sexta-feira, 29 de julho de 2016

Trechos do livro "Afrocentricidade: A Teoria da Mudança Social"

Trechos do livro "Afrocentricidade: A Teoria da Mudança Social" - Dr MOLEFI KETE ASANTE

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https://pt.scribd.com/doc/317048911/Molefi-Kete-Asante-Afrocentricidade-A-Teoria-Da-Mudanca-Social


Definição

Afrocentricidade é um modo de pensamento e ação no qual a centralidade dos interesses, valores e perspectivas africanos predominam. Em termos teóricos é a colocação do povo africano no centro de qualquer análise de fenômenos africanos. Assim é possível que qualquer um seja mestre na disciplina de encontrar o lugar dis africanos num dado fenômeno. Em termos de ação e comportamento, é a aceitação/ observância da ideia de que tudo o que de melhor serve a consciência africana se encontra no cerne do comportamento ético. Finalmente, a Afrocentricidade procura consagrar a ideia de que a negritude em si é um tropo de éticas. Assim, ser negro é estar contra todas as formas de opressão, racismo, classismo, homofobia, patriarcalismo, abuso infantil, pedofilia e dominação racial branca.
Vemos, dessa forma, coo a Afrocentricidade é a peça central de regeneração humana. Ela desafia e critica a perpetuação de ideias supremacistas raciais brancos no imaginário do mundo africano, e, por extensão, de todo o mundo. Na medida em que tem sido incorporada nas vidas de milhões de africanos no continente e na diáspora, ela tem-se tornado revolucionária, atacando as muitas falsificações de verdade e atitudes de auto ódio que tem oprimido a grande maioria de nós. (p.3)

(...) Agência significa que toda a ação tem de ser fundamentada em experiências africanas. Como tal, a Afrocentricidade oferece tanto ao teórico como ao praticante canais de análises nítidos e precisos. (p.4)

(...) A prática da Afrocentricidade torna-se um agente transformador, através do qual todas as noções velhas se tornam novas, e produz uma transformação de atitudes, crenças, valores e comportamento na vida das pessoas criando, inter alia, uma perspectiva revolucionária sobre todos os fatos. (p.5)



Libertação da linguagem


Nossa libertação do cativeiro da linguagem racista é a prioridade do intelectual. 'Não pode haver liberdade alguma até que haja liberdade da mente'. A primeira regra para a liberdade da mente é a liberdade da linguagem. Como Lorenzo Turner disse, linguagem é essencialmente o controle do pensamento. Não será possível direcionar nosso futuro sem primeiro controlarmos nossa linguagem. O sentido da linguagem está na precisão de vocabulário e na estrutura em um contexto social particular. Se nos deixarmos aprisionar pelos conceitos dos outros, então sempre falaremos e agiremos como eles. (...)p.52

(...) A linguagem é o instrumento essencial de coesão social. Coesão social é o elemento fundamental de libertação.
Toda linguagem é epistêmica. Nossa linguagem provê nosso entendimento de nossa realidade. 'Uma linguagem revolucionária não deve ser hermética; não pode servir para confundir'. Cabe aos críticos a tarefa de clarificar a linguagem pública sempre que acreditarem que ela pode solucionar questões. Nós ganhamos conhecimento através da ciência e da retórica; eles são sistemas paralelos de epistemologia. Retórica é arte e arte é um modo de conhecer tanto quanto ciência. (...)
(...) A linguagem do explorador é vil, corrupta e vulgar. Para ele, o racismo não existe porque o que existe hoje é meramente discriminação ou pragmaticamente falando desigualdade de oportunidades. Não podemos permitir esta deslocação fácil na retórica do explorador. 'Não existe racismo negro contra brancos; este racismo é pura fantasia; a visão negra sobre os brancos é baseada em fatos'. A linguagem racista faz da vítima o criminoso. Devemos repudiar essa forma de pensar. P.53/ 54


Tipos de Inteligência

Três tipos de inteligência existem no mundo: a inteligencia criativa, a inteligência re-criativa e a inteligência consumidora. O tipo de inteligência mais valioso é aquele que comunica com a terra inteira por permanecer aberto a associações, ideias, espaços, eras e possibilidades. Atitudes disciplinadas enraizadas em imagens e símbolos Afrocêntricos podem criar combinações intermináveis; existem inúmeros exemplos em nossa história do potencial construtivo de combinações criativas.
Intelectuais re-criativos são capazes de elevar a visão dos intelectuais criativos a novas alturas. Eles o fazem usando constantemente essas ideias e propagando-as com grande clareza. Assim, durante em certo período, Malcolm X foi a mente reprodutora do trabalho de Elijah Muhammad; (...)

(...) O terceiro tipo de inteligência é a do intelectual prático que nem cria nem recria, mas consome e utiliza ideias. Numa sociedade Afrocêntrica, toda inteligência é aceita como contendo a força de Deus. No entanto, sabemos que nem todos conseguem utilizar este poder em qualquer circunstância. Algumas pessoas são executantes e re-criativas, enquanto outras são ativamente utilizadoras e consumidoras. Não há nada inerentemente errado com o consumo; deve-se é saber o que está sendo consumido. (p.61/ 62)


Níveis de Transformação

A Afrocentricidade é um poder transformador que nos ajuda a captura a verdadeira essência de nossas almas. Há cinco níveis de consciência que levam à transformação. O primeiro nível é chamado ‘reconhecimento de pele’, que ocorre quando uma pessoa reconhece que sua pele e/ou herança, porém não consegue compreender a realidade mais além. O segundo nível é o ‘reconhecimento do meio’. Nesse nível, a pessoa percebe como o meio define sua negritude através da discriminação e do abuso. O terceiro nível é a ‘consciência de personalidade’. Ocorre quando uma pessoa diz “eu gosto de música, ou de dança, ou de chitterlings”*, e sem dúvida está falando com toda honestidade, mas isso não é Afrocentricidade. O quarto nível é a ‘preocupação/ interesse’, onde a pessoa reconhece os três outros níveis e demonstra interesse e preocupação com os problemas negros e tenta lidar de maneira inteligente e preocupação com os problemas negros e tenta lidar de maneira inteligente com os erros do povo africano. No entanto, aqui também falta Afrocentricidade no sentido de que não se tornou um comprometimentos com a base cultural Afrocêntrica. ‘Consciência Afrocêntrica’, o quinto nível, é quando a pessoa se deixa transportar completamente para um nível consciente de envolvimento na libertação de sua própria mente. Apenas quando isso acontece podemos dizer que a pessoa está consciente da determinação da consciência coletiva. Um imperativo de vontade, poderoso, incessante, enérgico e vital, entra em ação para erradicar qualquer traço da falta de poder. A Afrocentricidade é como um ritmo; dita a cadência de sua vida... (p.78/ 79)

Trechos do livro "Textos Para o Movimento Negro" - Henrique Cunha Jr


Trechos do livro "Textos Para o Movimento Negro" - Henrique Cunha Junior





Percepção da Discriminação Racial na Escola pela Criança

(...) Os fatos
A denúncia da discriminação racial na escola, por parte da criança, somente ocorre nos casos de discriminação aberta. Dessa forma, não trataremos, aqui, de um conjunto de práticas discriminatórias sistemáticas que ocorrem no sistema educacional brasileiro, através do livro didático, da representação na história e geografia, da prática ideológica do (as) professores (as), diretores (as) e funcionários (as).
Os fatos denunciados pelas crianças podem ser agrupados em quatro níveis: no relacionamento com os colegas, no relacionamento com os professores e funcionários; quando da exposição de fatos quaisquer; e na proibição de participação em posição de destaque.

(...) Em todas as situações parece haver uma indecisão dos pais, devido, em parte, ao fato deles não acreditarem na existência do racismo brasileiro ou por procurarem sistematicamente negá-lo, pois, admiti-lo, é admitir a condição de ser inferior. Outro motivo de indecisão relaciona-se aos resultados do protesto motivado pela injustiça sofrida. Primeiro, porque a experiência mostra que tal protesto não levado em conta por ninguém. Segundo, porque ficam, por vezes, com medo da criança ficar marcada e ser perseguida.





(...) Bases do Sistema Educacional Brasileiro
Henrique Cunha Jr

(..) podemos notar nas ações desta elite nacional o desejo de branqueamento do país quer pelo esforço miscigenador ou pelo exterminador. Mas esta composição entre credo racial, mão-de-obra e conservação do poder que vai direcionar a elaboração dos sistemas educacionais brasileiros e nossa inserção no mundo do trabalho livre. Pela tradição escravocrata, nossa aptidão é para o trabalho e dele é excluída, na mesma visão, todo seu conteúdo intelectual. O trabalho que nos cabe é o trabalho pesado, tarefeiro. Por outro lado, o processo de industrialização implica um trabalho cada vez mais especializado, evoluindo numa das vertentes para um operariado treinado e um setor de serviços desenvolvido, demandando trabalho cujos níveis educacionais passam por constante aprimoramento. Sendo assim gera-se um processo de criação de moderno e uma sistemática exclusão nossa deste moderno.

(...)Dois Momentos- Dentro e Fora da Escola
(...) a educação numa sociedade racista possui conteúdo racista em todos os níveis e perfaz um processo de socialização excludente e inferiorizante. Neste sentido, a educação informação se completa ou se reforça com a educação formal.

(...) Esta ideia e pratica de conviver com a sociedade racista produz um conjunto de regras que vai desde driblar as dificuldades até comportamentos passivos de não deixar aflorar as dificuldades(...)

(...) A escola, por um lado vai proporcionar mais um aprendizado das relações raciais, sempre desvalorizando o negro e valorizando o branco.
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XIV - Reflexão sobre o 20 de novembro
(...) O primeiro sucesso do racismo no Brasil é o medo que muitos têm de ser negros,é a esclerose que muitos sofrem do significado objetivo de afirmar as nossas raízes comuns. Este medo e esta esclerose afetam a nossa consciência de direitos e de cidadania. Outro sucesso do racismo brasileiro é a farsa onde todos se declararam não racistas. Existe um medo da verdade que não atenua os fatos, que se confunde e não permite o desenvolvimento de uma consciência ativa de combate anti-racista.




Título Textos para o movimento negro
Editora Edicon, 1992
Original de Universidade do Texas
Num. págs. 142 páginas

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Trechos: Origens africanas do Brasil contemporâneo

Trechos: Origens africanas do Brasil contemporâneo - Kabengele Munanga

(...)Em termos gerais, tem-se da África uma imagem muito simples e reducionista, ilustrada por expressões como “na África é tudo a mesma coisa; na África é tudo diferente”. Esqueceu-se que se trata de um continente com 56 países; uma superfície de 30 milhões de quilômetros quadrados e uma população de cerca de 600milhões de habitantes. (...)

(...) Não apenas o significado da palavra “África” tornou-se objeto de especulação científica, mas também o próprio povoamento do continente. Controvérsias sustentadas por motivos ora científicos, ora ideológicos, continuam a confundir as mentes. Com efeito, durante muito tempo, os historiadores ocidentais defenderam a tese asiática da origem dos povos africanos. Fundamentada na descoberta do Homem de Java, na China, em 1891, outrora considerada o berço da humanidade, essa tese também foi fortemente influenciada pelos filósofos da época, em especial por Hegel. Este dividia o mundo em povos históricos e não históricos. Os primeiros seriam responsáveis pelo progresso humano, enquanto a passividade dos outros os teria mantido à margem do desenvolvimento espiritual da humanidade. (...)

(...) A descoberta do Autralopithecus pelo dr Leakey no leste da Tanzânia, em 1924, gerou as primeiras dúvidas quanto à origem asiática do primeiro homem e do homem africano. A partir do momento em que as novas descobertas científicas colocam o berço da humanidade no continente africano, as teorias que explicam o povoamento africano a partir da Ásia deviam ser totalmente abandonadas. É a partir disso que se coloca a origem da humanidade na África, sustentada pela teoria monogenista da humanidade,e não mais na Ásia; ou seja,os primeiros elementos da cultura africana foram elaborados dentro do continente africano e não trazidos de fora.(...) P.20/21

(...)O Australopiteco passou por um longo processo evolutivo, seguido pelos estágios de Homo habilis e Homo erectus antes de atingir o estágio de Homo sapiens, de quem descende o homem moderno. Todos estes estágios evolutivos foram realizados no próprio continente africano, o que gera a dúvida quanto à presença anterior do ser humano em outros continentes. A tese migratória apoiada por evidências cronológicas comprova que os homens de outros continentes (por exemplo, o homem de Neandertal, Cro-Mignon, de Grimald etc.) são descendentes do australopiteco. Há cerca de 1,5 milhões de anos,os ancestrais humanos viviam num Éden que abrangia principalmente as savanas altas entre a Etiópia e o Cabo (África do Sul). A partir desse período, o Homo erectus, que já tinha cultura bastante desenvolvida, elaborada em utensílios acheulenses, espalhou-se sobre grande parte das áreas tropical e subtropical do mundo antigo,desde a África meridional até a Ásia e a Europa. (...)P.41/42

(...) Resumidamente, a espécie humana originou-se nos pés da montanha de Lua, no Vale da Grande Fenda, marcados por grandes lagos onde estão as nascentes do rio Nilo. Foi desse lugar que os homens e as mulheres partiram para povoar o próprio continente e o resto do mundo. Disso resultou a hipótese de que os primeiros seres humanos, por terem origem nos trópicos, em torno dos grandes lagos, apresentavam, certamente, no início, pigmentação escura. Foi pela adaptação em outros climas que a matriz original se dividiu mais tarde em populações diferentes chamadas raças, por causa de suas características distintivas quanto à cor da pele e outros traços morfológicos. P.43


Os africanos que povoaram o Brasil e suas contribuições

(...) Os bantos, os primeiros a chegar, deram o primeiro exemplo de resistência à escravidão na reconstrução do modelo africano do “quilombo”, importado da área geográfico-cultural Congo-Angola. Os escravizados foragidos das fazendas se agruparam em áreas não ocupadas e de difícil acesso, organizando ali novas sociedades que apelidaram de quilombos. De origem da língua umbundu de Angola, “quilombo é um aportuguesamento da palavra kilombo,cujo conteúdo remete a uma instituição sociopolítica e militar que resulta delonga história envolvendo regiões e povos de lunda, ovimbundu, mbundu, luba, kongo e imbangala ou jaja, cujos territórios se situam hoje nas repúblicas de Angola e dos dois Congo. É uma história de conflitos pelo poder, de cisão de grupos, de migrações em busca de novos territórios e de alianças políticas entre grupos alheios.
Em seu conteúdo, o quilombo brasileiro é, sem dúvida, uma cópia do quilombo afro-banto reconstruído pelos escravizados para se opor à estrutura escravocrata, pela implantação de outra estrutura política na qual se juntaram todos os oprimidos. (...)

(...) Durante todo o século XVII,Palmares rechaçou mais 35 expedições comandadas pelos holandeses e portugueses. Mas foi a última expedição comandada em 1692,após quase um século de sua existência,por Domingos Jorge velho, que, depois de dois anos de luta, colocou fim à república palmerina, quando seu líder máximo, Zumbi dos Palmares, foi traído e morto por um de seus chefes subalternos. Foi sem dúvida uma estrutura política inspirada nos moldes organizacionais banto, certamente liderada por banto e seus descendentes, como comprovado pelo próprio nome do quilombo e pelos nomes de seus maiores líderes; Ganga Zumba e Zumbi, que significariam feiticeiro,imortal (Ganga de Nganga, em diversas línguas bantu; e Zumba, em kikongo, imortalidade;e Zumbi,de Nzumbi ou Nzambi, significaria espírito ou deus em várias línguas bantu).

Além desse modelo de resistência política apenas superada pela revolta dos escravizados africanos no Haiti,todos os estudiosos unanimemente reconhecem que as contribuições bantu na língua portuguesa do Brasil são mais fortes que a dos sudaneses. Não apenas introduziram uma parte do léxico desconhecido em português original como influíram na fonética e no uso de algumas expressões idiomáticas e até mesmo na fonologia de algumas palavras. (...)p.93

(...)No campo da religiosidade,as contribuições dos povos da área ocidental, particularmente do chamado Golfo de Benin, se destacam. Eles legaram ao Brasil um panteão religioso organizado segundo o modelo cultural jêje-nago, conhecido como candomblé da Bahia. P.94

O objetivo deste livro é resgatar a história e a beleza da África antes da exploração e dominação brutal a que os africanos foram submetidos para justificar e legitimar a colonização estrangeira. Com textos e fotos, o autor busca arrancar a máscara bárbara imposta àquele continente, com o intuito perverso de divulgar ao mundo uma África rude, selvagem e desprovida de humanidade, e nos revelar sua verdadeira, desconhecida e harmoniosa face.
A África é tão complexa e diversa que sua história não poderia se esgotar nessas páginas. Porém, com este livro, espera-se atender às premissas da Lei nº 10.639/03, que propicia aos estudantes brasileiros um conteúdo adequado sobre as origens, as línguas, as culturas e as civilizações do imenso continente que vive em cada um de nós.

Filme: Abolição (1988) - Zózimo Bulbul

Sinopse:

Produzido em 1988, faz o resgate de 100 anos de abolição no país, através de um olhar preto. Entrevistas com personagens importantes para a preservação da cultura, como Abdias do Nascimento, Lélia Gonzalés, Beatriz do Nascimento, Grande Otelo, Joel Ruffino, Dom Elder Câmera em contraposição com D. João de Orleans e Bragança e Gilberto Freire. Um importante documento das ideias desses pensadores, como também de presidiários, mendigos e artistas populares na sua maioria negros. Questiona que tipo de abolição houve neste país já que a situação 100 anos depois continuava de muita luta, desigualdade e racismo.





segunda-feira, 18 de julho de 2016

Todo dia, toda hora: é racismo

Numa conjuntura que nega a existência das várias formas que o racismo se manifesta é extremamente necessário apontar que infelizmente um povo vem sendo perseguido e exterminado; O POVO PRETO.

Por Fuca

Certa vez numa reunião duma grande empresa no Brasil, um gerente negro afirmou não haver racismo na empresa onde ele trabalhava, mesmo levando em consideração que ele era o único negro naquela sala com vinte pessoas que dirigiam e gerenciavam vários setores do topo do organograma da empresa. Para enfatizar sua posição, argumentou ter estudado e trabalhado muito para chegar onde chegou e que ocorre muito a questão do vitimismo quando se trata de racismo. Em contrapartida ele não desconsiderou que o racismo vigora, mas não lá, pois ninguém o xingou de macaco ou tacou banana nele, nem mesmo nunca o chamaram de negro fedido...

Todo dia temos situações como esta em vários locais. Em diversas instituições a representatividade do povo preto é irrisória evidenciando não apenas uma questão de preconceito ou discriminação, mas de racismo! Se preconceito é ter uma opinião e um conceito desfavorável a uma raça e discriminação é tratar de forma desfavorável uma raça, o racismo engloba os dois numa relação de poder*.

Então, além do povo preto ter acesso negado de forma peculiar (que não se enxerga fácil como nega) com um grande impacto (é nítida a negação), o que esse preto isolado disser vai equivaler a palavra ou a visão de todo um povo. Essa é uma das faces do racismo institucional! Diante disso, dentre outras coisas, percebe-se aí a importância de ser uma preta e um preto conscientes.

Não existe racismo apenas quando se xinga um preto ou uma preta. Mas a própria situação de haver apenas um preto no cargo de poder dessa empresa no Brasil. A situação de não poder falar das questões que seu povo vem sofrendo. A situação de não poder falar de um povo preto vitorioso, pois não teve nem acesso a linda história de seus ancestrais negros antes da escravidão e colonização europeia. A situação de não poder falar em protagonismo e muitas vezes ouvir o termo minoria que não faz sentido algum. A situação de não dispor de recursos psicológicos, culturais e epistemológicos necessários para sua emancipação quanto ser humano preto, diásporo Africano.

“Conceito de Racismo Institucional**
Racismo institucional pode ser definido como o fracasso coletivo das instituições em promover um serviço profissional e adequado às pessoas por causa de sua cor. O termo foi utilizado de forma pioneira, em 1967, pelos ativistas Stokely Carmichael e Charles Hamilton, integrantes do grupo Panteras Negras, para especificar como se manifesta o racismo nas estruturas de organização da sociedade e nas instituições (Geledés, 2013, P.11). Foi empregado também, a partir de 1993, por instituições de combate ao racismo na Inglaterra, em particular na Comissão para Igualdade Racial – Comission for Racial Equality (CRE) – do Reino Unido (Sampaio, 2003). Manifesta-se por meio de normas, práticas e comportamentos discriminatórios atuantes no cotidiano de trabalho das organizações, resultantes do preconceito ou de estereótipos racistas (Ipea, 2007). O racismo institucional não se expressa em atos manifestos, explícitos ou declarados de discriminação, mas atua de forma difusa no funcionamento cotidiano de instituições e organizações, que operam de forma diferenciada, do ponto de vista racial, na distribuição de serviços, benefícios e oportunidades aos diferentes segmentos da população (Silva et al. 2009) ”

No que tange a segurança pública o racismo anti negro age dessa forma sistêmica no Brasil. Em outras partes do mundo não deve ser muito diferente, independentemente se o povo preto seja maioria ou minoria. O cenário no país tropical do ‘(mito) democracia racial’*** é de total massacre. As maneiras as quais as vidas pretas são ceifadas é de total desumanização, da forma mais cruel dentro das possibilidades... não é uma analogia dos acontecimentos brutais da escravatura, até porque como C.L.R. James citou, “nenhum lugar na terra concentrou tanta miséria quanto o porão de um navio negreiro”. Mas as estruturas da escravidão permanecem a todo vapor, cheias de ódio.

Se a vida é um bem maior humano, então a vida deve ser a primeira pauta a se lutar, e se as vidas pretas que estão sendo aniquiladas tem que se lutar pelas vidas pretas primeiro. Primeiro Raça! Primeiro a Vida, para ainda assim sobreviver!

Numa conjuntura que nega a existência das várias formas que o racismo se manifesta é extremamente necessário apontar que infelizmente um povo vem sendo perseguido e exterminado; O POVO PRETO.

Será que a maldita farda estatal da polícia jamais cessará fogo contra o povo preto? Vejam bem, não é uma questão que teria que morrer mais brancos, entenda... Não dá pra aceitar o extermínio do nosso povo preto! Infelizmente essa é a regra, o combate deve ir em direção aos valores arraigados nessa regra, e a força da exceção não deverá ser mais forte do que a regra!

Como acabar com essas instituições que perseguem os negros? O que está em jogo é: a quem essas instituições servem? Pra quem é interessante a morte dos pretos? Quem detém todo esse poder é a Supremacia branca****.

É não enxergar isso e ver a escalada de violência subir mais e mais. Alguém lucra com isso? Sim, os privilegiados supremacistas brancos. Apenas os pretos são/serão atingidos? Não, mas a negação da existência do racismo não cabe nessa realidade, ou queriam que a letalidade da polícia fosse 100% de negros? Não basta de 70% a 80%?

Como aceitar que continuem surgindo movimentos intitulados pelos últimos dizeres da vida dos nossos mortos?

Os dados podem parecer frios, mas é o modo de se visualizar essa realidade que “oito em cada dez usuários regulares de crack são negros. Oito em cada dez não chegaram a ensino médio”.***** Desses, 40% vivem em situação de rua, 49% tem passagem pelo sistema prisional. O Brasil encarcera mais de 700 mil pessoas! O genocídio perpetrado pela supremacia branca é devastador!

É mais que necessário que visemos o direito de formar uma nação preta autônoma, pois o genocídio vai para além da morte física, atinge a natureza do ser, a cultura, a religião, a família, a existência, a alma e a nossa realidade!    
    


*Racismo: Relação de poder que inferioriza características físicas (fenótipo) e culturais de uma raça, “um sistema de pensamento, fala e ação operado por pessoas que se classificam como brancas, e que usam o engano, a violência, e/ou a ameaça de violência, para subjugar, usar e/ou abusar de pessoas classificadas como ‘não-brancas’ em condições que promovem a prática da falsidade, da injustiça e do erro, em uma ou mais áreas de atividade, com o objetivo último de manter, expandir e/ou aperfeiçoar a prática da supremacia branca (racismo).” (Neely Fuller Jr) ver artigo Primeiro Raça.link


** Extraído do artigo “Segurança Pública e Racismo Institucional” (Almir de Oliveira Júnior/ Verônica Couto de Araújo Lima)


*** ...o Brasil sempre se apresentou internacionalmente com a imagem de país modelo da harmonia racial, constituindo-se no exemplo de país em desenvolvimento e de perfeita convivência racial, conforme consta nos relatórios apresentados à ONU sobre a Convenção Internacional de Eliminação de Todas As Formas de Discriminação Racial.
“Tenho a honra de informa-los que desde então não há discriminação racial no Brasil (...) na legislação que especificamente lida com a discriminação racial. Nenhuma apresentação detalhada é determinada, porque o contexto histórico e cultural dos brasileiros é tal que esse tipo de preconceito é completamente estrangeiro a ele.” (CERD, 1970)
“A integração racial no Brasil, que é resultado dos quatros séculos de nosso desenvolvimento nacional, proporciona para o mundo contemporâneo uma experiência em harmoniosa vivência racial. Isso é infelizmente incomum em outros locais. Essa integração não originou de leis que estipulam que somos um, mas de um processo natural espontaneamente alcançado.” (CERD, 1971)
“Pareceria supérfluo aqui repetir o fato que no Brasil tolerância racial e miscigenação precedem qualquer estatuto legal que poderia ter tentado proibir ou suprimir a discriminação racial. É questão de registro que, embora a integração étnica tenha existido durante séculos no Brasil, a primeira lei para lidar especificamente com o assunto entrou em efeito em 1951. Essa é a razão pela qual o código penal não ataca a discriminação racial diretamente.” (CERD, 1974)
“Como país que consolidou sua identidade nacional em cima de um período longo de experiência étnica, marcado pela integração harmoniosa e congruência cultural de grupos raciais diferentes, o Brasil condena todos os atos de discriminação, dando seu apoio sem hesitar a todas as iniciativas empreendidas para combater o apartheid, especialmente para as resoluções pertinentes das Nações Unidas, da Assembléia Geral e do Conselho de Segurança” (CERD, 1980)

(O Movimento Negro e o Estado:1983-1987 – Ivair Augusto Alves dos Santos)


**** ...Em sua forma mais óbvia, a supremacia banca se expressa como um processo físico de pura violência, muitas vezes extremamente brutal. A escravização, pelos europeus, de milhões de africanos durante várias centenas de anos, o extermínio dos povos indígenas na América, assim como a matança e o aprisionamento de milhões de africanos durante o período de colonização, são apenas exemplos de uma lista aparentemente interminável de atos de terror perpetrados por supremacistas brancos em todo o planeta. A supremacia branca também pode ser um processo social e econômico pelo qual milhões perdem a soberania, muitas vezes em sua própria terra, sendo seus “recursos” (por exemplo, terra e trabalho) apropriados pelos europeus em função dos interesses destes. Mas a supremacia branca também pode ser um processo mental, mediante a ocupação do espaço psicológico e intelectual dos que devem ser submetidos, levando ao que Wade Nobles denominou, de forma certeira, “encarceramento mental”. A tomada do espaço mental africano ocorre por meio do disfarce de ideias, teorias e conceitos europeus como universais, normais ou naturais. Todos são “étnicos”, menos os europeus. Mas essa aceitação não questionada da Europa como normativa é altamente problemática para os africanos. Com efeito, a Europa forjou grande parte de sua identidade moderna à custa dos africanos, particularmente por meio da construção da imagem do europeu como o mais civilizado e do africano como seu espelho negativo, isto é, como primitivo, supersticioso, incivilizado, aistórico e assim por diante.

(A Afrocentricidade Como Um Novo Paradigma – Ama Mazama)


***** Oito em cada dez usuários regulares de crack são negros. Oito em cada dez não chegaram ao ensino médio. Essas proporções são bem maiores do que as encontradas no conjunto da população brasileira. Além disso, elas referem-se a características temporalmente anteriores ao uso de crack. Somavam-se a esses, outros indicadores de vulnerabilidade social, como viver em situação de rua (40%) e ter passagem pelo sistema prisional (49%). As mulheres usuárias regulares de crack têm o mesmo padrão de vulnerabilidade social, com o agravante que 47% relataram histórico de violência sexual (comparando a 7,5% entre homens). Outra pesquisa já havia indicado que a mortalidade de usuários de crack é 7 vezes superior à população geral, sendo os homicídios a causa de morte em 60% dos casos.
A relação entre exclusão social e uso do crack emergiu como um tema a ser aprofundado a partir da pesquisa de metodologia epidemiológica da FIOCRUZ.

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Lançamento do Jornal Assata Shakur em São Paulo - 15/07/16

Lançamento do Jornal Assata Shakur, da Campanha Reaja, e debate Não Vote, Reaja, com Hamilton Borges.

Facebook: https://www.facebook.com/events/496287603896145/

"A Campanha Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta é uma articulação de movimentos, na palavra de um dos seus principais articuladores, Hamilton Borges, “Pan-Africanista, comunitária, quilombista e maloqueira.” A Reaja luta contra o racismo e a supremacia branca, evidenciando a brutalidade policial, a seletividade do sistema penal e outros tentáculos que fazem o genocídio do povo Preto uma política de Estado. 

Recentemente, a Reaja lançou a edição #1 do seu jornal, que é intitulado Assata Shakur. Foram realizados lançamentos do jornal na Bahia e no Rio de Janeiro, juntamente com lançamento da Campanha Não Vote, Reaja, que tem o objetivo de propagandear o boicote às eleições. A edição #0 foi lançada em fevereiro deste ano e pode ser lida aqui e a edição atual ainda não está disponível em versão digital.
Neste número, foram publicados um texto de Christen Smith sobre a Assata Shakur e que contém excertos do texto Uma Carta ao Papa, de 1998. Além desse texto, o jornal também conta com grande parte de outra carta da Assata, Carta de Assata do Complexo Industrial Prisional, traduzido por Gilza Marques
O jornal pode ser adquirido diretamente com articuladores ou articuladoras da Reaja na sua cidade. Para saber mais, acesse o endereço eletrônico e o facebook da Campanha".

Este encontro de lançamento, em São Paulo, está sendo organizado, de forma autonoma e autosuficiente, pelas organizações Pan-Africanistas: Reaja, Frente Negra do Grajau, Posse Haussa e UCPA (União dos Coletivos Pan-Africanistas).