sábado, 31 de agosto de 2019

Breve nota – Relatório Professores Excelentes do Banco Mundial

Com base na leitura do relatório Professores Excelentes (2014) do Banco Mundial acerca da melhoria na aprendizagem dos estudantes da América Latina e Caribe, traço abaixo um breve comentário sobre minha sensação pós leitura de tal manual, nota essa que se atem ao reflexo de um cenário neoliberal na educação, abstraindo ainda (nessa nota) uma leitura que contenha um viés racial e de gênero, que de fato existem.

É de causar no mínimo um estranhamento ao relacionar e/ou enxergar as ações do Banco Mundial apenas pelo viés do altruísmo despendido aos Países do chamado Terceiro Mundo. Se faz necessário perpassar, mesmo que superficialmente, pelo contexto em que o Banco Mundial foi criado e consolidado. É de suma importância, também, buscar revelar algumas questões e consequências que estão imbricadas no pano de fundo deste ato de ajudar, ao suposto estimulo de reduzir a pobreza, ou de se preocupar com o desenvolvimento dos Países da América Latina e do Caribe, - para se utilizar apenas de algumas falas que essa instituição gostaria que existisse ao se avistar sua estrutura de forma rasa.
Para se chegar direto ao ponto, baseando aqui na análise de Mike Davis em Planeta Favela, são justamente essas ações do Banco Mundial em conjunto com o Fundo Monetário Internacional (F.M.I) que culminam nas faltas de estruturas, aumento da pobreza, favelização, e a precarização das condições de trabalho nos países do chamado terceiro mundo. E por mais que a crítica de Davis não esteja voltada unicamente à educação, é importante frisar que toda esta falta de estrutura e austeridade imposta por estas instituições se consubstancia na precarização do sistema educacional, direta ou indiretamente.
O Banco Mundial em conjunto com o FMI ao intervirem na estrutura política dos países do terceiro mundo, visam nitidamente implantar uma reestruturação neoliberal nas economias do terceiro mundo, sobretudo nas economias urbanas, pois tais países se encontram endividados devido os juros elevados que são cobrados como condição aos empréstimos cedidos pelo Banco Mundial e FMI. (DAVIS, 2006:151). Ao prefaciar Istvan Meszaros em A Educação Para Além do Capital, Emir Sader revela em síntese o que representa o viés neoliberal para educação.
“No reino do capital, a educação é, ela mesma, uma mercadoria. Daí a crise do sistema público de ensino, pressionado pelas demandas do capital e pelo esmagamento dos cortes de recursos dos orçamentos públicos. Talvez nada exemplifique melhor o universo instaurado pelo neoliberalismo, em que “tudo se vende, tudo se compra”, “tudo tem preço”, do que a mercantilização da educação. Uma sociedade que impede a emancipação só pode transformar os espaços educacionais em shopping centers, funcionais à sua lógica do consumo e do lucro. ” (Prefácio de Emir Sader, p.16)
É interessante notar, em suma, que estes empréstimos são mais uma das reinvenções que o capital se submete para conseguir manter seu constante acumulo, pois assim aufere a imposição dos seus Planos de Ajuste Estrutural (PAE) agindo através do desenvolvimento geográfico desigual que é um dos principais sustentáculos do capitalismo. Toda a acumulação infinita de capital existe certamente de forma combinada, é uma ação meticulosamente organizada, e isso reflete na maneira com a qual este relatório do Banco Mundial tratou o sistema educacional, tanto na parte estrutural quanto na parte regional.
Na estrutura buscou-se personificar a educação no sentido de que o pleno êxito da escola estaria puramente condicionado na produtividade de uma aula dos professores, tratando, assim, o conhecimento e a educação como mercadoria. Portanto, a aula de cada docente seria travestida em força de trabalho, que não deixa de ser uma mercadoria no sistema capitalista em que o trabalhador deve vender para gerar a mais-valia num produto, pois é basicamente a força de trabalho que transforma dinheiro em capital.
No que tange à regionalização proposta pelo relatório, ela se inspira na divisão feita pelo Consenso de Washington, que foi outra recomendação de ode ao neoliberalismo na América Latina e Caribe, tendo como orientação uma reforma fiscal, a abertura de mercado, políticas de privatizações, dentre outras medidas. Há de se perceber que tal relatório (Professores Excelentes) não foi desenvolvido para outros países do terceiro mundo.
Vale lembrar que na ótica de Davis, as crises desencadeadas entre as décadas de 70 e 80, no mundo subdesenvolvido, foram mais devastadoras do que a Grande Depressão de 1929, apenas para se ter uma dimensão do que os ajustes dessas instituições alcançaram, ou seja, intensificaram a precariedade e a degradação em países que já tinha passado outrora pela pilhagem e brutalidade das colonizações cometidas pelos países imperialistas.
“Entre 1974 e 1975, o Fundo Monetário Internacional, seguido pelo Banco Mundial, mudou o seu enfoque dos países industriais desenvolvidos para o Terceiro Mundo, que cambaleava sob o impacto dos preços cada vez mais altos do petróleo. Ao aumentar passo a passo os seus empréstimos, o FMI ampliou aos poucos o alcance das ‘condicionalidades’ coercitivas e ‘ajustes estruturais’ que impunha aos países seus clientes. Como enfatiza a economista Frances Stewart em importante estudo*, os ‘fatos exógenos que precisavam de ajuste não foram atacados por essas instituições, os maiores deles sendo a queda dos preços das commodities e os juros exorbitantes das dívidas’, mas todas as políticas nacionais e todos os programas públicos foram alvo de excisão. ” (DAVIS, 2006:156)
*Stewart, Adjustment and Poverty, p.213



Fuca cgpp - 19

Nenhum comentário:

Postar um comentário