Apresentação do Livro Coleção Pensamento Preto 5 – 2021 [Fuca]
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Coleção Pensamento Preto vol. 5 |
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Já transcorremos um quinto do século 21, e a indagação contínua e sempre pertinente é a de: qual a direção que o povo preto está tomando?
Essa pergunta podemos fazê-la no âmbito doméstico de
diáspora africana em que nos encontramos, como globalmente e sobretudo de olho
no continente-mãe, África. A despeito de qualquer tipo de avanço individual ou
de uma certa classe minúscula de uma burguesia negra, na ótica de povo como um
todo, como nos encontramos no cenário mundial?
Dentre tantas questões que pairam em nosso dia a dia,
escolher uma em um cenário de crise global, - de trabalho, de terra, de
soberania alimentar, de habitação, de perspectiva em geral, e para agravar, sob
uma pandemia mundial,- é uma tribulação em si. Que o sistema capitalista vigente
vive em crise não deve ser novidade, pois, de fato, o baluarte do capitalismo
se dá justamente pela manutenção das desigualdades sociais; o capitalismo se
promove através de um desenvolvimento geográfico desigual 1 [e combinado,]
independentemente de sua reinvenção nos processos de acumulação do capital ao
longo dos tempos. Tal sistema em si já é um monstro e tanto, sobretudo para o
nosso povo, pois o capitalismo é filho da Europa, e sua gênese remete às
brutalidades do sequestro, do tráfico transatlântico e do comércio de africanos
escravizados por 400 anos.
E não parou por aí, os europeus ainda impuseram a colonização
do continente africano, configurando, principalmente, um embate civilizatório
entre a Europa e os “Outros”. Se eles detinham motivações econômicas, eles também
estavam imbuídos de uma pretensa supremacia branca. Em sua empreitada, o lema
‘nenhuma piedade’ era o que prevalecia, até devido a isso nenhum tipo de luta
do nosso povo deve fazer apelo moral aos brancos, pois tudo isso não foi (e nem
é) um problema para eles. Ao lidarem e promoverem a barbárie, apenas era
necessário justificarem suas ações, e a manipulação estava pronta: levar o
progresso e a civilização aos “selvagens” e “atrasados” – os “outros”.
Os estudos mais detalhados e clássicos acerca desse período
de terror contra o povo preto, se encontram neste livro. Ademais, através da
bibliografia da Coleção Pensamento Preto:
Epistemologias do Renascimento Africano, em seus cinco volumes, é
apresentado a evolução histórica da supremacia branca e suas
invasões/conquistas por meio da destruição e interrupção do processo histórico-social
preto-africano. Esse é um dos pontos que é possível compreender ao imergirmos
nas diversas possibilidades de diálogos, que serão elencados aqui (parte deles)
mais para frente.
Sobrevivemos a tudo isso, - “o maior milagre de todos os
tempos!” - tivemos muitos lutadores e
lutadoras do nosso povo preto que ao longo dos séculos nunca apanharam calados,
nunca aceitaram a subjugação dos nossos e por isso estamos aqui lutando hoje. Em
deferência aos nossos irmãos e irmãs que preservaram nossa cultura através da
religião africana, através das artes africanas, através dos clubes recreativos,
associações e organizações comunitárias, ou de outra forma, através dos nossos
quilombos físicos e ideológicos; 2 e dos pretos que se lançaram para contar,
registrar e espalhar a nossa história sob o viés preto e de nossa luta pela
vida. Motivados sobretudo pelo amor que mantiveram pela humanidade preta.
Agora, o que está implícito na questão inicial é justamente
que precisamos fazer algo a mais como luta, outro tipo de projeto com mais
propósito, que acaba desencadeando em outras perguntas: como podemos de alguma
forma unir as várias frentes pretas na direção de uma construção genuinamente
preta? A construção da nação preta. Como bem disse o irmão Robert Sobukwe, “Nunca
poderemos fazer o suficiente pela África, nem poderemos amá-la o suficiente.
Quanto mais fazemos por ela, mais queremos fazer.” Ou seja, é pelo amor aos
pretos que devemos nos direcionar pela autodeterminação preta. Uma busca, um
projeto, um destino declarado pelo Renascimento Africano. 3
Para pensar numa direção preta precisamos estar cientes dos
nossos interesses enquanto povo e dos interesses dos outros em relação a nós.
Quando falamos de interesse (ou mesmo agência) já recai uma grande dificuldade,
pois para isso é preciso pensarmos e nos enxergarmos enquanto um povo em
potencial principalmente pela cor da pele/fenótipo africano. Se não mais nos
vemos enquanto povo é devido ao histórico mais recente de escravidão e
colonização, e não tem como subestimar os esforços dos brancos nesse
empreendimento sujo e nefasto – ou como caracteriza o Dr. Du Bois, “a mancha
mais desprezível na história humana moderna”.
Portanto, ao nos livrarmos das brutalidades dos açoites,
ainda carecemos da libertação da mente, então, em suma, uma das faces da relevância
das epistemologias do renascimento africano é a descolonização mental, e nesse
quesito a coleção pensamento preto fornece subsídios fundamentais de forma
coesa e estabelecendo diálogos na dialética africana como um dos métodos, e
promovendo uma ligação de continuidade de pensamentos, propostas, paradigmas,
ações, etc. Que não só visa resgatar os
conhecimentos que não deveriam chegar até os pretos, mas que pretende não
confundir o povo preto, e sim propor a leitura e análise crítica para o
prosseguimento de nossos objetivos revolucionários enquanto povo preto, esforços
que são conectados através da Revolução Preta Mundial 4 rumo ao Renascimento
Africano.
Esses são conceitos fundamentais que evidenciam a direção de
luta, que mostram a importância de ideologias, filosofias, pesquisas e teorias das
ciências humanas e sociais que visem abarcar a particularidade preta e minar as
confusões atiradas em toneladas pelos supremacistas brancos. O Dr. John Henrik Clarke
neste volume vai nos dizer que: “Os povos Africanos de todo o mundo precisam de
uma definição de história que possa
ser operacional em diferentes lugares, em diferentes momentos e operacional em
todos os lugares onde vivem os africanos. Por sermos as pessoas mais dispersas
da face da Terra, nossa definição operacional de história deve ter um alcance
universal, aplicável às pessoas em geral e especificamente ao povo Africano.”
Essa definição deve estar calcada no próprio continente africano. Os pretos
diaspóricos devem e necessitam lutar em seus respectivos territórios [inimigos],
porém a base de luta é a África, da África fomos sequestrados; a África é nossa
base civilizatória, ser africano é um privilégio e onde quer que desembarcássemos
através da migração forçada, nossa luta foi constante pela liberdade, nossa
resistência cultural foi imensa, não à toa um extenso aparato de destruição
física e cultural foi desenvolvido pelos brancos para cometer o maior crime
contra um grupo de seres humanos, o holocausto dos pretos, 5 sem misericórdia. O
único continente que é a casa dos pretos é o africano, a vida em diáspora, muitas
vezes, fará com que ocorra um distanciamento dos pretos em relação a sua casa,
consubstanciado pelas campanhas das mídias em massa e da educação racista.
Por isso, como o irmão Malcolm X adverte certeiramente neste
livro, “qualquer tipo de organização baseada aqui não pode ser uma organização
eficaz. Qualquer coisa que você tenha a seu favor, se a base estiver aqui, não
será eficaz. Sua e minha base devem estar em casa, e esta não é a nossa casa.” Veja
bem, nosso irmão trouxe a perspectiva de um preto em diáspora nos EUA, e a
despeito de particularidades existentes entre os Estados-nações em que os
pretos se encontram, “a mancha mais desprezível na história humana moderna”, o
colonialismo, o imperialismo, o neocolonialismo, o capitalismo, a destruição
promovida pela supremacia branca é comum a todos os pretos no globo,
infelizmente esse genocídio contínuo é ainda um fio condutor para a
internacionalização da luta preta moderna. Obviamente, vem de tempos imemoriais
os laços básicos de Unidade Cultural Africana, mesmo em um continente extenso,
rico e diverso em cultura, línguas, grupos étnicos, etc.
E sobre essa Unidade Cultural da África Negra, a Dra. Lélia
Gonzales, através de uma entrevista bem acurada e livre ao mesmo tempo, vai
explicar a importância do trabalho e das pesquisas de Cheikh Anta Diop nesse
campo; a Dra. Ifi Amadiume segue na mesma linha de tema, porém enfatizando o
aspecto fulcral do matriarcado africano para a teoria da Unidade Cultural
Africana. Por falar em matriarcado africano neste livro, nos remetemos também
ao belo texto da irmã Ayana Omy, “O nascimento de uma comunidade.”
Dá para notar a diferença entre nosso interesse como povo
preto-africano com o de qualquer outro povo? E a menos que estivermos
estabelecido nossa bases de Nacionalismo Preto/Pan-Africanismo não há o que
falar em lutar pelo interesses de outros povos, outras ideologias, filosofias,
teorias e organizações. Os nossos desafios já são imensos, pois precisamos
organizar a renascença africana numa perspectiva de longo prazo, e além da
organização teremos o tensionamento das forças inimigas com todo o aparato que
eles já demonstraram ser capazes de desferir por poder. Nossa ancestral, jornalista,
organizadora e ativista Amy Jacques Garvey vai nos alertar aqui que: [os]
“Homens no poder não clamam por orações ou apelos à consciência. Eles só
respeitam a FORÇA igual à sua ou superior.”
Mais uma vez, em outras palavras, os interesses dos pretos
sérios na luta devem ser pelo Poder, pela Terra, se valendo da Força oriunda de
um Pan-Africanismo, no âmbito militar, econômico, cultural, industrial,
cientifico, espiritual e político. O Dr. Clarke conclui: “A terra é a base da
nação. Não há como construir uma nação independente e forte quando a maior
parte da terra está sendo controlada por estrangeiros que também determinam o
status econômico da nação. Os Africanos precisam estudar seriamente seus
conquistadores e seus respectivos temperamentos. Nem os europeus, nem os
árabes, vieram à África para dividir o poder com nenhum Africano. Ambos vieram
como convidados, mas permaneceram como conquistadores.”
***
Na disciplina geográfica
este volume vai contribuir através dos textos de Malcolm X, Du Bois, Queen
Mother Moore [ressaltando a importância da terra], Stokely Carmichael, e é muito
interessante o papel que o espaço geográfico tomou através desses estudos,
analises e falas. A geografia sendo ela mesma a síntese de várias outras
disciplinas assume seu lugar não só na vertente meramente descritiva, mas com
uma perspectiva ativa e crítica. No próprio Dr. Du Bois a abordagem do espaço
está incrustada numa análise sociológica.
Em suma, é evidenciada a
importância da África não só pelo o que o continente produziu e desenvolveu por
si mesmo, mas como também o que outros povos e impérios produziram em cima da
África, ou baseado no continente africano.
Decerto, essa ideia contrapõe a visão determinista e racista de que nada
nunca havia sido produzido na África, que nunca houvera civilização africana
até a invasão europeia. A riqueza de detalhes do estudo do Dr. Du Bois faz dele
um texto ainda mais indispensável.
Na disciplina antropológica
temos contribuições precisas, com quebra de paradigmas e a própria
problematização da antropologia como ciência. A Dra. Iva E. Carruthers ao evidenciar
que o sistema de gestão da educação branca [séculos XIX e XX] comandado pelos
liberais abolicionistas brancos ou pelos conservadores que apregoavam a
perpetuação da escravidão nos EUA, concluiu que ambas as vertentes estavam
ancoradas na pretensa supremacia branca, só diferiam na forma de alcançá-la –
ou com uma atitude de segregação declarada ou de um paternalismo moderador. Com
isso, em seu texto de 1977, ela apontou também para a necessidade crucial de
estudar o comportamento dos brancos, uma espécie de antropologia reversa, já
que a antropologia tem como objetivo estudar os “outros.” A Dra. Ifi Amadiume
vai propor que seja abolida essa disciplina de antropologia, ao invés disso
deveria se consolidar uma disciplina da história
social africana. Mas, neste livro, foi a Dra. Marimba Ani quem contribuiu
com um estudo avassalador sobre a concepção branca de sua autoimagem e da
imagem dos “Outros.” Nesse estudo, publicado em 1994, a Dra. Marimba Ani vai
desvelar que a essência cultural do Ocidente é de destruição, uma completa
desarmonia com o mundo. Sendo assim, seu ethos
e seu pensamento, seu comportamento e sua imagem, estarão relacionados
consistentemente uns com os outros, ou seja, agem em compatibilidade para
forjar um constructo ideológico particular e concernente da cultura europeia
(brancos). Em linhas gerais, a autoimagem europeia necessita da inferiorização
da imagem dos “outros,” no intuito de consolidar a supremacia branca. A irmã
diz: “Nenhuma etnologia da cultura europeia pode, com honestidade, ignorar o
significado da cor na mente dos europeus.” E não será agora que poderá ser
ignorado. Portanto, nesse sentido, a antropologia e o cristianismo, por
exemplo, seriam o sustentáculo da supremacia branca.
Na área da educação
teremos a entrevista da saudosa ativista africana-americana Queen Mother Moore -
reforçando a oralidade africana como metodologia de estudo – trazendo aspectos
da busca pela educação na américa racista e segregada numa base vivida e
empírica, fortalecendo a compreensão do estudo trazido pela Iva Carruthers e
vice-versa. Abarcando a Guerra Civil americana, o período de reconstrução,
restauração, Jim Crow, a luta pelos direitos civis, etc. Ainda, para esse
período, o estudo do Professor Mestre Fábio Mandigo traz para o contexto dos
pretos no Brasil a disposição de um quadro de análise em três paradigmas pretos
em conflito, de três movimentos africano-americanos na condução de Booker T.
Washington, Du Bois e Marcus Garvey.
A educação em qualquer lugar está a serviço das instituições
de um determinado Estado-nação, agora se tal nação detém um passado escravista
e colonialista sem que se tenha tido nenhum tipo de revolução preta, inferimos
que esse sistema educacional é racista. Portanto, uma educação no Brasil e tão
racista quanto nos EUA, mesmo que resguardada as devidas particularidades.
Robert Sobubwe em seu discurso no Colégio Fort Hare enfatizou
diretamente o sentido da educação africana: “Você já viu o que a educação
significa para nós: a identificação de nós mesmos com as massas. Educação para
nós significa serviço à África. Em qualquer ramo de aprendizagem que você
esteja, você está lá para a África. Você tem uma missão; todos nós temos uma
missão. Temos uma nação para construir.” Em acréscimo, uma citação do Dr.
Clarke diz: “O papel da educação é treinar o aluno para ser um manuseador
responsável do poder”.
***
Desse modo, para que um povo de passado colonial tenha um
destino apropriado com seus interesses (agência), as epistemologias pretas
devem estar a serviço da descolonização mental, - uma das etapas iniciais. O
ancestral Malcolm X sabendo dessa problemática questionou os motivos de a
conquista da liberdade para o povo preto sempre ter sido mais difícil. Como
povo, carecemos da libertação da mente, isso influi nos programas e métodos em
que lutamos, quase nunca de longo prazo e nem cristalizados em uma ideologia
própria. Em seu discurso, o irmão Malcolm continua: “temos ainda de aprender as
táticas, estratégias ou métodos adequados para trazer a liberdade à
existência... Portanto, o que gostaríamos de fazer nas noites de domingo é
entrar em nosso problema e apenas analisar e analisar e analisar; e questionar
coisas que vocês não entendem, para que possamos, pelo menos, tentar obter uma
visão mais nítida do que vamos enfrentar.”
O ex-presidente da Guiné, Sékou Touré, em um trecho de sua
dialética da cultura, complementa essa lógica, para ele o povo africano precisa
se “comprometer a reconquistar sua própria personalidade, negando os valores
culturais que o despersonalizaram, descolonizando sua própria mente, seus
costumes e suas atitudes, desmontando os sistemas filosóficos que justificam as
dominações...” E continua, [a] “...luta pela liquidação dos vários complexos do
homem colonizado, não se dissocia da fase seguinte – a da reconquista dos
valores perdidos, dos bens negados e perdidos, atributos de um homem sensível
que pensa e age de forma digna e ciente de suas potencialidades.”
Para Sékou Touré a cultura se vale como arma de libertação,
e a define como sendo: “...todas as obras materiais e imateriais de arte e
ciência, mais conhecimento, boas maneiras, educação, um modo de pensamento,
comportamento e atitudes acumuladas pelo povo tanto através como em virtude de
sua luta pela liberdade da posse e do domínio da natureza; ... Assim, a cultura
é revelada como uma criação exclusiva do povo e uma fonte de criação, como um
instrumento de libertação socioeconômica e de dominação.” Uma abordagem
dialética da cultura é um texto muito importante no sentido de não abordar a
cultura por um culturalismo esvaziado, ou seja, em negação do materialismo
histórico e dialético.6
Sékou Touré vai discorrer, em suma, sobre a relação da busca
material e que para se fazer tal busca é necessário um conjunto de ideias. Ou
seja, mesmo obtendo a primazia do bem-estar material para então se obter o
desenvolvimento intelectual, este último se faz necessário na busca das
necessidades físicas. “O curso da história e a sucessão do desenvolvimento da
cultura Africana refletiram de perto o curso do desenvolvimento das forças
produtivas.” Sendo que, as emoções e mesmo os reflexos em um dado momento
histórico são fundamentalmente postos em movimento pela razão, a fim de
alcançar objetivos bem definidos.
***
Irmãs e irmãos, procurei apresentar alguns tópicos dentre
tantos existentes, espero que possamos perceber como está implícito um modo
africano de lidar com os campos científicos, ou seja, a busca de pesquisas e análises
interconectadas e interdisciplinares, 7 não
como caixinhas extremamente fragmentadas. Por fim, o foco da questão inicial pode
mais uma vez ser visto em mais essa citação do Dr. Clarke: “No novo interesse
no Pan-Africanismo que está ganhando força em todo o mundo Africano, a intenção
dos Africanos não é apenas mudar sua definição na história do mundo, mas também
mudar sua direção. A esperança deles é que o Pan-Africanismo se espalhe para
além de sua estreita base intelectual para se tornar a motivação para uma União
Mundial Africana. Isso começará quando reconhecermos que não somos ‘de cor’,
‘negros’ ou ‘pretos’. Somos um povo Africano onde quer que estejamos na face da
terra.”
Desejo-lhes boa leitura! Um forte Abraço! Axé!
Notas:
1. Sobre esse
conceito, ver David Harvey, “Crise na economia espacial do capitalismo: a
dialética do imperialismo”, em Os limites
do capital. São Paulo: Boitempo, 2013 (pp. 599-641, edição e-book),
conceito adaptado a partir do ‘desenvolvimento desigual e combinado’ de Leon
Trotsky... mas vale e deve lembrar que os nossos próprios pensadores pretos vão
desenvolver aqui mesmo nesse livro as relações de enriquecimento da Europa e
seus satélites sobre a pilhagem e subdesenvolvimento do continente africano e
dos povos indígenas, através do roubo da força de trabalho, dos bens
naturais/minerais e da terra desses povos. Contudo, falar sobre o
desenvolvimento geográfico desigual é se opor ao dito determinismo geográfico,
em outras palavras, ao invés do determinismo se existe condições que foram
determinadas, ainda que existam as diferenças (de espaço, humanas e sociais) as
desigualdades foram e são produzidas por um dado sistema. Ver também Walter
Rodney, Como a Europa subdesenvolveu a
África. Lisboa: Seara Nova, 1975.
2. Como aponta
nossa ancestral, quilombola e intelectual Beatriz Nascimento: “No final do
século XIX, o quilombo recebe o significado de instrumento ideológico contra as
formas de opressão. Sua mística alimentar o sonho de liberdade de milhares de
africanos e seus descendentes escravizados (p. 289) ... A retórica do quilombo,
a análise deste como sistema alternativo, serviu de símbolo principal para a
trajetória deste movimento. Chamamos isso de correção da nacionalidade: a
ausência de cidadania plena e de canais reivindicatórios eficazes, a
fragilidade de uma consciência brasileira de povo, todos esses fatores
implicaram numa rejeição do que era então considerado nacional e dirigiu esse
movimento para a identificação da historicidade heroica do passado.” (p.291).
Ver Beatriz Nascimento – Quilombola e
Intelectual: Possibilidade nos dias da destruição. Diáspora Africana:
Editora Filhos da África, 2018.
3. Em O Pan-Africanismo: apontamentos e reflexões,
de Abiṣogun
Ọlátúnjí
Odùduwà, é revelado que, “O conceito de renascença africana ou renascimento
africano foi proposto e elaborado por Cheikh Anta Diop em uma série de ensaios
produzidos a partir de 1946 e, posteriormente, organizados em uma obra única
com o título Towards the African
Renaissance: Essays in Culture and Development, 1946-1960. Londres: Espólio
Cheikh Anta Diop; Karnak House; 1996... O renascimento africano, para Cheikh
Anta Diop, seria uma série de ações políticas, culturais, intelectuais,
econômicas e militares que tinham como objetivo o fortalecimento das pessoas
pretas e do continente africano, assim como a construção dos Estados Unidos da
África, nas estruturas do pan-africanismo” (Editora Filhos da África, 2019,
pág. 11). Ver também Cheikh Anta Diop, “Quando podemos falar de um renascimento
africano?”, em Coleção Pensamento Preto:
Epistemologias do renascimento africano, volume IV. Diáspora africana:
Editora Filhos da África, 2020 (pp. 128-138).
4. Ver: ODÙDUWÀ, Abisogun Olatunji. Às Irmãs: Mulheres africanas na revolução
preta mundial. Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2019.
"Como revolução preta mundial entendemos todas as movimentações realizadas
por seres humanos pretos, de ambos os gêneros e de todas as orientações
sexuais, em suas buscas por dignidade humana, liberdade, direito à educação,
resgate e manutenção da cultura, organização social, luta política e armada,
vivência plena, defesa de suas terras, etc., nos últimos cinco séculos. (pp. 27-28)”
5. JONES, Del. The Black Holocaust:
Global Genocide. Philadelphia: Hikeka Press, 1992. Livro contundente,
combativo e importante na busca e na forma de lidar e revelar os aspectos do
Holocausto dos Pretos. Imbuído do Pan-Afrikanismo, o correspondente de guerra
não dá margem pra supremacia branca. Escravidão e colonização representam o
genocídio; Leopold, Stanley, Rhodes, Kaiser – Genocidas; Aparato militar do
imperialismo, suposta Guerra às Drogas e outras armas de destruição em massa –
Genocídio Global de pretos. Agora, veja o que aponta Du bois em “África- seu
lugar na história moderna,” e perceba se não foi um holocausto: “Provavelmente
cada escravo importado representou em média cinco cadáveres na África ou em
alto-mar; o comércio de escravos americano, portanto, significou a eliminação
de pelo menos 60 milhões de pretos de sua pátria. O comércio de escravos
maometano significava a expatriação ou migração forçada na África de quase
tantos. Seria até conservador, então, dizer que o comércio de escravos custou à
África Preta 100.000.000 de almas. E ainda assim as pessoas perguntam hoje a
causa da estagnação da cultura africana desde 1600!”
6. Para complemento
sobre o método. Ver: ODÙDUWÀ, Abisogun Olatunji. “Dialética da Revolução
Africana” em O Levante dos nossos filhos:
uma contribuição à revolução pan-africana. Diáspora Africana: Editora
Filhos da África, 2020. (pág. 346-443) Após refutar que o método dialético seja
produto do ocidente, Abisogun postula que: “A dialética que vamos apresentar
aqui consiste no enfrentamento entre brancos e pretos, representado pela
supremacia branca e seu projeto civilizatório de um lado (na condição de tese)
e a resistência africana, por meio do pan-africanismo e construção do
renascimento africano, de outro (na condição de antítese); gerando com essa
movimentação conflituosa uma síntese, a ser interpretada e definida apenas no
porvir (pág. 359).”
7. Para ‘Notas de
uma pedagogia e de um currículo africano-centrado’, com seu domínio holístico
através de um inventário temático africano-centrado: I. Espiritualidade e o
Psicoafetivo; II. Cultural e Ideológico; III. Sociopolítico e Econômico; Ver
Kwame Agyei Akoto. Nationbuilding: Theory and Practice in Afrikan
Centered Education.
Pan Afrikan World Institute, 1992. Agyei Akoto traz sua experiência de
20 anos na NationHouse, uma organização baseada na comunidade e
Afrikano-centrada, fundada no início dos anos setenta com raízes no movimento
estudantil ativista do final dos anos sessenta na Universidade Howard. A
organização opera uma escola independente, um consultório médico, um
acampamento de verão Afrikano-centrado, um programa para jovens depois da
escola, e organizou uma cooperativa de desenvolvimento de terras.
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