domingo, 21 de setembro de 2025

Fichamento Montesquieu - Do Espírito das Leis (primeira publicação em 1748).

MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo, Saraiva, 1992. Trechos recortados dos livros 1º, 2º, 3º, 5º, 8º e 11º.

No contexto de transição do Antigo Regime para os ideais Iluministas, notadamente após a queda daquele, o escritor Montesquieu escreveu o famoso livro “Do Espírito das Leis”, sendo ele um pensador francês de origem nobre no século XVIII. Naquele tempo, em que outras formas de governo, de poder e de lei estavam sendo debatidas, Montesquieu discorreu sobre o funcionamento e a estrutura de diferentes tipos de governo focando na importância de um poder moderador ou da moderação entre os poderes. Essa elaboração ainda é relevante aos dias atuais, pois não só serviu de base para o desenvolvimento da ciência política como permanece vigente em muitos Estados modernos, mesmo com suas crises e reinvenções.

Em suma, o autor define e conceitua o que são as leis, porém, em seu livro, ele não discorre sobre as leis em si, mas sobre o espírito das leis. Ademais, para além de se ocupar sobre o motivo e a maneira de como os Estados surgiram, Montesquieu constata e define as diversas formas de realização do governo: República, Monarquia e Despotismo. Estas formas, por sua vez, são caracterizadas por natureza e princípio.

A natureza seria o formato de distribuição do poder na sociedade, trata-se sobre quem detém o poder e quem é subordinado a ele. Já por princípio seria a forma sobressalente de como o poder é exercido, como a virtude na República, a honra na Monarquia, e o temor no Despotismo.

Adiante, tomando como exemplo governos vigentes à época, Montesquieu postulou a relação entre a liberdade política do cidadão e o ordenamento político do Estado, chegando à conclusão da necessidade da existência de freios e contrapesos entre a divisão dos poderes do Estado, visando a lógica de moderação dos poderes a fim de evitar abusos de poder.


LIVRO I

“DAS LEIS EM GERAL”

Neste capítulo Montesquieu começa, de maneira geral, com a definição de leis, que “são relações necessárias que derivam da natureza das coisas.” A seguir, o autor diferencia e relaciona as leis naturais às leis criadas pelas pessoas. Para Montesquieu todos os seres têm as suas leis, inclusive Deus e seres superiores ao homem. Ou seja, seres detentores de inteligência criam suas leis, mas existem também outras leis, as quais eles não fizeram. Com isso, o autor aponta uma falha ou limitação das pessoas, que leva ao erro e que impede que “o mundo inteligente seja tão bem governado quanto o mundo físico. Pois, se bem que aquele também possua leis que, pela própria natureza, são invariáveis, não lhes obedece constantemente como o mundo físico obedece às suas.”

“Das Leis Da Natureza”

Quando as pessoas eram regidas pelas leis da natureza, visavam a conservação de seu ser, e tinha a figura de um criador como uma referência mais importante. A partir disso, o autor postula quatro leis naturais.

A primeira lei, que em suas palavras contrasta com Hobbes, seria a paz, porque o homem é imbuído do medo e do sentimento de fraqueza, e tende a não atacar o outro. A segunda lei seria a busca das necessidades, sobretudo alimentar. A terceira seria a aproximação sexual visando o prazer com outras pessoas. A quarta lei seria o desejo de viver em sociedade e se unir na busca de trocar conhecimentos entre si.

“Das Leis Positivas”

No momento em que as pessoas passam a viver em sociedade, elas tendem a dirimir seu sentimento de fraqueza e, consequentemente, a igualdade passa a ser relativa e se iniciam as guerras, que podem se dar nos níveis entre nações ou entre pessoas dentro de uma mesma nação.

Com isso, as leis são criadas para regularem os relacionamentos das pessoas entre si, que são chamadas de Direito das Gentes, que se fundamenta no princípio de não prejudicar seus próprios interesses através de guerras. Agora, considerando o relacionamento dos governantes e governados surge o Direito Político, já que uma sociedade não poderia existir sem um governo. E, por fim, o Direito Civil, que são as leis que regulam o relacionamento dos cidadãos entre si.

Ainda, Montesquieu estabelece que as leis seguem a racionalidade humana, seja a lei política ou a civil, e que existiria uma particularidade de cada sociedade ou nação de acordo com questões geográficas, climáticas, e suas forma produtivas, além de elementos do povo como religião, costumes, ou seja, cada característica de um país inseridas nas leis.

LIVRO II "DAS LEIS QUE DERIVAM DIRETAMENTE DA NATUREZA DO GOVERNO"

O autor postula três tipos de governo: o republicano, onde todo o povo ou parte dele detém o poder soberano; o monárquico, quando uma só pessoa governa seguindo leis fixadas; e o despótico, no qual uma só pessoa governa com reduzida influência das leis, seguindo apenas suas próprias vontades.

República (democracia e aristocracia)

Na democracia, o povo detém o poder soberano, estando algumas vezes na posição de soberano, em outras de súdito. Na aristocracia esse poder está nas mãos de apenas parte do povo.

A lei fundamental para esse tipo de governo são as leis de sufrágio, como escolher seus representantes e como as leis serão votadas. O povo também deve nomear ministros, pois existem situações que é necessária uma regra prejudicial ao povo, que ele nunca iria votar.

Essa escolha deve ser guiada pelo mérito daquele elevado ao cargo público, com distinção entre os que podem eleger e serem eleitos, sendo essas leis fundamentais para a república.

Uma maneira existente é pelo sorteio, de natureza democrática, ou pela escolha, de natureza aristocrática. Cada um com regras próprias, como exames aos sorteados ou sobre a publicidade dos sufrágios. Contudo, independentemente do método, deve permanecer a máxima que apenas o povo pode fazer as leis.

A aristocracia acaba sendo gradativa, ela precisa servir ao povo, não apenas aos nobres que a compõe, tirando o povo da nulidade. Esse poder também não pode ser exorbitante, assim como o monarca, os membros da aristocracia devem obedecer às leis.

Monarquia e Despotismo

Para a existência de um governo monárquico são necessárias leis fundamentais que levem o poder até o príncipe. Esse poder é levado por intermediários como a nobreza ou o clero. Sem essas linhas de transferência de poder, surgiria um déspota.

Além desses postos intermediários, é necessário que haja leis políticas a serem seguidas, leis que tanto os conselhos como o próprio monarca devem obedecer. Sem essas leis surge um Estado despótico, governado pela religião ou costumes.

É da natureza humana que uma pessoa, ao assumir tamanho poder, acaba abandonando os negócios públicos, nomeando alguém para cuidar de seu governo enquanto se preocupa apenas com os prazeres oriundos dessa posição. Essa nomeação acaba se tornando a única lei fundamental do Estado despótico.

Governos e seus princípios

Ao contrário dos outros tipos de governo, para a democracia se sustentar é necessária a virtude de seus cidadãos. Essa virtude permite que as próprias pessoas que estejam fazendo as leis, as façam de boa maneira. Há uma inversão de valores quando a virtude tende a se reduzir podendo culminar na extinção do modelo República. Para a aristocracia, o princípio essencial é a moderação, entendida como a virtude dos nobres, e mais reduzida em comparação com a democracia.

Na monarquia, a virtude não é algo necessário. Pode até ocorrer em algum príncipe ou alguma pessoa do povo, mas nesse tipo de governo, o mais comum é o princípio da honra, que, ao agir em conjunto com as leis, conduz o governo ao seu objetivo. Uma das características da honra é que existam preferências e distinções, assim cada homem acaba agindo pela sua própria ambição. Porém isso não apresenta perigo, mas faz com que o corpo político se movimente na direção do bem comum.

Nos governos despóticos não há algo nesse sentido, pois não existem leis ou constituição e todos homens são iguais enquanto servis, não havendo espaço para a honra e nem virtude. O governo despótico se usa do temor para governar, impedindo que haja contrariedade. Assim o déspota garante sua autoridade e força.

Livro 8 - Corrupção dos princípios

A corrupção dos governos começa pelos seus princípios

A democracia se corrompe quando existe desigualdade, aproximando-a de uma aristocracia. Outra maneira ocorre quando existe igualdade extrema, fazendo com que o povo deseje as funções de magistrado ou legisladores, passando a não respeitá-los, tornando todos déspotas. A aristocracia se corrompe quando o poder se torna arbitrário, com o poder de forma hereditária. Para a aristocracia se manter forte é necessário o perigo externo, garantindo a segurança interna.

A corrupção acontece na monarquia quando um príncipe resolve alterar mais as coisas do que mantê-las, centralizando o que for possível na sua pessoa. A corrupção aparece quando se mistura honrarias e infâmias, quando o príncipe for severo e não justo ou quando os súditos obedecem mais ao príncipe do que à pátria, diminuindo a segurança.

A nobreza prefere obedecer a um rei do que partilhar poder com o povo, portanto, na ausência de um príncipe, buscam coroar outro.

A mudança de governo moderado para governo moderado não traz problemas, o inconveniente aparece quando se muda para o despotismo. Esse tipo de governo se corrompe sozinho, possuindo vício interior e só se estabelecendo por acidentes. Ele não se mantém pois logo são impostas regras.

As leis seguem o princípio de seus governos, quando existe corrupção, elas se tornam más, quando não existe, até as más leis se tornam boas. Por isso leis que parecem destruir o governo, como a insurreição que depunha os magistrados, foram usadas para fortalecer a república em momentos históricos. Quando os magistrados legislam em benefício próprio e abusam de seu poder, toda a república cai, pois perde-se o princípio formador.

A república funciona melhor em territórios pequenos, pois o povo percebe melhor o bem público, está mais próximo dele. É um tipo de governo que se preocupa com as liberdades, não com o engrandecimento.

A monarquia deve ter tamanho mediano, sempre sob os olhos do príncipe. Isso é necessário para que as leis e costumes sejam executados rapidamente. Caso cresçam de tamanho, acabam se repartindo em reinos menores ou se tornando um déspota.

O governo despótico funciona em grandes impérios, pois o temor evita que acidentes ocorram, e quando ocorrerem, o mesmo temor faz com que governadores ou magistrados locais apliquem rapidamente a lei.

Livro 11 - Leis que formam a liberdade

As leis podem formar a relação da liberdade política com a constituição ou com o cidadão. A Liberdade é mais vista na República, mas existem também nas outras formas de governo, assumindo então uma significação variada. Contudo, o autor define da seguinte maneira: "A liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem."

A liberdade política existe apenas nos governos moderados, quando não existe abuso de poder. O próprio poder deve portanto controlar o uso do poder. Cada Estado tem seu próprio objetivo.

Dentro de cada Estado existem três poderes, o legislativo (fazer as leis), o executivo dos direitos das gentes e o executivo do direito civil (atualmente chamado judiciário). Essa separação é importante, pois se o mesmo corpo exercer mais do que um poder, aparece o despotismo.

Com os três poderes funcionando, o Estado se vê forçado a andar sempre em comum acordo, buscando seus objetivos. Até que a liberdade se acabe e o Estado pereça, caso o legislativo seja mais corrupto que o executivo.

Essa separação garante uma liberdade política, que embora não seja o objetivo imediato de algumas monarquias, as distância do despotismo.

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