sábado, 23 de fevereiro de 2019

Rap e História; a arte da revolução e a revolução da arte. Parte 1.

Rap e História; a arte da revolução e a revolução da arte. Parte 1.
Miguel Angelo (LIL X) - CEO na empresa W-BOX - GOLD. 
Posse Entre o Céu e o Inferno, Insurreição CGPP.

Foi em meados dos anos 90 (séc XX) que a cultura Hip Hop ganhou notável espaço nas universidades dos EUA. Com estudos intensos buscando a compreensão de um fenômeno que realmente mudou a lente que a sociedade estadunidense utilizava para apreender a realidade surgiram diversos estudos nas áreas das ciências humanas, com destaque para as análises históricas, jornalísticas e comunicação & artes. Vamos começar com algumas delas;

• Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America

Uma referência importante nesse sentidos é da Professora Trice Rose que é socióloga lecionando na Brown University associada ao departamento de estudos africanos e diretora do Centro de Estudos de Raça e Etnia na América da mesma universidade. Ela escreveu o livro "Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America" em 1994 a partir de sua tese de doutorado, que alias foi a primeira tese de doutorado da história dedicada exclusivamente a cultura Hip Hop. Black Noise esteve entre os 24 livros mais lidos segundo a The Village Voice à época e recebeu o premio, o American Book Award da Before Columbus Foundation em 1995. 

• "kickin' Reality, Kickin' Ballistics: 'Gangsta Rap' and Postindustrial Los Angeles" 

O historiador Robin Keley (Robin Davis Gibran Kelley) , que é professor de História Americana na UCLA, tem um capítulo, "kickin' Reality, Kickin' Ballistics: 'Gangsta Rap' and Postindustrial Los Angeles" dedicado a cultura hip hop em seu livro "Race Rebels: Culture, Politics, and the Black Working Class de 1994 em que trata da história e cultura afro-americana enfocando seus movimentos sociais privilegiando as relações raciais nos EUA. 

• "Hip Hop America"

Nelson George colunista de música, crítico cultural, jornalista e cineasta indicado duas vezes ao National Book Critics Circle Award e vencedor duas vezes do ASCAP-Deems Taylor publicou "Hip Hop America" em 2005. A obra é não-academica o que permitiu atingir um grande e diversificado público, as temáticas centrais são a política, cultura e a economia nos negócios do Hip Hop. George é um mais populares colunistas da cultura pop afro-americana hoje nos EUA e, evidente, fã da cultura Hip Hop. Nelson George ainda é supervisor de produção e roteirista da séria da Netflix "The Get Down"; "Hip Hop America é o relato definitivo da colisão entre a cultura da juventude negra e a mídia de massa e seu impacto na mudança social."

• "When Chickenheads Come Home to Roost: A Hip Hop Feminist Breaks it Down"

Joan Morgan, que atualmente cursa o doutorado na New York University, publicou "When Chickenheads Come Home to Roost: A Hip Hop Feminist Breaks it Down" em 1999 gerando impacto importante e se tornando sua mais famosa obra. Esse livro discute a complexidade de uma identidade feminista entre as mulheres negras dentro de um movimento centrado no homem negro, as contradições e possíveis reconciliações em um contexto de sociedade de tipo patriarcal analisando rappers como Lil 'Kim e Queen Latifah. Janet Mock da New York Redefining Realness considera a obra representante de toda uma geração de mulheres negras que começaram a revindicar seu espaço como protagonistas no movimento Hip Hop, a chamada geração pós feminista. Joan cunhou o termo "hip-hop feminism" nesta obra. 

• Rap Music and the Poetics of Identity

O hoje já falecido, professor branco de análise musical da Nottingham University no Reino Unido, Adam Krims, nos legou a obra "Rap Music and the Poetics of Identity" escrita em 2000 surpreendendo os próprios membros da cultura Hip Hop com a facilidade de compreensão de o autor conseguiu articular para explicar a apreensão da forma de organização do movimento e para a formação das identidades ocorrem em seu seio. A obra ataca os críticos culturais que à época reduziam o rap a um discurso apolítico e de pouco impacto social positivo com a análise das obras de rappers do calibre de Ice Cube, Goodie Mob e KRS-One.

• Rap Music and Street Consciousness

A professora de etnomusicologia da Escola de Música Herb Alpert da UCLA, Diretora da pós-graduação em musica popular americana e história e cultura da música rap, Cheryl L. Keyes, lançou "Rap Music and Street Consciousness" em 2004 que foi ganhador do premio CHOICE por melhor título acadêmico no mesmo ano. Keyes é pioneira em análises etnográficas da música rap, e "Rap Music and Street Consciousness" é a primeira obra que analisa o rap a partir da metodologia musicológica realizando uma verdadeira arqueologia do gênero desde a tradição musical dos povos da África Ocidental, passando pelo Dancehall jamaicano e as expressões vernaculares afro-americanas até o mainstream da época. Keyes define o rap como; " [...] um fórum que aborda a marginalização política e econômica de jovens negros e outros grupos, promovendo o orgulho étnico e exibindo valores e estética culturais". A obra trás a analise das obras de referencias centrais da cultura Hip Hop como Afrika Bambaataa, que considera seu padrinho, da Zulu Nation, George Clinton & Parliament-Funkadelic, Grandmaster Flash, Kool 'DJ' Herc, MC Lyte, LL Cool J, De La Soul, Public Enemy, Ice T, DJ Jazzy Jeff & Fresh Prince e The Last Poets sempre desafiando análises acadêmicas externas ao Hip Hop. As pesquisas etnográficas foram realizadas em Nova York, Los Angeles, Detroit e Londres e trás entrevistas com artistas, produtores, diretores, fãs e empresários da cena. Muitos temas novos foram abordados na obra com a questão do surgimento dos (as) rappers brancos (as), os impactos legais das novas inovações tecnológicas, o impacto dos vídeo-clipes de rap, o gangsta rap, o Rap do Sul e os subgêneros do rap centrados na dança. Uma parte do livro é dedicada a questão das carreiras cruzadas de rappers que se tornaram milionários também em outras áreas como no cinema, os casos de Queen Latifah, Will Smith e Ice Cube, assim como o império multimídia de Sean 'P. Diddy' Combs, a Death Row Records, as tensões entre as costas oeste e leste, os assassinatos de Tupac Shakur e Christopher 'The Notorious Big' Wallace assim como as tentativas de unificação da Nação do Islam com a Nação Hip Hop.

• The Hood Comes First

Obra de 2002, The Hood Comes First foi escrita pelo professor branco associado de música e estudos da comunicação da Nottingham University no Reino Unido, Murray Forman. Nesta obra, Murray buscou captar as ressonâncias da música rap a partir do espaço urbano, nas territorialidades dos guetos onde vivem os negros afro-americanos. É um estudo que busca entender como o rap, nas suas mais varias vertentes e meios (como cinema, rádio e vídeos clipes) explicam o território e as identidades individuais e coletivas trabalhando com as categorias "gueto", "centro da cidade" e "bairro". O método de Murray busca uma negociação entre a linguagem acadêmica e a linguagem das ruas na dinâmica raça, espaço social e juventude. Mostra a centralidade do território na discursividade do rap, defendendo inclusive que o espaço geográfico é central na identidade autêntica do movimento Hip Hop, que modifica as ideias de raça, classe e identificação nacional. Uma das contribuições da obra se refere a análise dos processos dentro da industria cultural que culminou na projeção internacional da música rap.

• Check It While I Wreck It: Black Womanhood, Hip Hop Culture, ans the Public Sphere.


A Socióloga professora de estudos da mulher e estudos de gênero do College of Arts & Sciences ligado a Syracuse University, Gwendolyn D. Pough publicou "Check It While I Wreck It: Black Womanhood, Hip Hop Culture, ans the Public Sphere" em 2015, esta obra, de certa maneira, está em diálogo com a de Joan Morgan no sentido de realizar uma provocação central; Por que as mulheres negras no seio da cultura Hip Hop ainda lutam por igualdade mesmo com a projeção da música rap no mainstream? Como Joan, Gwen busca compreender a complexa relação que as mulheres negras vivenciam ao articular a vivencia na cultura Hip Hop com o feminismo. A análise de Gwen articula a cultura musical afro-americana de suas raízes até o rap assim como articula as identidades das primeiras gerações de mulheres negras influentes de Sojourner Truth, passando pelas referencias da luta pelos direitos civis e do movimento Black Power até chegar em Queen Latifah, Missy Elliot e Lil ' Kim que para Gwen são referencias chave hoje para compreender como as mulheres negras estão recuperando um legado que visa atrapalhar e ocupar a esfera pública patriarcal dominante. Gwen discute ainda como as jovens negras de hoje veem lutando contra a linguagem estereotipada do passado ("castrating black mother," "mammy," "sapphire") e do presente ("bitch," "ho," "chickenhead"), e defende a música rap como uma ponte que mulheres negras encontraram para contar sobre suas vidas, construir suas identidades e desmantelar representações negativas do passado e do presente referentes a feminilidade negra utilizando como exemplo a própria relação que se dá atualmente na produção de raps da mulheres negras que utilizam a retórica masculina sobre o amor como meio de dar poder as suas discursividades. A obra defende o papel da música rap como método pedagógico assim como sua importância para os movimentos negros e o feminismo negro. Em síntese a obra é uma defesa da cultura Hip Hop e da música rap assim como uma denúncia ao sexismo e a misoginia inerente ao mainstream.






segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Trechos do livro "A educação para além do capital" de István Mészáros

Trechos do livro "A educação para além do capital" de István Mészáros


“(...)Em A educação par além do capital, Mészáros ensina que penar a sociedade tendo como parâmetro o ser humano exige a superação da lógica desumanizadora do capital, que tem no individualismo, no lucro e na competição seus fundamentos. Que educar é – citando Gramsci – colocar fim à separação entre Homo faber e Homo sapiens; é resgatar o sentido estruturante da educação e de sua relação com o trabalho, as suas possibilidades criativas e emancipatórias. E recorda que transformar essas ideias e princípios em práticas concretas é uma tarefa a exigir ações que vão muito além dos espaços das salas de aula, dos gabinetes e dos fóruns acadêmicos. “ (apresentação de Ivana Jinkings, p.9)

“(...)Se no pré-capitalismo a desigualdade era explicita e assumida como tal, no capitalismo – a sociedade mais desigual de toda a história - , para que se aceite que “todos são iguais diante da lei”, se faz necessário um sistema ideológico que proclame e inculque cotidianamente esses valores na mente das pessoas.
No reino do capital, a educação é, ela mesma, uma mercadoria. Daí a crise do sistema público de ensino, pressionado pelas demandas do capital e pelo esmagamento dos cortes de recursos dos orçamentos públicos. Talvez nada exemplifique melhor o universo instaurado pelo neoliberalismo, em que “tudo se vende, tudo se compra”, “tudo tem preço”, do que a mercantilização da educação. Uma sociedade que impede a emancipação só pode transformar os espaços educacionais em shopping centers, funcionais à sua lógica do consumo e do lucro.” (prefácio de Emir Sader, p.16)

“(...) Tendo em vista o fato de que o processo de reestruturação radical deve ser orientado pela estratégia de uma reforma concreta e abrangente de todo o sistema no qual se encontram os indivíduos, o desafio que deve ser enfrentado não tem paralelos na história. Pois o cumprimento dessa nova tarefa histórica envolve simultaneamente a mudança qualitativa das condições objetivas de reprodução da sociedade, no sentido de reconquistar o controle total do próprio capital – e não simplesmente das personificações do capital que afirmam os imperativos do sistema como capitalistas dedicados – e a transformação progressiva da consciência em resposta às condições necessariamente cambiantes. Portanto, o papel da educação é soberano, tanto para a elaboração de estratégias apropriadas e adequadas para mudar as condições objetivas de reprodução, como para a automudança consciente dos indivíduos chamados a concretizar a criação de uma ordem social metabólica radicalmente diferente. É isso que se quer dizer com a concebida “sociedade de produtos livremente associados”. Portanto, não é surpreendente que na concepção marxista a “efetiva transcendência da autoalienação do trabalho” seja caracterizada como uma tarefa inevitavelmente educacional.
A esse respeito, dois conceitos principais devem ser postos em primeiro plano: a universalização da educação e a universalização do trabalho como atividade humana autorrealizadora.(...)”(István Mészáros p.65)

(...) a globalização do capital não funciona nem pode funcionar. Pois não consegue superar as contradições irreconciliáveis e os antagonismos que se manifestam na crise estrutural global do sistema. A própria globalização capitalista é uma manifestação contraditória dessa crise, tentando subverter a relação causa/efeito, na vã tentativa de curar alguns efeitos negativos mediante outros efeitos ilusoriamente desejáveis, porque é estruturalmente incapaz de se dirigir às suas causas.
A nossa época de crise estrutural global do capital é também uma época histórica de transição de uma ordem social existente para outra, qualitativamente diferente. Essas são as duas características fundamentais que definem o espaço histórico e social dentro do qual os grandes desafios para romper a lógica do capital, e ao mesmo tempo também para elaborar planos estratégicos para uma educação que vá além do capital, devem se juntar. Portanto, a nossa tarefa educacional é, simultaneamente, a tarefa de uma transformação social, ampla e emancipadora. Nenhuma das duas pode ser posta à frente da outra. Elas são inseparáveis. A transformação social emancipadora radical requerida é inconcebível sem uma concreta e ativa contribuição da educação no seu sentido amplo...”(István Mészáros p.76)



Fuca CGPP

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Um Grão de Trigo - Ngugi wa Thiong'o - breve nota

"Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo que cai na terra não morrer, permanecerá só; mas se morrer, produzirá muito fruto. - João 12,24
(versículo sublinhado em preto na Bíblia de Kihika)"

Kihika, um grande combatente nas lutas pela Independência do Quênia nos fins dos anos 50. Nome proeminente no caminho da conquista da Uhuhu sofreu uma emboscada e foi assassinado. Mas quem teria sido o traidor? O autor perpassa de forma literária o difícil processo de libertação anticolonial, são vários personagens alocados a maioria em aldeias ou em posição de guerra na floresta, e os brancos comandando em suas grandes casas. Eis que chega então o dia tão esperado da comemoração e consolidação da Uhuru com todas as suas expectativas, medos, traições, surpresas e honrarias. Vale a pena mergulhar nesse cenário queniano através desses escritos de Ngugo wa Thiong'o publicado originalmente em 1967.

"Ngugi wa Thiong'o nasceu em Limuru, Quênia, em 1938. É romancista, ensaista, dramaturgo e um dos principais escritores e estudiosos africanos em atividade. Seu primeiro romance, Weep Not, Child, foi publicado em 1964, enquanto estudava na Inglaterra. Em 1977, ele escreveu uma peça teatral que contrariou o governo do Quênia e acabou preso por mais de um ano pelo regime ditatorial.
Um grão de trigo (1967) é o seu terceiro romance. As obras posteriores incluem Petals of Blood (1977), Wizard of the Crow (2006) e uma trilogia de memórias. Vive atualmente nos Estados Unidos, onde é membro da American Academy of Arts and Letters e professor da Unidade da Califórnia, em Irvine."



Fuca CGPP

sábado, 19 de janeiro de 2019

As Andorinhas, Paulina Chiziane – breve nota

As Andorinhas, Paulina Chiziane – breve nota 


Com uma narrativa literária de luta, ler o livro “As Andorinhas” vem como se estivesse ouvindo as histórias e ensinamentos de uma mais velha numa conversa frente a frente. Contendo três contos que abordam cada qual a sua maneira a caça ou a liberdade das andorinhas. No primeiro conto, ”Quem Manda Aqui?”, um imperador gordo, arrogante e ditador resolve querer silenciar as andorinhas e acaba desguarnecido e sofre a invasão dos brancos. No segundo, “Maundlane, O Criador”, trata de uma grande história e vários ensinamentos ao relatar a trajetória de um exímio guerrilheiro. E por fim, conta-se a história de “Mutola” utilizando o causo da águia e da galinha. Assim essa excelente escritora nos aproxima das vivências de libertação Moçambicana, e é evidente a valorização da importância feminina em suas narrativas, por vezes, a mulher é a grande sábia, é a que detém o controle familiar, e útero é sempre bom adjetivo. Um livro fino, de 125 páginas, então não há desculpas para não lê-lo, e fica a indicação! Pra se mergulhar cada vez mais na literatura africana!



Fuca - 2019


Infos no livro: 

“A escritora Chope, filha de um alfaiate e de uma camponesa dona de casa, usa o seu poder de contadora de histórias para partilhar o percurso de três personalidades, desafiando o leitor com um debate sobre o passado e o presente de Moçambique.”

"Pauline Chiziane nasceu em Manjacaze (Moçambique) em 1955. É reconhecida como a primeira mulher moçambicana a escrever um romance. Internacionalmente, revela-se como uma das mais renomadas escritoras africanas e a maior romancista negra dos países de lingua portuguesa. É constantemente convidada para conferências de arte, direitos humanos e literatura em diferentes países.
Em reconhecimento ao seu trabalho militante pela justiça e igualdade, foi nomeada, pelo One Thousand Peace Women (Movimento Internacional de Paz), uma das mil mulheres pacificas do mundo, além de indicada ao Prêmio Nobel da Paz (2005)."


quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

História da África, José Rivair Macedo – Breve Nota

História da África, José Rivair Macedo – Breve Nota

Com o objetivo de suprir cada vez mais a carência de um estudo mais apurado sobre a história e trajetória africana, driblando os estereótipos, preconceitos e perspectivas enviesadas, este livro desvela um conjunto panorâmico de material didático sobre o continente africano.

O conteúdo contido no livro perpassa uma história africana seguimentada desde a pré-história, as primeiras civilizações e impérios, islamização, cristianismo, escravidão, colonialismo, até a descolonização e o tempo presente.

No capítulo 1 o autor descreve as formas geológicas do continente, como e onde os minerais estão alocados, remonta ao período da pangeia e argumenta o porquê da África ter sido o local da primeira evolução humana, a hominização. Se por volta de 150 milhões passaram os dinossauros, há cerca de 70 milhões de anos surgiram os primeiros mamíferos. Já há 12 milhões de anos os primatas, Autralopithecus, homo habilis viveu por volta de 1,5 milhão de ano atrás. Depois veio o período Paleolítico (Idade da Pedra Lascada), o período Mesolítico (15 a 12 mil anos), e o Neolítico. Desertificação e Civilização Nok.

Com o argumento de que no Brasil se tem uma imagem única do continente africano, o autor visa discorrer através das diversidades entre regiões, e mesmo que em cada região habitem povos diferentes entre si, se aposta numa similaridade no conjunto de vivência.

No segundo capitulo é retratada a história do Norte da África, a civilização egípcia, os povos da Núbia e do Indico e mais em direção ao centro-sul, perpassa brevemente pelas cidades Suaíli. Já no terceiro capitulo será tratado o eixo transaariano, que agora se apresenta um ambiente desértico e de savana abarcando todo o desenvolvimento de grupos humanos a viverem num meio inóspito. Neste capítulo trata muito mais da consolidação islâmica na história da África, e se atem, também, na descrição de alguns dos grandes impérios, tais como Mali e Songai.

O Mundo Atlântico, capitulo 4, é relatado como se deu as mudanças devido à influência europeia desde o período do século XVI, envolve descrições sobre a região de Senegal e Golfo da Guiné, de Gana, do Congo e Angola, e da África do Sul. Onde se mostra sobre as formas de governo bem hierarquizadas, além de uma crescente tendência a militarização a partir do contato e presença europeia.

Os próximos capítulos têm por objetivo fazer uma avaliação histórica sobre algumas implicações do tráfico de escravizados, e da condição colonial.

No último capitulo, portanto, o autor traz informações sobre os movimentos de descolonização e independência de vários países no continente africano, é neste momento apenas que se confere, no livro, certa unidade enquanto continente, também a influência dos pensamentos e ações da diáspora africana. Ao distinguir entre independência conquistada e independência concedida, se passa também ao estilo político adotado nos Estados pós-coloniais, o que Kwame Nkrumah conceitua como Neocolonialismo, pois se mantêm arraigadas as influências das antigas metrópoles nesses Estados.

“Assim, embora nominalmente independentes, estes países continuam a viver na relação clássica da colônia com seu “patrão” metropolitano, isto é, a produzir matérias-primas e a servir-lhes de mercado exclusivo. A única diferença é que agora essa relação está encoberta por uma aparência de ajuda e solicitude, uma das formas mais subtis do neocolonialismo. Como a França considera que só se poderá desenvolver perpetuando a sua relação atual com os países subdesenvolvidos que se mantêm na sua orbita, isto significa que o fosso entre aquela e estes se irá alargando. Para que este possa vir a ser diminuído, ou mesmo anulado, será necessário renunciar completamente à atual relação de patrão cliente” (p.166) 

Enfim, o enfoque do autor foi de colocar o continente africano como detentor de sua própria história e produtor de suas próprias formas materiais de existência, principalmente antes das invasões. Lógico, como mencionado no inicio, tudo de forma panorâmica e deixa muitas outras questões e abordagens de fora, mas que serve como resumo base para o ensino didático nas escolas. Além de conter sugestões de leituras e videos para maior aprofundamento na questão.

Fuca - 2019


sábado, 5 de janeiro de 2019

Planeta Favela, Mike Davis – Breve nota


Planeta Favela, Mike Davis – Breve nota

  Planeta Favela é um livro que evidencia a degradação humana nos espaços favelizados que operam como lugares de reprodução da pobreza. A denúncia é contundente e visa abarcar os fatos mais concretos do que se prender em conceitos, quebra de paradigmas ou até mesmo desenvolver hipóteses, conceitos ou teorias que possam reverter o quadro desastroso da favelização mundial. A ênfase, na verdade, se atem nos países do Terceiro Mundo que sofrem toda carga que se precisa ter para alimentar a ideologia liberal dos países capitalistas desenvolvidos.

  O conteúdo é tão critico que se torna difícil enxergar luz no fim do túnel para quem vive em favelas, por outro lado, é disso que provem o êxito e a riqueza para instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial, que devido a divida externa impõem os Planos de Ajuste Econômico (PAE) aos países que não conseguem pagar os empréstimos, pois os juros são altos e assim essas instituições passam a controlar politicamente esses territórios.

  Dentro dos desastres provocados pela globalização neoliberal para os pobres do Terceiro Mundo, o autor expõe vários tópicos degradantes que vão desde guerras, desemprego, precarização de trabalho, segregação, racismo, superurbanizações seguidas de expulsões, enchentes, deslizamentos de casas, incêndios criminosos em favelas, lixo, poluição atmosférica, contaminações, caos no transito de transportes, crise sanitária, escassez de recursos naturais, etc.

  Para alocar devidamente no tempo, tudo isso é datado basicamente desde pelo menos o final do século XX. Interessante que entre as décadas de 1960 e 1980, os países do terceiro mundo chegaram a crescer e nesse período ainda não se tinha a orientação das políticas neoliberais do FMI. Vale frisar que em países de passado colonial a estrutura desigual já existia, seja em explorações de bens naturais e de mão de obra barata, na segregação espacial ou na pobreza, mas a globalização e as políticas neoliberais trataram de acelerar e intensificar a escala da pobreza urbana nos países subdesenvolvidos.

  No capitulo um, O Climatério Urbano, Mike Davis traz diversas analises baseadas em estudos e dados que tratam acerca da urbanização dos países e cidades do Terceiro Mundo. Chega-se na primeira constatação: a explosão da urbanização. Outra situação é que a alta da urbanização em diversas cidades da África, America do Sul e Ásia, ocorreu num cenário de desindustrialização, então esse crescimento populacional não significava desenvolvimento, mas sim a manutenção da pobreza. O autor já nos aponta neste primeiro capitulo que o sistema econômico neoliberal do FMI e do Banco Mundial são os causadores direto desse cenário.

  Se essa urbanização desgovernada faz parte da manutenção da pobreza, a favelização e todo tipo de ocupação e moradia informal se torna tendência nesses territórios. Outro fator é a questão do advento do crescimento de cidades nos campos, em alguns casos já não há o êxodo rural, mas a urbanidade atinge os modos de vida do campo, fato praticamente inevitável devido o período da globalização.

  A Generalização das Favelas, segundo capitulo, vai abordar os espaços periféricos já que em algumas cidades a urbanização significa favelização, pois abrange mais da metade do território, e de urbanização irregular. Retrata a questão das ocupações (no livro apresenta a palavra invasão), em quais condições elas ocorrem, e como são organizadas, destruídas e montadas novamente. Evidencia brevemente que a saída em ocupar terrenos marginalizados pelos despossuídos, nem sempre é a medida mais barata, levando em consideração a peleja das lutas que serão necessárias travarem pela sobrevivência, mas que ao longo do tempo esse “valor” pode ser recuperado a partir de uma estruturação crescente nesses espaços. Dentro desse subtópico existe a questão da “privatização das invasões”, onde antes de ocupar é necessário pagar para políticos poderosos (as vezes através de votos), loteadores (pessoas de poder local), latifundista ou grande fazendeiro, comuna rural, etc. Culminando no subtópico seguinte que é a invisibilidade do locatário na favela que alcançou uma modesta base inferior na estratificação dessa classe pobre, e devido a falta de organização fica a mercê dos alugueis. O autor aponta que esse é um meio de exploração de pobre sobre um mais pobre.

  O terceiro capitulo desvela A Traição do Estado, que inicia com a citação de Alan Gilbert e Peter Ward, “Embora o capitalismo irrestrito tenha uma face em geral inaceitável, o Estado corrupto que age em favor dos ricos é ainda pior. Em tais circunstâncias, pouco há a ganhar com a simples tentativa de melhorar o sistema.” Então se mostra nessa parte do livro as formas que o Estado atuou de maneira excludente, negligente e foi omisso em buscar reverter as condições de favelização e proliferação da pobreza, que, por conseguinte aparece As Ilusões de Auto Ajuda, onde agora o próprio Banco Mundial investe em desenvolvimento urbano e assim coopta algumas ONG’s que focam em ações de curto prazo com pequenas proporções distanciando a sociedade civil organizada e os pobres de uma consciência de classes e de uma busca plena por seus direitos.

  Aqui o autor critica a aliança do arquiteto John Turner com o presidente do Banco Mundial na qual o saldo foi de que os benefícios dos projetos oriundos desse “casamento” acabaram nas mãos da classe média, os mais pobres ficaram fora do projeto novamente. E vai criticar também a tomada de medidas rápidas e simplistas tais como a de Hernando de Soto, o guru global do populismo neoliberal, ao apenas adotar como estratégia a concessão de titulo de propriedade em invasões.  

“Os empréstimos do Banco Mundial para o desenvolvimento urbano aumentaram de meros 10 milhões de dólares em 1972 para mais de 2 bilhões de dólares em 1988. E, entre 1972 e 1990, o Banco ajudou a financiar um total de 116 programas de oferta de lotes urbanizados e/ou de urbanização de favelas em 55 países. É claro que em termos de necessidade isso não passou de uma gota num balde d’água, mas deu ao Banco enorme influência nas políticas urbanas nacionais, além de uma relação de patrocínio direto com as ONGs e comunidades faveladas locais; também permitiu ao Banco impor as suas próprias teorias como ortodoxia mundial da política urbana”.

  Nos últimos capítulos é versado mais profundamente sobre as formas como são postas os Planos de Ajuste Econômico (PAE), a precarização do trabalho ao desvendar o mito da informalidade como saída do desemprego, os riscos físicos vividos de fato em muitas das favelas em todo o mundo e o trabalho infantil. Ainda, o crescimento do pentecostalismo em alguns países extremamente vulneráveis onde se tem uma via de humanidade excedente.

“Em vez das cidades de ferro e vidro, sonhadas pelos arquitetos, o mundo está, na verdade, sendo dominado pelas favelas.”


Fuca cgpp 2019