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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Apresentação da Coleção Pensamento Preto Volume 5 – por Fuca

Apresentação do Livro Coleção Pensamento Preto 5 – 2021 [Fuca]

Coleção Pensamento Preto vol. 5

Vendas pelo Instagram da Editora Filhos da África

https://www.instagram.com/editorafilhosdaafrica/

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Já transcorremos um quinto do século 21, e a indagação contínua e sempre pertinente é a de: qual a direção que o povo preto está tomando?

Essa pergunta podemos fazê-la no âmbito doméstico de diáspora africana em que nos encontramos, como globalmente e sobretudo de olho no continente-mãe, África. A despeito de qualquer tipo de avanço individual ou de uma certa classe minúscula de uma burguesia negra, na ótica de povo como um todo, como nos encontramos no cenário mundial?

Dentre tantas questões que pairam em nosso dia a dia, escolher uma em um cenário de crise global, - de trabalho, de terra, de soberania alimentar, de habitação, de perspectiva em geral, e para agravar, sob uma pandemia mundial,- é uma tribulação em si. Que o sistema capitalista vigente vive em crise não deve ser novidade, pois, de fato, o baluarte do capitalismo se dá justamente pela manutenção das desigualdades sociais; o capitalismo se promove através de um desenvolvimento geográfico desigual 1 [e combinado,] independentemente de sua reinvenção nos processos de acumulação do capital ao longo dos tempos. Tal sistema em si já é um monstro e tanto, sobretudo para o nosso povo, pois o capitalismo é filho da Europa, e sua gênese remete às brutalidades do sequestro, do tráfico transatlântico e do comércio de africanos escravizados por 400 anos.

E não parou por aí, os europeus ainda impuseram a colonização do continente africano, configurando, principalmente, um embate civilizatório entre a Europa e os “Outros”. Se eles detinham motivações econômicas, eles também estavam imbuídos de uma pretensa supremacia branca. Em sua empreitada, o lema ‘nenhuma piedade’ era o que prevalecia, até devido a isso nenhum tipo de luta do nosso povo deve fazer apelo moral aos brancos, pois tudo isso não foi (e nem é) um problema para eles. Ao lidarem e promoverem a barbárie, apenas era necessário justificarem suas ações, e a manipulação estava pronta: levar o progresso e a civilização aos “selvagens” e “atrasados” – os “outros”.

Os estudos mais detalhados e clássicos acerca desse período de terror contra o povo preto, se encontram neste livro. Ademais, através da bibliografia da Coleção Pensamento Preto: Epistemologias do Renascimento Africano, em seus cinco volumes, é apresentado a evolução histórica da supremacia branca e suas invasões/conquistas por meio da destruição e interrupção do processo histórico-social preto-africano. Esse é um dos pontos que é possível compreender ao imergirmos nas diversas possibilidades de diálogos, que serão elencados aqui (parte deles) mais para frente.

Sobrevivemos a tudo isso, - “o maior milagre de todos os tempos!” -  tivemos muitos lutadores e lutadoras do nosso povo preto que ao longo dos séculos nunca apanharam calados, nunca aceitaram a subjugação dos nossos e por isso estamos aqui lutando hoje. Em deferência aos nossos irmãos e irmãs que preservaram nossa cultura através da religião africana, através das artes africanas, através dos clubes recreativos, associações e organizações comunitárias, ou de outra forma, através dos nossos quilombos físicos e ideológicos; 2 e dos pretos que se lançaram para contar, registrar e espalhar a nossa história sob o viés preto e de nossa luta pela vida. Motivados sobretudo pelo amor que mantiveram pela humanidade preta.

Agora, o que está implícito na questão inicial é justamente que precisamos fazer algo a mais como luta, outro tipo de projeto com mais propósito, que acaba desencadeando em outras perguntas: como podemos de alguma forma unir as várias frentes pretas na direção de uma construção genuinamente preta? A construção da nação preta. Como bem disse o irmão Robert Sobukwe, “Nunca poderemos fazer o suficiente pela África, nem poderemos amá-la o suficiente. Quanto mais fazemos por ela, mais queremos fazer.” Ou seja, é pelo amor aos pretos que devemos nos direcionar pela autodeterminação preta. Uma busca, um projeto, um destino declarado pelo Renascimento Africano. 3

Para pensar numa direção preta precisamos estar cientes dos nossos interesses enquanto povo e dos interesses dos outros em relação a nós. Quando falamos de interesse (ou mesmo agência) já recai uma grande dificuldade, pois para isso é preciso pensarmos e nos enxergarmos enquanto um povo em potencial principalmente pela cor da pele/fenótipo africano. Se não mais nos vemos enquanto povo é devido ao histórico mais recente de escravidão e colonização, e não tem como subestimar os esforços dos brancos nesse empreendimento sujo e nefasto – ou como caracteriza o Dr. Du Bois, “a mancha mais desprezível na história humana moderna”.

Portanto, ao nos livrarmos das brutalidades dos açoites, ainda carecemos da libertação da mente, então, em suma, uma das faces da relevância das epistemologias do renascimento africano é a descolonização mental, e nesse quesito a coleção pensamento preto fornece subsídios fundamentais de forma coesa e estabelecendo diálogos na dialética africana como um dos métodos, e promovendo uma ligação de continuidade de pensamentos, propostas, paradigmas, ações, etc.  Que não só visa resgatar os conhecimentos que não deveriam chegar até os pretos, mas que pretende não confundir o povo preto, e sim propor a leitura e análise crítica para o prosseguimento de nossos objetivos revolucionários enquanto povo preto, esforços que são conectados através da Revolução Preta Mundial 4 rumo ao Renascimento Africano.

Esses são conceitos fundamentais que evidenciam a direção de luta, que mostram a importância de ideologias, filosofias, pesquisas e teorias das ciências humanas e sociais que visem abarcar a particularidade preta e minar as confusões atiradas em toneladas pelos supremacistas brancos. O Dr. John Henrik Clarke neste volume vai nos dizer que: “Os povos Africanos de todo o mundo precisam de uma definição de história que possa ser operacional em diferentes lugares, em diferentes momentos e operacional em todos os lugares onde vivem os africanos. Por sermos as pessoas mais dispersas da face da Terra, nossa definição operacional de história deve ter um alcance universal, aplicável às pessoas em geral e especificamente ao povo Africano.” Essa definição deve estar calcada no próprio continente africano. Os pretos diaspóricos devem e necessitam lutar em seus respectivos territórios [inimigos], porém a base de luta é a África, da África fomos sequestrados; a África é nossa base civilizatória, ser africano é um privilégio e onde quer que desembarcássemos através da migração forçada, nossa luta foi constante pela liberdade, nossa resistência cultural foi imensa, não à toa um extenso aparato de destruição física e cultural foi desenvolvido pelos brancos para cometer o maior crime contra um grupo de seres humanos, o holocausto dos pretos, 5 sem misericórdia. O único continente que é a casa dos pretos é o africano, a vida em diáspora, muitas vezes, fará com que ocorra um distanciamento dos pretos em relação a sua casa, consubstanciado pelas campanhas das mídias em massa e da educação racista.

Por isso, como o irmão Malcolm X adverte certeiramente neste livro, “qualquer tipo de organização baseada aqui não pode ser uma organização eficaz. Qualquer coisa que você tenha a seu favor, se a base estiver aqui, não será eficaz. Sua e minha base devem estar em casa, e esta não é a nossa casa.” Veja bem, nosso irmão trouxe a perspectiva de um preto em diáspora nos EUA, e a despeito de particularidades existentes entre os Estados-nações em que os pretos se encontram, “a mancha mais desprezível na história humana moderna”, o colonialismo, o imperialismo, o neocolonialismo, o capitalismo, a destruição promovida pela supremacia branca é comum a todos os pretos no globo, infelizmente esse genocídio contínuo é ainda um fio condutor para a internacionalização da luta preta moderna. Obviamente, vem de tempos imemoriais os laços básicos de Unidade Cultural Africana, mesmo em um continente extenso, rico e diverso em cultura, línguas, grupos étnicos, etc.

E sobre essa Unidade Cultural da África Negra, a Dra. Lélia Gonzales, através de uma entrevista bem acurada e livre ao mesmo tempo, vai explicar a importância do trabalho e das pesquisas de Cheikh Anta Diop nesse campo; a Dra. Ifi Amadiume segue na mesma linha de tema, porém enfatizando o aspecto fulcral do matriarcado africano para a teoria da Unidade Cultural Africana. Por falar em matriarcado africano neste livro, nos remetemos também ao belo texto da irmã Ayana Omy, “O nascimento de uma comunidade.”

Dá para notar a diferença entre nosso interesse como povo preto-africano com o de qualquer outro povo? E a menos que estivermos estabelecido nossa bases de Nacionalismo Preto/Pan-Africanismo não há o que falar em lutar pelo interesses de outros povos, outras ideologias, filosofias, teorias e organizações. Os nossos desafios já são imensos, pois precisamos organizar a renascença africana numa perspectiva de longo prazo, e além da organização teremos o tensionamento das forças inimigas com todo o aparato que eles já demonstraram ser capazes de desferir por poder. Nossa ancestral, jornalista, organizadora e ativista Amy Jacques Garvey vai nos alertar aqui que: [os] “Homens no poder não clamam por orações ou apelos à consciência. Eles só respeitam a FORÇA igual à sua ou superior.”

Mais uma vez, em outras palavras, os interesses dos pretos sérios na luta devem ser pelo Poder, pela Terra, se valendo da Força oriunda de um Pan-Africanismo, no âmbito militar, econômico, cultural, industrial, cientifico, espiritual e político. O Dr. Clarke conclui: “A terra é a base da nação. Não há como construir uma nação independente e forte quando a maior parte da terra está sendo controlada por estrangeiros que também determinam o status econômico da nação. Os Africanos precisam estudar seriamente seus conquistadores e seus respectivos temperamentos. Nem os europeus, nem os árabes, vieram à África para dividir o poder com nenhum Africano. Ambos vieram como convidados, mas permaneceram como conquistadores.”

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Na disciplina geográfica este volume vai contribuir através dos textos de Malcolm X, Du Bois, Queen Mother Moore [ressaltando a importância da terra], Stokely Carmichael, e é muito interessante o papel que o espaço geográfico tomou através desses estudos, analises e falas. A geografia sendo ela mesma a síntese de várias outras disciplinas assume seu lugar não só na vertente meramente descritiva, mas com uma perspectiva ativa e crítica. No próprio Dr. Du Bois a abordagem do espaço está incrustada numa análise sociológica. Em suma, é evidenciada a importância da África não só pelo o que o continente produziu e desenvolveu por si mesmo, mas como também o que outros povos e impérios produziram em cima da África, ou baseado no continente africano.  Decerto, essa ideia contrapõe a visão determinista e racista de que nada nunca havia sido produzido na África, que nunca houvera civilização africana até a invasão europeia. A riqueza de detalhes do estudo do Dr. Du Bois faz dele um texto ainda mais indispensável.

Na disciplina antropológica temos contribuições precisas, com quebra de paradigmas e a própria problematização da antropologia como ciência. A Dra. Iva E. Carruthers ao evidenciar que o sistema de gestão da educação branca [séculos XIX e XX] comandado pelos liberais abolicionistas brancos ou pelos conservadores que apregoavam a perpetuação da escravidão nos EUA, concluiu que ambas as vertentes estavam ancoradas na pretensa supremacia branca, só diferiam na forma de alcançá-la – ou com uma atitude de segregação declarada ou de um paternalismo moderador. Com isso, em seu texto de 1977, ela apontou também para a necessidade crucial de estudar o comportamento dos brancos, uma espécie de antropologia reversa, já que a antropologia tem como objetivo estudar os “outros.” A Dra. Ifi Amadiume vai propor que seja abolida essa disciplina de antropologia, ao invés disso deveria se consolidar uma disciplina da história social africana. Mas, neste livro, foi a Dra. Marimba Ani quem contribuiu com um estudo avassalador sobre a concepção branca de sua autoimagem e da imagem dos “Outros.” Nesse estudo, publicado em 1994, a Dra. Marimba Ani vai desvelar que a essência cultural do Ocidente é de destruição, uma completa desarmonia com o mundo. Sendo assim, seu ethos e seu pensamento, seu comportamento e sua imagem, estarão relacionados consistentemente uns com os outros, ou seja, agem em compatibilidade para forjar um constructo ideológico particular e concernente da cultura europeia (brancos). Em linhas gerais, a autoimagem europeia necessita da inferiorização da imagem dos “outros,” no intuito de consolidar a supremacia branca. A irmã diz: “Nenhuma etnologia da cultura europeia pode, com honestidade, ignorar o significado da cor na mente dos europeus.” E não será agora que poderá ser ignorado. Portanto, nesse sentido, a antropologia e o cristianismo, por exemplo, seriam o sustentáculo da supremacia branca.

Na área da educação teremos a entrevista da saudosa ativista africana-americana Queen Mother Moore - reforçando a oralidade africana como metodologia de estudo – trazendo aspectos da busca pela educação na américa racista e segregada numa base vivida e empírica, fortalecendo a compreensão do estudo trazido pela Iva Carruthers e vice-versa. Abarcando a Guerra Civil americana, o período de reconstrução, restauração, Jim Crow, a luta pelos direitos civis, etc. Ainda, para esse período, o estudo do Professor Mestre Fábio Mandigo traz para o contexto dos pretos no Brasil a disposição de um quadro de análise em três paradigmas pretos em conflito, de três movimentos africano-americanos na condução de Booker T. Washington, Du Bois e Marcus Garvey.

A educação em qualquer lugar está a serviço das instituições de um determinado Estado-nação, agora se tal nação detém um passado escravista e colonialista sem que se tenha tido nenhum tipo de revolução preta, inferimos que esse sistema educacional é racista. Portanto, uma educação no Brasil e tão racista quanto nos EUA, mesmo que resguardada as devidas particularidades.

Robert Sobubwe em seu discurso no Colégio Fort Hare enfatizou diretamente o sentido da educação africana: “Você já viu o que a educação significa para nós: a identificação de nós mesmos com as massas. Educação para nós significa serviço à África. Em qualquer ramo de aprendizagem que você esteja, você está lá para a África. Você tem uma missão; todos nós temos uma missão. Temos uma nação para construir.” Em acréscimo, uma citação do Dr. Clarke diz: “O papel da educação é treinar o aluno para ser um manuseador responsável do poder”.

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Desse modo, para que um povo de passado colonial tenha um destino apropriado com seus interesses (agência), as epistemologias pretas devem estar a serviço da descolonização mental, - uma das etapas iniciais. O ancestral Malcolm X sabendo dessa problemática questionou os motivos de a conquista da liberdade para o povo preto sempre ter sido mais difícil. Como povo, carecemos da libertação da mente, isso influi nos programas e métodos em que lutamos, quase nunca de longo prazo e nem cristalizados em uma ideologia própria. Em seu discurso, o irmão Malcolm continua: “temos ainda de aprender as táticas, estratégias ou métodos adequados para trazer a liberdade à existência... Portanto, o que gostaríamos de fazer nas noites de domingo é entrar em nosso problema e apenas analisar e analisar e analisar; e questionar coisas que vocês não entendem, para que possamos, pelo menos, tentar obter uma visão mais nítida do que vamos enfrentar.”

O ex-presidente da Guiné, Sékou Touré, em um trecho de sua dialética da cultura, complementa essa lógica, para ele o povo africano precisa se “comprometer a reconquistar sua própria personalidade, negando os valores culturais que o despersonalizaram, descolonizando sua própria mente, seus costumes e suas atitudes, desmontando os sistemas filosóficos que justificam as dominações...” E continua, [a] “...luta pela liquidação dos vários complexos do homem colonizado, não se dissocia da fase seguinte – a da reconquista dos valores perdidos, dos bens negados e perdidos, atributos de um homem sensível que pensa e age de forma digna e ciente de suas potencialidades.”

Para Sékou Touré a cultura se vale como arma de libertação, e a define como sendo: “...todas as obras materiais e imateriais de arte e ciência, mais conhecimento, boas maneiras, educação, um modo de pensamento, comportamento e atitudes acumuladas pelo povo tanto através como em virtude de sua luta pela liberdade da posse e do domínio da natureza; ... Assim, a cultura é revelada como uma criação exclusiva do povo e uma fonte de criação, como um instrumento de libertação socioeconômica e de dominação.” Uma abordagem dialética da cultura é um texto muito importante no sentido de não abordar a cultura por um culturalismo esvaziado, ou seja, em negação do materialismo histórico e dialético.6

Sékou Touré vai discorrer, em suma, sobre a relação da busca material e que para se fazer tal busca é necessário um conjunto de ideias. Ou seja, mesmo obtendo a primazia do bem-estar material para então se obter o desenvolvimento intelectual, este último se faz necessário na busca das necessidades físicas. “O curso da história e a sucessão do desenvolvimento da cultura Africana refletiram de perto o curso do desenvolvimento das forças produtivas.” Sendo que, as emoções e mesmo os reflexos em um dado momento histórico são fundamentalmente postos em movimento pela razão, a fim de alcançar objetivos bem definidos.

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Irmãs e irmãos, procurei apresentar alguns tópicos dentre tantos existentes, espero que possamos perceber como está implícito um modo africano de lidar com os campos científicos, ou seja, a busca de pesquisas e análises interconectadas e interdisciplinares, 7 não como caixinhas extremamente fragmentadas. Por fim, o foco da questão inicial pode mais uma vez ser visto em mais essa citação do Dr. Clarke: “No novo interesse no Pan-Africanismo que está ganhando força em todo o mundo Africano, a intenção dos Africanos não é apenas mudar sua definição na história do mundo, mas também mudar sua direção. A esperança deles é que o Pan-Africanismo se espalhe para além de sua estreita base intelectual para se tornar a motivação para uma União Mundial Africana. Isso começará quando reconhecermos que não somos ‘de cor’, ‘negros’ ou ‘pretos’. Somos um povo Africano onde quer que estejamos na face da terra.”

Desejo-lhes boa leitura! Um forte Abraço! Axé!

Notas:

1. Sobre esse conceito, ver David Harvey, “Crise na economia espacial do capitalismo: a dialética do imperialismo”, em Os limites do capital. São Paulo: Boitempo, 2013 (pp. 599-641, edição e-book), conceito adaptado a partir do ‘desenvolvimento desigual e combinado’ de Leon Trotsky... mas vale e deve lembrar que os nossos próprios pensadores pretos vão desenvolver aqui mesmo nesse livro as relações de enriquecimento da Europa e seus satélites sobre a pilhagem e subdesenvolvimento do continente africano e dos povos indígenas, através do roubo da força de trabalho, dos bens naturais/minerais e da terra desses povos. Contudo, falar sobre o desenvolvimento geográfico desigual é se opor ao dito determinismo geográfico, em outras palavras, ao invés do determinismo se existe condições que foram determinadas, ainda que existam as diferenças (de espaço, humanas e sociais) as desigualdades foram e são produzidas por um dado sistema. Ver também Walter Rodney, Como a Europa subdesenvolveu a África. Lisboa: Seara Nova, 1975.

2. Como aponta nossa ancestral, quilombola e intelectual Beatriz Nascimento: “No final do século XIX, o quilombo recebe o significado de instrumento ideológico contra as formas de opressão. Sua mística alimentar o sonho de liberdade de milhares de africanos e seus descendentes escravizados (p. 289) ... A retórica do quilombo, a análise deste como sistema alternativo, serviu de símbolo principal para a trajetória deste movimento. Chamamos isso de correção da nacionalidade: a ausência de cidadania plena e de canais reivindicatórios eficazes, a fragilidade de uma consciência brasileira de povo, todos esses fatores implicaram numa rejeição do que era então considerado nacional e dirigiu esse movimento para a identificação da historicidade heroica do passado.” (p.291). Ver Beatriz Nascimento – Quilombola e Intelectual: Possibilidade nos dias da destruição. Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2018.

3. Em O Pan-Africanismo: apontamentos e reflexões, de Abiogun látúnjí Odùduwà, é revelado que, “O conceito de renascença africana ou renascimento africano foi proposto e elaborado por Cheikh Anta Diop em uma série de ensaios produzidos a partir de 1946 e, posteriormente, organizados em uma obra única com o título Towards the African Renaissance: Essays in Culture and Development, 1946-1960. Londres: Espólio Cheikh Anta Diop; Karnak House; 1996... O renascimento africano, para Cheikh Anta Diop, seria uma série de ações políticas, culturais, intelectuais, econômicas e militares que tinham como objetivo o fortalecimento das pessoas pretas e do continente africano, assim como a construção dos Estados Unidos da África, nas estruturas do pan-africanismo” (Editora Filhos da África, 2019, pág. 11). Ver também Cheikh Anta Diop, “Quando podemos falar de um renascimento africano?”, em Coleção Pensamento Preto: Epistemologias do renascimento africano, volume IV. Diáspora africana: Editora Filhos da África, 2020 (pp. 128-138).

4. Ver: ODÙDUWÀ, Abisogun Olatunji. Às Irmãs: Mulheres africanas na revolução preta mundial. Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2019. "Como revolução preta mundial entendemos todas as movimentações realizadas por seres humanos pretos, de ambos os gêneros e de todas as orientações sexuais, em suas buscas por dignidade humana, liberdade, direito à educação, resgate e manutenção da cultura, organização social, luta política e armada, vivência plena, defesa de suas terras, etc., nos últimos cinco séculos. (pp. 27-28)”

5. JONES, Del. The Black Holocaust: Global Genocide. Philadelphia: Hikeka Press, 1992. Livro contundente, combativo e importante na busca e na forma de lidar e revelar os aspectos do Holocausto dos Pretos. Imbuído do Pan-Afrikanismo, o correspondente de guerra não dá margem pra supremacia branca. Escravidão e colonização representam o genocídio; Leopold, Stanley, Rhodes, Kaiser – Genocidas; Aparato militar do imperialismo, suposta Guerra às Drogas e outras armas de destruição em massa – Genocídio Global de pretos. Agora, veja o que aponta Du bois em “África- seu lugar na história moderna,” e perceba se não foi um holocausto: “Provavelmente cada escravo importado representou em média cinco cadáveres na África ou em alto-mar; o comércio de escravos americano, portanto, significou a eliminação de pelo menos 60 milhões de pretos de sua pátria. O comércio de escravos maometano significava a expatriação ou migração forçada na África de quase tantos. Seria até conservador, então, dizer que o comércio de escravos custou à África Preta 100.000.000 de almas. E ainda assim as pessoas perguntam hoje a causa da estagnação da cultura africana desde 1600!”

6. Para complemento sobre o método. Ver: ODÙDUWÀ, Abisogun Olatunji. “Dialética da Revolução Africana” em O Levante dos nossos filhos: uma contribuição à revolução pan-africana. Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2020. (pág. 346-443) Após refutar que o método dialético seja produto do ocidente, Abisogun postula que: “A dialética que vamos apresentar aqui consiste no enfrentamento entre brancos e pretos, representado pela supremacia branca e seu projeto civilizatório de um lado (na condição de tese) e a resistência africana, por meio do pan-africanismo e construção do renascimento africano, de outro (na condição de antítese); gerando com essa movimentação conflituosa uma síntese, a ser interpretada e definida apenas no porvir (pág. 359).”

7. Para ‘Notas de uma pedagogia e de um currículo africano-centrado’, com seu domínio holístico através de um inventário temático africano-centrado: I. Espiritualidade e o Psicoafetivo; II. Cultural e Ideológico; III. Sociopolítico e Econômico; Ver Kwame Agyei Akoto. Nationbuilding: Theory and Practice in Afrikan Centered Education. Pan Afrikan World Institute, 1992. Agyei Akoto traz sua experiência de 20 anos na NationHouse, uma organização baseada na comunidade e Afrikano-centrada, fundada no início dos anos setenta com raízes no movimento estudantil ativista do final dos anos sessenta na Universidade Howard. A organização opera uma escola independente, um consultório médico, um acampamento de verão Afrikano-centrado, um programa para jovens depois da escola, e organizou uma cooperativa de desenvolvimento de terras.


sábado, 25 de janeiro de 2025

Discurso do Capitão Ibrahim Traoré em Gana (Janeiro 2025)

O presidente de transição de Burkina Faso, Capitão Ibrahim Traoré, virou manchete após receber a "maior ovação" entre os presidentes africanos visitantes durante a posse do Presidente John Mahama de Gana no último dia 7, terça-feira, janeiro de 2025.

Discurso do Capitão Ibrahim Traoré em Gana (Janeiro 2025)

Gostaria de desejar a vocês um feliz ano novo. Que Deus lhes conceda uma vida saudável. Que Deus permita que todos os seus negócios sejam bem-sucedidos. Que vocês sejam prósperos. Que haja união e amor em suas respeitadas famílias e entre vocês. Que Deus os proteja durante todo este ano de 2025 e os ajude a realizar sonhos.

Gostaria também de prestar homenagem às nossas valentes forças de combate, que lutam com seus corpos e almas - como vocês podem ver - para que nosso Burkina Faso permaneça de pé. É um trabalho nobre. Os homens são essenciais, toda vez que vão para a batalha, eles sabem que alguns ficarão, mas o dever os chama, esse é o trabalho do exército.

Presidente Ibrahim Traoré 

Muitas vezes somos nostálgicos, mas aqueles que têm a chance hoje de defender Burkina Faso devemos encorajá-los e aplaudi-los, quando eles me deixarem, não chorarei por eles, mas vamos nos compadecer deles em nosso destino. Se chorarmos por eles, devemos vingá-los.

Preste homenagem a eles o máximo que puder, porque isso não permite que ninguém saia de casa e enfrente o perigo, sabendo que pode não retornar à noite. Mas é isso que eles fazem todos os dias, eles juraram defender nossa querida pátria, até o sacrifício final nas forças de combate para manter sua palavra.

Hoje, mais do que nunca, nossas forças armadas vão aonde querem. No momento em que estou falando com vocês, há várias operações por meio de vários grupos. E estamos infligindo perdas colossais ao inimigo e gradualmente os empurrando para fora de Burkina Faso. Venceremos a batalha, esta guerra, e superaremos o imperialismo, que ativou o terrorismo em nossa região para nos colocar de volta aos tempos coloniais, para nos manter sob seu controle e nos explorar até o fim dos tempos.

A África está acordando e ninguém poderá fechar os olhos dos africanos sobre nossas realidades. Ninguém poderá chegar e nos dividir, nem impor o que quiserem sobre nós. Fizemos o máximo para estar aqui hoje para falar com vocês. Mas também para vir e desejar ao presidente John Mahama uma boa transição. Desejamos a ele uma boa transição porque há muitos desafios que o aguardam e espero que vocês possam acompanhar seus irmãos aqui.

O pan-africanismo é uma batalha bastante complexa, mas para vocês, o povo, é muito fácil liderar bem esse pan-africanismo porque os povos devem amar uns aos outros, os povos devem apoiar uns aos outros.

O problema do pan-africanismo está muito frequentemente entre nós, os líderes. Mas colocaremos tudo isso em prática para que os líderes possam seguir na direção de seu povo. Porque o povo já está integrado, ele é pan-africano.

Se hoje Gana decidiu ter o presidente John Mahama à frente do país, é uma mensagem forte. E eu desejo que vocês, burkinabês que vivem em Gana, possam acompanhar o presidente John Mahama.

A tarefa será difícil, certamente haverá desafios no nível de segurança e no nível econômico, desejo que vocês possam acompanhar as forças de defesa e segurança em Gana o máximo que puder. Tanto no nível de inteligência quanto no nível econômico, como se estivessem apoiando as forças armadas burquinenses.

Estou lhe dizendo algo: os desafios podem ser muito numerosos, mas em nenhum caso vocês devem perder a esperança, vocês devem acompanhá-los e ajudá-los em todos os níveis. A nação não sobrevive enquanto não tiver um exército forte. É por isso que eu reitero a vocês novamente para apoiar as forças de defesa e segurança em Gana. Eles são os únicos que podem ajudar o país a subir na escala econômica e a prosperar.

Então peço-lhes que amem as pessoas daqui para que vivam em perfeita simbiose, em perfeita harmonia, como vocês já estão fazendo muito bem. Como eu disse, os povos já estão integrados, o problema está no nível dos líderes. Continuem nessa direção, apoiem seus irmãos em Gana, o máximo que puderem e, acima de tudo, mostrem essa integridade. Um país de homens íntegros, vocês devem ser modelos.

O Burkinense não deve criar um problema, o Burkinense deve ser uma solução. Vocês sempre souberam se comportar bem por meio de todos os seus líderes aqui presentes e eu desejo que essa dinâmica continue e que vocês possam acompanhar o novo presidente em sua enorme tarefa de reavivar a economia do país e, acima de tudo, defender este país.

Trabalharemos juntos para fortalecer a cooperação entre Burkina e Gana e também entre a AES [Aliança dos Estados do Sahel] e Gana porque temos muitos desafios juntos e sempre fomos capazes de superá-los. A chegada do novo presidente deve ser um momento para aquecermos essas relações e levá-las ao mais alto nível. Nos próximos dias, poderemos ver o que pode ser feito em benefício dos burkinenses.

Tanto internamente quanto aqui, as preocupações levantadas pelo representante são preocupações atuais e acho que o Ministério das Relações Exteriores está trabalhando para conseguir reorganizar a diáspora para que possamos resolver esses problemas o mais facilmente possível. É por isso que os conselhos foram estabelecidos. E os documentos administrativos e outros documentos que vocês precisam para expressar sua nacionalidade estão sendo modernizados, se você acompanhou as notícias.

Costumávamos ter documentos, mas não eram seguros o suficiente. Hoje, estamos em uma dinâmica de proteger todos os documentos de identidade no país. Mas também no espaço nos EUA e harmonizá-los. É por isso que demora um pouco, mas em janeiro normalmente deve ocorrer uma reunião com especialistas para esclarecer essa questão dos documentos de identidade. E esperamos que até lá vocês consigam ter sua nacionalidade como deveria ser: Burkina Faso.

Burkina Faso está comprometido com um caminho que vocês conhecem, um caminho difícil talvez, cheio de obstáculos. Mas tenha certeza de que vocês nunca devem perder a esperança. Vocês nunca devem ter medo. Vocês nunca devem duvidar nem por um momento. De onde vocês estão, ouvimos seu apoio, sentimos isso. E toda a população local sente o apoio da diáspora. E estamos felizes em poder continuar nessa direção para motivar seus irmãos internos e que possamos juntos restaurar Burkina Faso.

Temos um sonho e esse sonho será uma realidade em um futuro muito próximo. O terrorismo acabará, desenvolveremos nosso país. Desenvolveremos nossas indústrias e tornaremos mais fácil para vocês, investidores, virem e investirem no país em condições seguras. E nas facilidades econômicas que vocês desejam.

Não esquecemos disso durante a última fase do fórum da diáspora, portanto, estamos tentando ver tudo o que pode ser reunido para permitir que vocês venham e invistam facilmente para o benefício de seus irmãos. Porque somos um país importador e continuamos dizendo isso hoje, a dinâmica é ser capaz de transformar nossa sociedade. Vocês têm a chance de estar em Gana, Gana é um país genial e acho que muita tecnologia pode ser transferida daqui para o país.

Então estamos esperando por vocês, assim como nós, que estamos desenvolvendo para inserir os jovens de volta à produção, especialmente à produção agrícola, e à transformação (processamento), porque não podemos imaginar que neste século XXI continuaremos a importar quase todos os nossos alimentos do exterior, enquanto temos um enorme potencial de terra.

Este ano vivenciamos a parcela que foi garantida. Estamos satisfeitos com os resultados. Isso significa que no ano que vem, se Deus quiser, continuaremos a dar nosso apoio ao mundo camponês, mas especialmente aos jovens empreendedores agrícolas que querem entrar na produção e incentivar essas indústrias de transformação.

Burkina Faso brilhará. Burkina Faso será grande, nosso sonho se tornará realidade se Deus quiser.

E eu os encorajo a permanecerem unidos, unidos entre si e unidos com aqueles que os acolheram aqui. Estejam unidos com seus irmãos africanos. Estamos reativando o instituto dos povos pretos porque a África tem a mesma história, somos tratados da mesma forma pelos imperialistas. Não há razão para não estarmos unidos e bloquearmos o imperialismo. Fiquem unidos, fiquem unidos e mostrem que vocês são Burkina Faso onde quer que estejam.

Muito obrigado!

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=mNkK2xQRSQU

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Consciência Afrikano-Centrada versus Nova Ordem Mundial – Breve Nota

Que livro necessário! A princípio, o título dele parece impressionar, sobretudo pelas expressões Nova Ordem Mundial e Globalismo. Não chega a ser algum tipo de chamada capciosa, mas algo que visa lidar com uma época dos nacionalismos, essa época pode ser datada a partir de 1989? Talvez.

Compreendi que uma das grandes mensagens do Amos Wilson é provar que toda consciência e personalidade pretas desajustadas têm reverberações econômicas em um indivíduo e em seu povo, por extensão. E isso é algo proposital, pois tal desajustamento foi e é promovido pela supremacia branca, a fim de manter o seu domínio cultural, político e econômico sobre os pretos-africanos.

Esta edição é bem completa e não deixa a leitora ou o leitor sem um bom contexto da obra, seja se tratando de Marcus Garvey, de Amos Wilson ou da ideia e elaboração da própria edição em português; desde a Apresentação e Visão Histórica de Garvey até as Duas Partes e os Documentos em Anexo.

Sobre o objetivo deste trabalho na apresentação se diz:
“A ideia é, no mínimo, difundirmos, por todos os meios, conteúdo em forma de palestras, materiais em forma de livros, artigos acadêmicos e outros documentos dispersos... Nosso projeto se intere nesse esforço: Amos Wilson, o próprio Marcus Garvey devem ser redescobertos e reconsiderados, sobretudo para fins de atualizarmos nossa filosofia e ideologia.” (pág.95)
Parte 1- Legado de Marcus Garvey

Amos Wilson vai trabalhar o legado de Garvey ao tratar da psicologia do auto-ódio e como essa psicologia foi inculcada na personalidade oprimida do ser Afrikano. Sendo assim, uma das principais características do legado de Garvey se dá pela sua Percepção da Realidade, a própria essência do fracasso e do desenvolvimento de patologias na pessoa Afrikana seria o não reconhecimento da realidade. Então, para avançar e construir tudo que construiu, Garvey obteve e também promoveu a percepção da realidade.

Tal percepção vêm acompanhada do autoconhecimento. Se existe uma amnésia de quem se é, consequentemente, isso pode propiciar o surgimento de um estado mental patológico. Ou seja, “um povo que sofre de falta de conhecimento de si e de sua história, uma falta de conhecimento de sua criação, é um povo que sofre de perda de identidade.”

Desse modo, não se pode ser um pessoa Afrikana e consciente de sua personalidade ‘positiva’ e ser uma pessoa escravizada ao mesmo tempo. Não é possível desenvolver a cultura Afrikana e se identificar com ela, e ser escravizado e subordinado a outro povo. Ou ainda,
“A falta de autoconsciência é uma insensibilidade a si mesmo. Mas uma insensibilidade a si mesmo, também é um a insensibilidade à realidade e ao mundo exterior. Sem a sensibilidade do mundo exterior e de si mesmo, nós somos dados a tropeçar cegamente de um ponto a outro.” (pág.114)
Portanto, Conheça a Ti Mesmo para estar ciente da realidade concreta do mundo, sob sua ótica. Pois, seu destino será determinado por forças externas (e que atuam internamente também) quando se tem uma fuga e uma falta do autoconhecimento. Porém, o legado de Garvey prega que devemos controlar o nosso destino e para isso, devemos controlar o nosso comportamento por nossa própria vontade. Desse modo, Amos Wilson vê em Garvey,
“o derradeiro psicoterapeuta, alguém que é revelador, e que revela os controles inconscientes, os controles que foram implantados fora de nossa consciência por nossos inimigos e opressores. No entanto, apesar desses controles estarem fora de nossa consciência, eles estavam manipulando nosso comportamento para nossa desvantagem. Ao trazer essas forças inconscientes à consciência; ele possibilitou que estas forças estivessem sob nosso controle, governos, lógica, racionalidade, e sob o controle da ideologia do nacionalismo. Este é o legado que ainda vive hoje.” (pág.145)
Adiante, é extremamente importante o apontamento que Amos Wilson faz sobre a negação de si mesmo, ele postula que tal negação pode estar inculcada também em pessoas pretas conscientes. Isso acontece porque não se aprofundou de fato tal consciência de sua própria personalidade e cultura Afrikana, ou seja, quando se detém uma consciência preta superficial ainda se esperará por parte dos inimigos uma aceitação! Essa pessoa ainda tem esperança de que o inimigo vai mudar, essa é a visão do integracionista, seja liderança ou não, que para amar a si mesmo e ao seu povo, deve-se, antes, conseguir a aceitação do branco.

Garvey amou o povo preto e provou que o amor é a base da coesão e da unidade de propósito de qualquer povo. “Se dependermos de nosso inimigo nos amar antes de nos amarmos, nunca iremos nos amar.”

Amos Wilson vai confrontar a liderança integracionista e assimilacionista, que oferece o alivio para um problema profundamente arraigado, uma liderança que visa promover um dito progresso diante do status quo. A educação para o autor é uma que confronte e que, em grande medida, incomode, pois o propósito de transformação exige um grande incomodo, o enfrentamento da realidade tal como ela é.

Desse modo, a realidade do povo preto exige uma ruptura com o mundo branco, não curá-lo, convertê-lo ou até mesmo fazer parte dele. Tudo se resume na construção da nação preta, uma transformação completa não para fazer parte da pilhagem e do roubo que os brancos promoveram, mas para criar uma nova ordem mundial. Amos Wilson exorta ao povo preto que se aproxime de Garvey, o verdadeiro nacionalista!
“O verdadeiro nacionalista não escapa e esconde através da glorificação do passado o que deve ser feito no presente e no futuro. O nacionalista falso, no entanto, levanta e eleva o povo, constrói um falso orgulho no povo em termos da história passada, mas ele os deixa tateando sobre o que deve ser feito agora. Ele os deixa sem sentido imponentes quando saem dos salões, auditórios e igrejas, com seu oratório tocando nos ouvidos – só para encarar as lojas coreanas quando saem, e encarar suas comunidades dominadas por árabes, por hispânicos e outros grupos. E com esse zunido oratório e retórica, eles devem encarar a realidade de que, embora o conhecimento da história seja maravilhoso, grandioso, e uma parte necessária de nossa ressureição como povo, não será nossa única base de salvação. Além de nos preocuparmos com o nosso passado, nós devemos nos preocupar com o agora e usá-lo, agora, para criar o futuro. (...) (p.160).

“O verdadeiro nacionalista é empreendedor: ele está edificando algo; ele está construindo algo. Nós vemos isso em Garvey; não apenas uma preocupação com o passado, não apenas uma identificação com o Egito e outros grandes impérios Afrikanos do passado, não apenas capturando pequenos detalhes em cima de pequenos detalhes de algum passado Afrikano, mas também um movimento sólido na construção, com concreto, tijolo e argamassa; um sólido desenvolvimento prático e atualização da ideologia Afrikana e do desenvolvimento político. (...)

“Ele não apenas respeita sua herança étnica e as glórias de seus antepassados, mas também se preocupa, se não mais, com a herança que ele passará para seus filhos, com o legado que ele dará a seus filhos. (...) (p.161)

“Um verdadeiro nacionalista não tem medo de delegar poder. Temos muitas pessoas que entram no nacionalismo levando consigo seus problemas egoístas. Muitas pessoas pensam que, porque uma pessoa defende uma ideologia nacionalista, ela superou o egoísmo, a ganancia, o egocentrismo, a mesquinharia, a ignorância e o medo. Dificilmentemente, senhoras e senhores, não é provável! Essas coisas ainda precisam crescer e se desenvolver. (...) (p.166)

“Por fim, se nós quisermos controlar nosso destino, como Marcus Garvey indicou, nós devemos nos autogovernar. Um nacionalismo que não fala em autogoverno, não fala em construção da nação, não constrói uma rede nacional, não constrói um sistema econômico, social, e político nacional, é um nacionalismo falso, Irmãos e Irmãs! ... Não se deixe enganar pelas palavras: devemos olhar para as obras!” (p.166)
Parte 2: Consciência Afrikano-centrada, Personalidade e Cultura como Instrumentos de Poder.

Nesta parte Amos Wilson continua tratando de forma mais detalhada a consciência, mas agora inserindo a relação do Poder com a personalidade e a cultura; essa relação mostra que a natureza da consciência de uma pessoa transforma de forma física como o cérebro opera. Então, quando se fala de consciência, ao estudar cultura e personalidade, se refere também a algo material e real, que age tanto na psique quanto no corpo.

Em um exemplo crucial, Amos Wilson revela que não se deve negar a escravidão dos pretos como se fosse algo que não existiu, como alguns conservadores afirmariam, mas que deve enfrentar os efeitos diretos e indiretos de tal holocausto para justamente poder negar os comportamentos implantados na pessoa africana durante a escravidão, pois esses comportamentos são fontes de diversas possessões, que o autor passa a elencar e caracterizar cada uma no texto.

Com isso, é importante notar os fatores econômicos que o autor enfatizou, que faz parte dessa base material e real oriunda de uma história, cultura, consciência, personalidade, etc. O pretos precisam controlar seus negócios, sua própria terra, os pretos precisam ser geradores de empregos, ou seja, o povo preto precisa pensar em questão de nacionalidade, na construção da nação preta. Assim, Amos Wilson diz que,
“Nós devemos, então, como povo, desenvolver uma nova consciência Afrikana – uma consciência centrada no Afrikano – e isso significa que a desenvolvemos com base em uma história Afrikana, cultura e valores Afrikanos. Acima de tudo, nós devemos desenvolver um senso de nacionalidade Afrikana.” (pág. 203)
E define cultura dessa forma:
“Cultura habita em nós e habita nossos corpos. Nossa história habita em nós e habita nossos corpos... Cultura... é um meio pelo qual um grupo de pessoas organiza a maneira como pensa, organiza a maneira como acredita, organiza a maneira como vê o mundo, de modo a criar uma consciência pela qual elas podem cooperar para alcançar certos fins, de modo que possam ajudar mutuamente um ao outro e obter fins que não podem obter como indivíduos separados. Assim, cultura é um instrumento de poder” (pág.196)
Ou seja, se os valores (que são fatores que direcionam a cultura) detém poder, se cultura é poder, se consciência é poder, então quem determina essas questões sobre um povo detém o poder sobre ele. E isso reverbera obviamente nas questões econômicas e em todos os aspectos de uma nação. Daí Amos Wilson retrata tanto as Nações Afrikanas como a Afrikana-Americana como portadora da relação de monocultura e como isso é impertinente para a consolidação do Poder Afrikano, enquanto tiver que vender mais barato (commodities ou força de trabalho) e pagar mais caro de volta (em produtos e tecnologias, por exemplo); e neste contexto aponta como não existe livre mercado que beneficie os negócios pretos (Wilson:2020, pág. 208). Por fim, ao terminar essa parte do livro, o autor prescreve ações numa perspectiva nacionalista preta para a Nação Afrikana Americana.

Então, em suma, levando (aqui) em consideração que o globalismo seria uma movimentação política e a globalização uma movimentação econômica ambos agindo em prol de um universalismo hegemônico, o povo preto ainda deve pensar e agir com o propósito da construção da nação, Nacionalismo Preto.

Enfim, um livro extremamente importante para pensarmos nossas questões em outra parte da diáspora africana, aqui no Brasil. Visões necessárias para que possamos erigir a nação preta! O processo está em andamento...

Fuca, 2021.

Livro: Amos Wilson. Consciência Afrikano-Centrada versus Nova Ordem Mundial: Garveyismo na Era do Globalismo. Editora Poder Afrikano, 2020.




quarta-feira, 21 de julho de 2021

Trechos do livro: Quando a África Despertar – Hubert Harrison

Este livro, apesar de pequeno, abrange muitos assuntos de uma perspectiva radical, comprometida e com os pés no barro, pois aborda temas como a primeira guerra europeia da perspectiva racial tanto quanto fala sobre as contradições do movimento ‘compre preto’; desmascara o movimento organizado dos trabalhadores brancos e também incentiva a valorização da mulher preta e do jovem preto; trata sobre nosso elo imperecível com a África tanto quanto não deixa de salientar que temos problemas a tratar aqui; resolve a questão cunhada em nosso tempo como ‘colorismo’ e também critica as velhas lideranças pretas; defende a política preta de Raça Primeiro e nos mostra que o mundo não-branco age sempre a partir da raça; advoga a rebelião preta para cessar com a invasão estadunidense no Haiti e também faz resenhas de livros, entre tantos outros assuntos de seu tempo e além. (pág.30)

(...)

No plano pessoal, Hubert Harrison deixou sua esposa irene e seus cinco filhos para trás. No campo político, Harrison deixou um escopo bem definido para a nova movimentação preta. Como legado à posterioridade, deixou as ferramentas de luta política preta utilizada por um amplo espectro de lutadores pretos, desde o movimentos pelos direitos civis radicais e moderados até Malcolm X e sua notável utilização das ruas do Harlem como púlpito. Ao movimento Pan-Africanista Nacionalista, deixou bem fundamentado o conceito Raça Primeiro, da autodeterminação preta, da cooperação entre povos de cor do mundo, da excelência cultural e intelectual preta e da autodefesa armada preta. (P.34)

(Prefácio: Ammit Garvey em Quando a África Despertar- Hubert Harrison, Editora Filhos da África, 2020) 

***

(...)

Uma cura para a Ku-Klux.

Foi na cidade de Pulaski, no condado de Giles, Tennessee, que a Ku-Klux Klan original foi organizada na última parte de 1865. A guerra mal havia sido declarada oficialmente terminada quando os covardes "caipiras", que não podiam vencer os ianques, começaram a se organizar para tirar vantagem dos Negros. Eles aprovaram leis declarando que qualquer homem preto que não pudesse mostrar trezentos dólares deveria ser declarado vagabundo; que todo vagabundo deve ser posto a trabalhar nos serviços públicos de suas cidades; que três Negros não deveriam se reunir a menos que um homem branco estivesse com eles, e outros métodos foram usados conforme necessário para manter a "supremacia branca". Quando o congresso nacional se reuniu em dezembro de 1865, olhou para essas tensões leves com um olhar hostil e, já que nada menos que a re-escravização dos Negros poderia satisfazer os "caipiras", mantiveram eles fora do congresso até que concordassem em fazer algo melhor. Descobrindo que eles eram teimosos, o congresso aprovou a 14ª e 15ª emendas e colocaram os estados “caipiras” sob regime militar até que aceitassem as alterações. O resultado foi que o Negro obteve o voto como proteção contra “as pessoas que o conhecem melhor”.

Enquanto isso, a Ku-Klux, depois do rompante sob a liderança daquele traidor, o general Nathaniel B. Forrest, foi derrubada - nocauteada, como se pensava. Hoje, depois que o Negro foi despojado da proteção do voto pela conivência de republicanos brancos em Washington e democratas brancos no sul, a Ku-Klux ousa levantar sua cabeça feia em seu estado ancestral do Tennessee. Desta vez, eles querem aumentar o excelente tipo de democracia que todos os editores covardes sabem que os Negros estavam recebendo quando lhes era pedido para que fossem patrióticos. A Ku-Klux irá matá-los e submetê-los à tortura e terrores antes que eles mostrem suas feridas e solicitem o voto como recompensa.

Nesta crise, o que os "líderes" Negros têm a dizer em nome do seu povo? Onde está Emmet Scott? Onde estão o Sr. Moton e o Dr. Du Bois? O que a NAACP fará além de escrever cartas frenéticas? Tememos que eles nunca possam ultrapassar o nível da apelação. Mas suponha que o Negro comum do Tennessee decida participar do jogo? Suponha que ele deixe saber que, ao tirar a vida de qualquer soldado ou civil Negro, dois “caipiras” morrerão? Suponha que ele os informe que será tão caro matar Negros quanto é matar pessoas reais? Então, de fato, a Ku-Klux seria enfrentada em seu próprio terreno. E porque não?

Todas as nossas leis, mesmo no Tennessee, declaram que linchamento e racismo são crimes contra a pessoa. Todas as nossas leis declaram que as pessoas individualmente ou em grupos têm o direito de matar em defesa de suas vidas. E se a Ku-Klux impede os oficiais da lei de fazer cumprir essa lei, cabe aos Negros ajudar os oficiais, fazendo cumprir a lei por conta própria. Por que eles não deveriam fazer isso? Chumbo, aço, fogo e veneno são tão potentes contra os “caipiras” quanto aos alemães, e vale lutar pela democracia no Tennessee tanto quanto nas planícies da França. Se os Negros do sul não reconhecerem essa verdade, ninguém mais a reconhecerá por eles. (pp. 77,78,79)

Quando a África Despertar - Hubert H. Harrison

Capítulo III - O Negro e a Guerra.

Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2020. 1ª edição. 215 Páginas.

 [agora em A nova consciência da Raça]

 (...)

Nos bons e velhos tempos, os brancos derivavam seu conhecimento do que os Negros estavam fazendo através daqueles Negros mais próximos deles, geralmente seus próprios expoentes selecionados da atividade dos Negros ou do seu ponto de vista branco. Uma ilustração clássica desse tipo de conhecimento foi fornecida pelo Partido Republicano; mas a Igreja Episcopal, a Liga Urbana ou o Governo dos EUA também serviriam. Hoje o mundo branco é vagamente, mas inquietantemente, ciente de que os Negros estão acordados, diferentes e desconcertantemente incertos. No entanto, o mundo branco pelo qual estão cercados mantém seu método tradicional de interpretar a massa pelo Negro mais próximo de si em afiliação ou contrato. O partido socialista insiste em pensar que a “inquietação” agora aparente nas massas Negras se deve à propaganda que seus adeptos apoiam e acredita que essa revolta funcionará em grande parte nos moldes do pensamento político socialista. Os grandes jornais, preocupados principalmente com a tarefa escolhida de serem os mensageiros mentais da multidão, gritam “propaganda bolchevista” e se lisonjeiam por terem encontrado a verdadeira causa; enquanto os agentes não confiáveis do governo a encaram como “deslealdade”. A verdade, como sempre, pode ser encontrada nas profundezas; mas aí estão todos impedidos de passar pela preguiça mental, pelo desprezo tradicional e fraqueza com que homens brancos na América, de estudiosos como Lester Ward a palpiteiros como Stevenson, decidem considerar uma população de cor de doze milhões.

Em primeiro lugar, a causa do “radicalismo” entre os Negros americanos é internacional. Mas é necessário estabelecer distinções claras desde o início. A função da igreja cristã é internacional. Assim como a arte, a guerra, a família, a alienação e a exploração do trabalho. Mas nada disso possui o direito especial de ampliar o manto de seu próprio “internacionalismo” peculiar para cobrir o caso atual do descontentamento dos Negros – embora isso tenha sido constantemente tentado. O fato internacional ao qual os Negros na América estão reagindo agora não é a exploração de trabalhadores pelos capitalistas; mas a sujeição social, política e econômica dos povos de cor pelos brancos. Não é a linha de classe, mas a Linha de Cor, que é a expressão incorreta, embora aceita, a Linha Pétrea da inferioridade racial. Esse fato é um fato na consciência dos Negros e também nas dos outros. A Linha de Cor Internacional é ambos, a prática e a teoria, dessa doutrina que sustenta que os melhores quadros da África, China, Egito e Índias Ocidentais são inferiores aos piores quadros da Bélgica, Inglaterra e Itália e devem manter suas vidas, terras e liberdades sob os termos e condições que a raça branca decidir conceder.

Hubert Harrison - Quando a África Despertar.

Capítulo VI.

 [mais sobre Raça Primeiro]

(...)

Agora que seu partido encolheu consideravelmente em apoio popular e apreço popular, eles estão dispostos a defender nossa causa. (...) Enquanto eles estavam se recusando a diagnosticar nosso caso, nós mesmo o diagnosticamos e, agora que prescrevemos a cura – Solidariedade Racial – eles vêm até nós com sua prescrição – solidariedade de classe. É tarde demais, senhores! ... E se você é simplório o bastante para acreditar que aqueles, dentre nós, que atendem aos seus interesses à frente dos nossos, têm algum monopólio do intelecto ou da informação ao longo das linhas da aprendizagem moderna, então vocês são, realmente, monumentais idiotas. (...) Falamos Raça Primeiro, porque vocês insistiram o tempo todo em Raça Primeiro e classe depois quando não precisavam de nossa ajuda. ...pp.139-130(...)

Durante a recente guerra mundial [1914-1918], ensinou-se aos Negros da América que, enquanto os brancos falavam em patriotismo, religião, democracia e outros temas, eles permaneciam leais a um conceito acima de todos os outros, e esse era o conceito raça. Mesmo no meio da guerra e nos campos de batalha da França, havia “raça primeiro” entre eles. p.132(...)

Mas vamos nos aproximar de casa. (...) Você encontrará um Harlem Negro Renascido, com empresas e arranjos culturais...

Todas essas coisas são produtos recentes do princípio de “Raça Primeiro.” Entre elas, a maior é a Universal Negro improvement Association (Associação Universal para o progresso do Negro), com seus órgãos associados, a Black Star Line (Linha Estrela Preta) e a Negro Factories Corporation (Corporação de Fábricas do Negro). Nenhum movimento entre os Negros americanos, desde a abolição da escravidão, alcançou essas proporções gigantescas. (p.134)

 (Quando a África Despertar – Hubert Harrison, Editora Filhos da África, 2020.)

  [orientação de busca constante por conhecimento]

Orientamos às massas de nosso povo: Leia! Adquira o hábito de leitura; gaste seu tempo livre não treinando tanto os pés para dançar, como treinando a cabeça para pensar. E, desde o início, trace a linha entre livros de opinião e livros de informação. Sature suas mentes com estes últimos e você formará suas próprias opiniões, que valerão dez vezes mais do que as opiniões das maiores mentes da Terra. Vá para a escola sempre que puder. Se você não puder ir durante o dia, vá à noite. Mas lembre-se sempre de que a melhor faculdade é aquela em sua estante de livros: a melhor educação é aquela em sua mente. (...) e se nós, da raça Negra, pudermos dominar o conhecimento moderno – do tipo que conta – seremos capazes de conquistar, por nós mesmo, os inestimáveis presentes da liberdade e do poder, e seremos capazes de defende-los contra o mundo. Hubert Harrison. P.184.

 



 

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

AGYEI AKOTO - Nacionalismo Afrikano: Teoria e Prática de uma Educação Afrikano-Centrada (pdf)

NACIONALISMO AFRIKANO: 

TEORIA E PRÁTICA DE UMA EDUCAÇÃO AFRIKANO-CENTRADA

KWAME AGYEI AKOTO

O livro traduzido está disponível no link abaixo (arquivo pdf).

https://drive.google.com/file/d/1VcrgZxnAxkO5JT7hYgonFHud5iDZZGMo/view?usp=sharing

Por Fuca, Insurreição Cgpp.

arquivo pdf (aqui)





Apresentação da edição de 1992, por MARIMBA ANI 

As formulações conceituais de Agyei Akoto têm o benefício de seus mais de 20 anos de experiência como Pan-Afrikanista Nacionalista. Como resultado, finalmente temos uma declaração evidente do paradigma Nacionalista Afrikano. Neste trabalho, ele delineia evidentemente o processo e a estratégia de Construção da Nação [Nacionalismo Afrikano] e sua relação inextricável com a educação Afrikano-centrada. 

Numa altura em que o nosso diálogo é determinado pelas definições da academia europeia e pelos meios de comunicação controlados pelos europeus, a perspectiva de Akoto é revigorante e autenticamente enfocada no Povo Afrikano. 

É evidente que ele não está se dirigindo aos não-Afrikanos, nem é prejudicado pela dependência de concepções eurocêntricas. Ele escreve com autoridade e compromisso com o povo Afrikano, livre da ambivalência ideológica que tem atormentado os Afrikanos na diáspora e no continente por muitas décadas. 

Dra. MARIMBA ANI (Dona Richards) 
Autora de Let the Circle Be Unbroken
Professora no departamento de Estudos Pretos e Porto-riquenhos 
Hunter College (Faculdade Hunter)


Trecho do conteúdo.

(...) Alguns anos atrás, nas últimas semanas de setembro de 1989, o professor John H. Clarke transmitiu uma mensagem à Sociedade Ankobia, de Washington, D.C., dizendo que independentemente do que possamos empreender, “se não se trata da construção da nação [Afrikana], então não se trata de nada.” É uma declaração que pode ser tomada literalmente. 

A construção da nação (Nacionalismo Afrikano) é a aplicação consciente e focada dos recursos, energias e conhecimentos coletivos de nosso povo na tarefa de libertação, e de desenvolver o espaço físico e psíquico que identificarmos como nosso. Envolve o desenvolvimento de comportamentos, valores, linguagens, instituições e estruturas físicas que elucidem nossa história e cultura, que possam projetar e concretizar o presente e assegurar a futura identidade e independência da nação. 

A construção da nação (Nacionalismo Afrikano) é a projeção deliberada, intensamente dirigida, focada, e enérgica da cultura nacional e da identidade coletiva. A construção da nação (Nacionalismo Afrikano) é ocasionada pela geração e liberação de enormes quantidades de energia, não muito diferente de uma gravidez e um novo nascimento, ou de uma tempestade de primavera e o novo cultivo que se segue. 

Com qualquer uma das analogias, é fundamental que os termos e condições que ocasionam o surgimento dessa nova realidade sejam claros e inequívocos. Essas condições, termos e linguagem descritiva devem ser definidos pelos criadores dessa nova realidade. Essa nova realidade, para nós, é uma consciência nacional e cultural renovada. 

O surgimento desta nova consciência, esta realidade renovada e Afrikano-centrada, marca o renascimento da personalidade Afrikana e a revitalização da nacionalidade Afrikana. Isso é a construção da nação (Nacionalismo Afrikano). (...)