assim como apontou as principais pessoas envolvidas.

- Tendo ocorrido a delação (traição) a insurreição acabou sufocada. Prisões, condenações e morte dos rebeldes.

Reivindicação e Consciência do Escravismo

- Apesar das diversas lutas radicais e violentas dos insurretos pretos escravizados, aqui o autor discorre sobre alguns movimentos que visaram uma busca de negociação para obterem alguns direitos, sobretudo nos modos de trabalho. Uma espécie de salto gradativo contra o escravismo.

Os Quilombos e a Abolição

É retratado pelo autor o cenário de rebeldia dos escravizados versus a moderação dos abolicionistas para acabar com o sistema escravista. Apesar de ter existido uma ala mais radical dos abolicionistas. Com isso, o autor não deixa perder de vista que as lutas dos pretos escravizados vieram desde muito antes do abolicionismo (limitado), e que de fato foram as rebeliões que tencionavam os brancos que dominavam. Até devido a isso temos como o dia da consciência negra o 20 de novembro ao invés do 13 de maio. (Reivindicação do Movimento Negro)

Conclusões

“Várias foram as formas de resistência do escravo negro ao regime escravista. Mesmo com todas as limitações que a estrutura do sistema impunha ao cativo, ele, ao contrário do que afirmam aqueles que seguem a chamada historiografia acadêmica, resistiu de várias formas e níveis de importância durante todo o tempo em que a escravidão perdurou. Resistiu usando desde formas ativas, como as de Salvador, ocorridas durante o século XIX, até os quilombos, disseminados em todo o território nacional – do Rio Grande do Sul ao Pará – e as guerrilhas que permeavam as duas formas fundamentais de resistência.”(...)

(..) “A violência, desta forma, penetrava, direta ou indiretamente, no relacionamento entre uns e outros. É a partir da compreensão deste fato que podemos analisar a sociedade brasileira e encontrar as leis fundamentais que deram conteúdo à sua dinâmica.”(...)

“Mediando esses elementos de violência, vemos vários mecanismos amortecedores serem criados no sentido de neutralizarem, ou, pelo menos, diminuírem os seus níveis de intensidade. Por outro lado, a Igreja Católica (ela própria proprietária de escravos) procurará, quer na escravidão nordestina do chamado ciclo do açúcar, quer na mineira ou paulista, montar um aparelho ideológico capaz de dar aos escravos as razões de por que estavam em cativeiro e, aos senhores, racionalizar a violência do opressor. Dessas diversas tentativas de esconder-se a violência e/ou justifica-la nasceram vários estereótipos, um dos quais, conforme já firmamos, é o da benignidade da nossa escravidão.

“O medo, repetimos, é um fator psicológico que influenciará todo o comportamento da classe senhorial no Brasil, determinado, muitas vezes, paradoxalmente, o nível de agressividade e violência contra a pessoas e a classe dos escravos.”

https://regabrasil.files.wordpress.com/2018/10/os-quilombos-e-a-rebelic3a3o-negra-1986.pdf

baixe o pdf acima.

Fotos de dois dos encontros, março/2021.







sábado, 27 de maio de 2017

As insurreições Ussás - 27 de maio de 1807

No dia 27 de maio de 1807, na Bahia, uma grande Revolta Urbana de Escravizados estava planejada, a maioria Ussás. O objetivo era a tomada do poder, mas que foi delatada por um escravo traidor. Essa fez parte de uma série de Insurreições Escravas ou também chamadas Revolução dos Malês. Mesmo com o fracasso desse ano, os africanos escravizados continuaram a mobilização e organização de diversas revoltas, ano após ano. Unidos evidentemente pela Pretitude.

Abaixo segue o trecho extraído do livro A Revolução do Malês de Décio Freitas.

As insurreições Ussás

"(...) A revolta dos Ussás vinha sendo organizada paciente e meticulosamente. Sabe-se que tinha dois chefes principais: o liberto Antônio e o escravo Baltazar. Antônio vivia de pequeno comércio entre Salvador e Santo Amaro, gozando de grande prestígio entre os demais negros e muita confiança entre os comerciantes. Com o titulo de embaixador, era o coordenador geral do movimento. Baltazar, escravo do seringueiro Francisco das Chagas, morador no Corpo Santo, usava o titulo de capitão e servia de elemento de ligação entre Antônio e os demais conspiradores. Consta que Antônio era um negro de singular inteligência e simpatia. No seu casebre compareciam assiduamente os negros Florêncio, escravo do capitão José Antônio Guimarães; Guilherme, escravo de João Branco; André, escravo da viúva de Jacinto Damásio; Luis, escravo do capitão Joaquim Portugal. Afora estes, conhecemos os nomes de outros negros que exerciam intensa atividade conspirativa em diferentes pontos da cidade. Faustino e Alexandre, escravos de José Gomes de Araújo; Miguel, escravo de José Carvalho de Albuquerque; Simplício, escravo de Antônio Barreto e Tibúrcio, escravo de pessoa ignorada. Um negro de nome Inácio, escravo de Custódio Duarte e oficial de ferreiro, vinha fabricando os ferros das flechas e facas a serem usadas. Além disso, os conspiradores haviam reunido pistolas e espingardas. O armamento vinha sendo armazenado em pelo menos dois lugares: o casebre de Antônio e o do escravo Francisco, de propriedade de Antônio da Silva Lisboa. No casebre de Antônio havia cerca de quatrocentas flechas, molhos de varas para arcos, meados de cordel, espingardas, pistolas e um tambor. 

Os escravos do Recôncavo, principalmente os da vila de Santo Amaro, participavam da conspiração. 
O plano consistia em se apoderarem da Casa da Pólvora e das Armas, provendo-se assim de mais material bélico. Ao mesmo tempo, outros incendiaram a alfândega e a capela do arrabalde de Nazaré. O objetivo dos incêndios era desviar a atenção da tropa e do povo. Nessa altura, chegariam os rebeldes do Recôncavo. Haveria uma matança dos senhores, e, uma vez vitoriosos, constituiriam um governo, elegeriam um rei e se apossariam das embarcações surtas no porto, para retornar à África. O levante estava marcado para a madrugada do dia 27 de maio. No dia 21, entretanto, o escravo de um advogado chamado Elias Abreu delatou a insurreição ao amo. No dia seguinte, o advogado pediu audiência ao conde da Ponte e lhe transmitiu o que ouvira do escravo. O conde pediu ao denunciante que obtivesse mais pormenores e os transmitisse ao seu ajudante de ordens João Girão, encarecendo especialmente que descobrisse os nomes dos líderes e localização do casebre de Antônio. Na véspera do dia 27, o governador recebeu as informações solicitadas.

O dia marcado para a insurreição era o da procissão de Corpus-Cristi. Como se nada houvesse, o governador participou calmamente da procissão. Findo o ato religioso, agiu rapidamente, expedindo ordens de próprio punho aos chefes dos corpos de infantaria e artilharia para que ficassem de prontidão e preparassem patrulhas. As 6 horas da tarde, silenciosamente - "sem toque de tambor, sem que na cidade soasse o menor ruído" - as patrulhas bloquearam as entradas e saídas da cidade. Os capitães-do-mato saíram pelos caminhos prendendo todos os escravos que encontravam. O ajudante João Girão e o capitão João de Chastinet, à frente de forte contingente, cercaram e invadiram a casa de Antônio, prendendo-o juntamente com treze outros negros que lá se encontravam. Em outros pontos da cidade, as patrulhas prenderam os demais cabeças, o mesmo fazendo os capitães-do-mato no Recôncavo.

No dia seguinte, o conde da Ponte publicou bando em que ordenava que todo escravo encontrado nas ruas da cidade depois das 9 horas da noite sem escrito de seu senhor, ou em companhia dele, fosse preso e açoitado nas cadeias públicas. Comunicando a medida a Lisboa. dizia que "este passo que poderia ser reparável em outra qualquer ocasião, foi geralmente aprovado por todos os habitantes, que não podiam por si sós conter a liberdade e falta de sujeição dos seus escravos.

(...) Pouco menos de um anos depois, a 28 de março, os negros Antônio e Baltazar foram condenados à morte e os demais a açoite em praça pública.

(...) O fracasso de de 1807 não desanimara os ussás. Desde a metade do ano de 1808, trabalhavam na organização de novo levante. Aliciaram escravos e libertos de outras nações, principalmente nagôs e geges.